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TRT da 3ª região declara natureza salarial de aluguel da motocicleta do empregado

A princípio, o valor pago ao empregado pela utilização de veículo próprio para realizar seu trabalho tem natureza indenizatória. No entanto, se a empresa exige como condição para a prestação de serviços que o empregado tenha um veículo para usar como ferramenta de trabalho e paga um aluguel superior a 50% do salário recebido pelo trabalhador, é clara a existência de fraude e, por essa razão, a parcela tem natureza salarial. É exatamente esse o caso do processo analisado pela 8ª turma do TRT da 3ª região.

Da Redação

terça-feira, 26 de abril de 2011

Atualizado às 08:22

Natureza salarial

TRT da 3ª região declara natureza salarial de aluguel da motocicleta do empregado

A princípio, o valor pago ao empregado pela utilização de veículo próprio para realizar seu trabalho tem natureza indenizatória. No entanto, se a empresa exige como condição para a prestação de serviços que o empregado tenha um veículo para usar como ferramenta de trabalho e paga um aluguel superior a 50% do salário recebido pelo trabalhador, é clara a existência de fraude e, por essa razão, a parcela tem natureza salarial. É exatamente esse o caso do processo analisado pela 8ª turma do TRT da 3ª região.

A decisão de 1º grau havia indeferido o pedido de reconhecimento da natureza salarial do valor pago mensalmente ao trabalhador, a título de aluguel de sua motocicleta. Mas a juíza convocada Mônica Sette Lopes, relatora do caso, não concordou com esse posicionamento.

Segundo a magistrada, a contratação do reclamante foi feita tendo a sua motocicleta como um suporte, já que a reclamada oferecia no mercado serviços especializados com a utilização desse veículo. Então, a moto passou a integrar o patrimônio da empresa, ainda que temporariamente. Como a empregadora é quem deve assumir os riscos do empreendimento, o uso do veículo do trabalhador tem que ser remunerado, para cobrir o desgaste. Além disso, as despesas com gasolina e manutenção também cabem à empresa.

A magistrada levou em conta a proporção do valor da locação sobre a remuneração. Isto porque o salário do reclamante tinha valor muito próximo do mínimo legal e o montante fixado para a locação chegava a mais de 50% dessa importância. Outro ponto importante, observado pela juíza, é o fato de a necessidade de uso do veículo estar vinculada à atividade-fim da empresa.

Assim, o valor da locação era condição para a prestação de serviços e para que a remuneração do empregado atingisse padrões mais adequados. Confirmada, portanto, pelo cotejo do valor do salário reconhecido ao autor e do valor da dita locação, pelo modo de seu pagamento e pela forma como a pressão pela manutenção do veículo era imposta de forma vinculada à execução do contrato de trabalho subordinado, é de se entender que a verba tinha natureza salarial e contraprestativa, concluiu a juíza convocada, dando provimento ao recurso do trabalhador para declarar a natureza salarial da parcela paga como aluguel do veículo.

A reclamada foi condenada a pagar ao empregado os reflexos da verba em FGTS + 40%, férias acrescidas de 1/3 e 13º salário.

  • Processo : 0000254-97.2010.5.03.0006 RO - clique aqui.

Veja abaixo a decisão na íntegra.

_____________

RECORRENTE(S): J.N.D.

RECORRIDO(S): SAINT LAKE SERVICOS ESPECIALIZADOS LTDA.

EMENTA: ALUGUEL. MOTOCICLETA. Quando o valor pago pela locação da motocicleta, bem essencial para o desenvolvimento das atividades, constitui parte relevante do valor de salários, na perspectiva do mercado, é de se declarar a sua natureza salarial.

Vistos etc.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso ordinário interposto da decisão de f. 81/85 que julgou procedente em parte a ação.

Contra-razões (f. 99/100).

Dispensada a manifestação do D. Ministério Público à vista da natureza da controvérsia.

É o relatório.

VOTO

JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

Presentes os pressupostos de cabimento e de admissibilidade, conheço do recurso ordinário.

JUÍZO DE MÉRITO

INEXISTÊNCIA DE SALÁRIO "POR FORA"

Está no art. 2º da CLT a previsão de que a empresa empregadora assume os riscos do empreendimento, o que, naturalmente, compreende o fornecimento dos insumos para que tal se concretize. Se a reclamada disponibilizava para o mercado serviços especializados que exigiam um motociclista, é de se supor que entre os equipamentos que integrassem o seu patrimônio tivesse o número suficiente de motocicletas.

A contratação do autor foi feita tendo a motocicleta de que era proprietário como um suporte e ela passou a integrar o patrimônio da empresa, como um ativo, ainda que temporário dela. A reclamada obriga-se a assumir os riscos do empreendimento, principalmente os inerentes ao seu objetivo social, não sendo razoável que os repasses a seus empregados. Isto significa que o uso do veículo do autor só seria possível se fosse remunerado, para a cobertura do desgaste. Por outro lado, as despesas com essa utilização (gasolina, manutenção, por exemplo) cabem à reclamada que, com a locação, assumiu parte da posse sobre o bem que passou a integrar o seu estabelecimento. Também aqui não se pode deixar de falar em assunção dos riscos do empreendimento.

Não se trata propriamente de pagamento por fora, mas de verbas a que reclamada atribuiu natureza diversa, as quais, em razão da pretensão devida, devem ser avaliadas sob a tônica da litiscontestatio. É a definição da controvérsia que fixará a sua índole de forma definitiva - se salário, se indenização, como entendeu a sentença.

A questão que se coloca, portanto, é: haveria uma imposição tão intensa na contratação do autor que pudesse transformar a natureza do pagamento tal como reconhecido pela empresa em contraprestativo?

O que chama atenção na hipótese dos autos (e corriqueiro em outras hipóteses analisadas) é exatamente o modo como os valores são pagos ao autor.

O fato relevante é a proporção do valor da locação sobre o valor da remuneração, principalmente quando se consideram fatores de mercado e a vinculação já referida à atividade-fim substancial da empresa.

O valor do salário do autor é muito próximo do mínimo e o montante fixado para a locação atinge patamar que é significativamente superior a 50% dele. Ele era condição essencial para a prestação dos serviços e para a composição da remuneração mês do autor em padrões mais adequados. Este desvirtuamento no tratamento do autor-empregado, que era obrigado a assumir riscos e ônus que não eram seus, é o que faz interpretar-se a matéria dentro de uma linha de conglobamento em que a remuneração pelo uso do veículo transita da natureza civil típica para a salarial. A questão está claramente posta na ementa a seguir transcrita:

EMENTA: INSTALADOR/REPARADOR DE CABOS TELEFÔNICOS - LOCAÇÃO DO VEÍCULO - NATUREZA SALARIAL DA PARCELA. A rigor, o valor do aluguel pago ao empregado pela utilização de seu próprio veículo em serviço possui natureza indenizatória, sempre que este for utilizado para o trabalho e não pelo trabalho. Esse, aliás, é o entendimento consagrado no artigo 458 da CLT. Não obstante, há de se reconhecer a natureza salarial da parcela quando os elementos dos autos demonstram a existência de fraude em relação ao salário efetivamente recebido pelo reclamante, verificada quando o valor atribuído ao aluguel do veículo ultrapassa 50% do valor do salário pago pela efetiva prestação de serviços e quando a empresa exige do empregado, como ferramenta de trabalho, um veículo, sem o qual não há possibilidade deste prestar suas atividades. Nesta hipótese, é de se reconhecer a existência, tão-somente, de um pseudo contrato de locação de veículo, no intuito único de mascarar o real salário ajustado entre as partes. TRT/3ª Região. Rel. Juiz Convocado Emerson José Alves Lage. DOU-MG 17-02-2007.

Confirmada, portanto, pelo cotejo do valor do salário reconhecido ao autor e do valor da dita locação, pelo modo de seu pagamento e pela forma como a pressão pela manutenção do veículo era imposta de forma vinculada à execução do contrato de trabalho subordinado, é de se entender que a verba tinha natureza salarial e contraprestativa.

Por isto, provejo o recurso para declarar a natureza salarial da verba paga a título de aluguel de veículo, condenando a reclamada a pagar ao autor reflexos em FGTS com 40%, férias com 1/3, 13º salário.

Não há reflexos em repouso semanal remunerado porque o contrato estipula um valor fixo (f. 52) que se estabelece como de R$400,00, segundo o depoimento pessoal da empresa.

IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A condenação em honorários de sucumbência nesta Justiça observa a critérios de regência legal estrita.

Não haveria como atender o pleito do autor de indenização por danos materiais relativos a despesas com advogado se não se pudesse estender os efeitos deste entendimento a todas as situações, inclusive àquela parte à parte da coisa julgada que fixa a improcedência dos pedidos, já que isto denota que também a empresa teve prejuízos materiais na contratação de advogados.

A teleologia da lei é sábia ao reservar os honorários de sucumbência aos assistidos pelo sindicato.

Nego provimento.

Fundamentos pelos quais, o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua OITAVA Turma, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso; no mérito, sem divergência, deu-lhe provimento parcial para declarar a natureza salarial da verba paga a título de aluguel de veículo, condenando a reclamada a pagar ao autor reflexos em FGTS com 40%, férias com 1/3, 13º salário, estipulando-se o valor mensal em R$400,00(quatrocentos reais). Incide contribuição previdenciária no que concerne aos reflexos em férias gozadas com 1/3 e 13º salário, com ressalva de fundamentos do Exmo. Desembargador Revisor.

Belo Horizonte, 16 de março de 2011.

JUÍZA CONVOCADA MÔNICA SETTE LOPES

Relatora

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