Funcionária do TJ/AM usa assinatura digital de juiz para tirar nome do noivo do SPC e tentar empréstimo
Uma funcionária do TJ/AM usou a assinatura digital do juiz de Direito Joaquim Almeida de Souza, da 4ª vara do Juizado Especial Cível de Manaus, para formular uma ação de danos morais contra uma operadora de telefone celular por inclusão indevida no SPC.
Da Redação
quarta-feira, 11 de maio de 2011
Atualizado às 08:27
Fraude
Funcionária do TJ/AM usa assinatura digital de juiz para tirar nome do noivo do SPC e tentar um empréstimo
Em setembro do ano passado, uma funcionária do TJ/AM usou a assinatura digital do juiz de Direito Joaquim Almeida de Souza, da 4ª vara do Juizado Especial Cível de Manaus, para tirar nome do noivo do SPC, e dessa forma, oferecer condições para que ele pudesse financiar um imóvel. A fraude foi descoberta porque a diretora de secretaria da 4ª vara do Juizado Especial Cível, Elizabeth Brasil de Lima, recebeu uma carta do SPC de SP informando que P. C. B. F. "autor da ação", teve o nome excluído do cadastro de inadimplentes.
A funcionária formulou uma ação de danos morais, na qual seu noivo era o autor, contra uma operadora de telefone celular por inclusão indevida no SPC. O processo, de número 0500064-34.2010.8.04.0092 (clique aqui), pedia indenização no valor de aproximadamente R$ 10 mil e, em caratér liminar, que fosse retirado o nome do autor do SPC.
Consta no parecer do juiz corregedor Dídimo Santana Barros Filho que o termo de apresentação do pedido da ação "foi expedido como processo excepcional, o que vincula o juízo no qual o mesmo foi emitido e viola o critério de distribuição da competência previsto nos arts. 251 e 252 do CPC (clique aqui)".
Ainda de acordo com o parecer, um documento comprova que o termo de apresentação do pedido foi emitido pela servidora R. S. S., às 17h31 do dia 20/9/10; "portanto, em horário posterior ao do expediente, e assinado digitalmente pela servidora".
No mesmo dia do ajuizamento da ação, ela utilizou a assinatura digital do juiz para conceder liminar determinando a retirada do nome do noivo do SPC :Ontem, 10/5, a 7ª vara Criminal de Manaus pediu a abertura de uma ação penal na JF contra a funcionária e seu noivo, que também fazia parte do quadro de colaboradores no TJ.
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Íntegra do parecer do juiz corregedor
Trata-se de expediente encaminhado por determinação do juiz da 4ª Vara do Juizado Especial Cível, Joaquim Almeida de Souza, no qual comunica a prática de atos pela servidora Raquel Santana de Souza nos autos do Processo de nº 0500064-34.2010.8.04.0092, daquele juízo, bem como relata as providências adotadas.
Sucintamente, o relatório.
Da análise dos documentos, verifica-se a necessidade de apuração dos fatos informados, considerando que, se comprovada a ocorrência, resultam de atos de extrema gravidade, cuja prática é incompatível com a dignidade da função pública, conforme previsão do art. 149, X, da Lei n. 1.762/86.
Na pág. 10/11, consta certidão da diretora de secretaria Elizabeth Brasil de Lima, na qual são narradas as irregularidades detectadas, dentre as quais a de que o Processo nº 0500064-34.2010.8.04.0092 foi originado na própria vara.
Entretanto, é oportuno mencionar que no fórum há um setor para tal finalidade, o de Ajuizamento. Porém, verifica-se que o termo de apresentação do pedido foi expedido como processo excepcional, o que vincula o juízo no qual o mesmo foi emitido e viola o critério de distribuição da competência previsto nos arts. 251 e 252 do Código de Processo Civil.
O referido fato pode ser comprovado pelo documento constante da pág. 8, que demonstra que o termo de apresentação do pedido foi emitido pela servidora Raquel Santana de Souza, às 17h31 do dia 20 de setembro de 2010; portanto, em horário posterior ao do expediente, e assinado digitalmente pela servidora.
Necessário também destacar que, muito embora a inicial não esteja instruída com nenhum documento, no processo, despachado no mesmo dia do ajuizamento da ação, foi concedida liminar para a finalidade pleiteada, conforme pág. 13.
Entretanto, não se vislumbra o mínimo de prova do alegado que fundamentasse a concessão da tutela pleiteada, nos termos do art. 273, do Código de Processo Civil, muito embora conste da decisão o contrário.
Oportuno ressaltar, ainda, que a decisão que consta dos autos do Processo nº 0500064-34.2010.8.04.0092 não é válida posto ser desprovida de assinatura eletrônica pelo magistrado do feito, ou seja, em total desconformidade com a Lei n. 11.419/06, que dispõe sobre a informatização do processo judicial.
Ademais, consoante análise do documento de pág. 7, também se verifica que a decisão acima mencionada foi liberada nos respectivos autos pela servidora Raquel Santa de Souza, que, em ato contínuo, expediu documento endereçado à parte contrária do processo, com a finalidade de cumprimento da "medida concedida", e também desprovido de assinatura eletrônica.
De outro modo, vale ressaltar, ainda, que, por razões a serem apuradas posteriormente, não foi designada data para realização da audiência de conciliação/instrução e julgamento, também em desconformidade com o disposto na Lei n. 9.099/95, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais.
Por fim, é importante destacar que os atos praticados no processo ajuizado diretamente naquele juízo beneficiaram P. C. B. F., principalmente no que tange ao comprovado cumprimento da "medida concedida", conforme ofício que consta da pág. 9. Além disso, de acordo com a certidão de pág. 10, o mesmo é noivo da servidora R. S. S. e também servidor do quadro deste Poder. Portanto, diante de suposta violação de quebra de dever funcional previsto no art. 149, X, da Lei n. 1.762, de regras de interesse público, como a de distribuição de competência e, consequentemente, de princípios constitucionais como o do juiz natural e o do devido processo legal, recomenda-se a instauração de processo administrativo disciplinar em desfavor dos servidores R. S. S. e P. C. B. F., para apuração dos fatos e eventual responsabilização, nos termos dos art. 173 e 179 da Lei 1.762/86.
Quanto à prática de eventual crime contra a Administração Pública, dentre as medidas adotadas pelo magistrado do 4º Juizado Especial Cível, conforme portaria de pág. 4/5, o fato também foi comunicado, dentre diversos outros órgãos, ao Ministério Público Estadual, para adoção das providências que entender necessárias.
Este o parecer.
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Despacho do juiz Joaquim Almeida de Souza após descoberta da fraude
ESTADO DO AMAZONAS
PODER JUDICIÁRIO
Comarca de Manaus
Juízo de Direito da 4ª Vara do Juizado Especial Cível
Autos nº: 0500064-34.2010.8.04.0092
Requerente: P. C. B. F.
Requerido: Oi Paggo - Telemar Norte Leste S/A
DESPACHO.
R.H.
1. Considerando o teor da certidão lavrada pela senhora Diretora de Secretaria às fls..., a qual aponta a ocorrência de fatos da maior gravidade, de autoria da Servidora R. S. S. lotada neste 4º JEC, chamo o processo à ordem e DECLARO NULO DE PLENO DIREITO o despacho proferido em nome deste Julgador às fls...., vez que o mencionado ato processual foi decorrente de contrafação feita pela Servidora antemencionada. Desse modo, diante da gravidade destes fatos determino sejam adotadas imediatamente as seguintes providências:
1.1 Oficie-se a Augusta Corregedoria do Egrégio TJAM no sentido de que aquele órgão correicional proceda a instauração do competente Inquérito Administrativo contra a aludida servidora, com o objetivo de apurar-se sua responsabilidade nos fatos narrados na mencionada certidão, bem como a Exma.Sra.Desdora. MARIA DAS GRAÇAS PESSOA FIGUEIREDO, Coordenadora dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do TJAM, informando-lhe da ocorrência dos fatos expostos na referida certidão e das medidas que estão sendo adotadas por este Julgador.
1.2 Oficie-se, igualmente, a douta Procuradoria Geral de Justiça deste Estado, informado-lhe os fatos narrados na sobredita certidão, encartando-se ao mencionado expediente cópias dos documentos comprobatórios dos atos praticados pela referida Servidora, para fins de instauração da competente Ação Penal contra a funcionária pública supracitada.
1.3 Oficie-se, ainda, ao Conselho Nacional de Justiça em Brasília- DF, informando-se ao seu notável Presidente a ocorrência destes deploraveis fatos, bem como das medidas ora tomadas por este Magistrado, a fim de que aquele douto Conselho possa acompanhar a tramitação do Inquérito Administrativo a ser instaurado no âmbito da Corregedoria do TJAM.
1.4 Oficie-se, finalmente, ao Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC), em São Paulo informando-lhe da declaração de nulidade do sobredito ato processual que foi produzido de forma fraudulenta pela Servidora retrocitada, em nome deste Magistrado, e, por essa razão, deverá PERMANECER inscrito naquele órgão restritivo de crédito o nome do senhor P. C. B. F. (CPF/MF XXX.XXX.XXX-XX).
2. Intimem-se. Cumpra-se.
Manaus, 19 de outubro de 2010
Joaquim Almeida de Souza
Juiz de Direito
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