TST manda sequestrar precatório em favor de idoso com câncer
Um ex-empregado do gaúcho, com 82 anos de idade, portador de câncer de próstata, sem condições financeiras para custear seu tratamento, conseguiu quebrar a ordem cronológica de apresentação de precatórios e vai receber R$ 97.219,65 a que tem direito desde que saiu vitorioso em ação trabalhista movida em 1995. Por decisão inédita do Órgão Especial do TST, o valor deverá ser sequestrado da conta do Estado e depositado na conta do idoso.
Da Redação
segunda-feira, 14 de março de 2011
Atualizado às 08:50
Precatório
TST manda sequestrar precatório em favor de idoso com câncer
Um ex-empregado gaúcho, com 82 anos de idade, portador de câncer de próstata, sem condições financeiras para custear seu tratamento, conseguiu quebrar a ordem cronológica de apresentação de precatórios e vai receber R$ 97.219,65 a que tem direito desde que saiu vitorioso em ação trabalhista movida em 1995. Por decisão inédita do Órgão Especial do TST, o valor deverá ser sequestrado da conta do Estado e depositado na conta do idoso.
A exceção à regra dos precatórios, concedida pelo TRT da 4ª região/RS e mantida pelo Órgão Especial do TST, baseou-se nos princípios constitucionais da supremacia do direito à vida e da dignidade do ser humano. Segundo a decisão, a demora na liberação do precatório, expedido em 2000, mesmo neste caso, em que o autor tem direito ao benefício da tramitação preferencial do processo, poderia ser prejudicial ao idoso, tendo em vista seu estado de saúde.
O processo chegou ao TST por meio de recurso ordinário interposto pelo Estado do RS. Em sua argumentação, apontou ofensa ao artigo 100 da CF/88 (clique aqui), que trata da ordem de pagamento dos precatórios. Disse que a decisão judicial feria a ordem cronológica de apresentação, até mesmo nas exceções ali previstas, como nos casos dos créditos de natureza alimentícia, que prevalecem em relação aos demais créditos.
O relator do acórdão na Corte Superior Trabalhista, ministro Lelio Bentes Corrêa, ao negar provimento ao recurso em que o Estado do RS questionava a ordem de sequestro, destacou que a decisão buscou proteger o idoso da excessiva demora na tramitação dos precatórios, "capaz de comprometer o seu direito a uma vida digna". Segundo o ministro, a EC 62/09 (clique aqui), que deu nova redação ao artigo 100 da CF/88, atribuiu caráter absolutamente preferencial aos créditos de natureza alimentar de titularidade de pessoas idosas ou portadoras de moléstias graves, admitindo, inclusive, o sequestro de valores, a requerimento do credor, "nos casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação de seu crédito".
O relator destacou, ainda, que o legislador, ao introduzir a nova ordem constitucional, resguardou o princípio da igualdade de tratamento entre os credores - motivo da existência dos precatórios. Mas, por outro lado, revelou preocupação justificada com os casos de manifesta desigualdade resultante da aplicação indiscriminada da regra geral. São grupos de pessoas em condições vulneráveis que sofrem com maior intensidade com a demora da longa fila de espera para o recebimento dos precatórios. Segundo o ministro Lelio, essa espera pode comprometer, de forma irreversível, "o pleno gozo das garantias constitucionais do direito à vida e à dignidade humana". Esses princípios fundamentais, disse o relator, não podem ser suplantados pelo princípio da igualdade de tratamento dos credores da Fazenda Pública.
Ao fundamentar seu entendimento, o ministro Lelio transcreveu em seu voto recente decisão do ministro Eros Grau, do STF, que fala justamente da flexibilidade de aplicação das normas em situações de exceção: "Não é a exceção que se subtrai à norma, mas ela que, suspendendo-se, dá lugar à exceção - apenas desse modo ela se constitui como regra, mantendo-se em relação com a exceção. A esta Corte, sempre que necessário, incumbe decidir regulando também essas situações de exceção. Ao fazê-lo, não se afasta do ordenamento, eis que aplica a norma à exceção desaplicando-a, isto é, retirando-a da exceção".
O Órgão Especial do TST, seguindo voto do relator, decidiu negar provimento ao recurso do Estado do RS, por não entender configurada ofensa à CF/88.
História de vida
O autor da ação propôs reclamação trabalhista em abril de 1995 contra a Companhia Intermunicipal de Estradas Alimentadoras - Cintea. Segundo a petição inicial, ele foi contratado pelo antigo Instituto Gaúcho de Reforma Agrária em 1970, para exercer a função de "blaster", e foi demitido, sem justa causa, em março de 1994.
"Blaster" é uma profissão antiga, mas pouco conhecida. Também denominados "cabos de fogo" ou "detonadores", esses profissionais são responsáveis por preparar, calcular e instalar dinamites para destruir rochas, geralmente em aberturas de estradas, pedreiras e minas. É uma profissão de altíssimo risco, e somente especialistas do Exército podem habilitar profissionais para exercê-la.
Segundo relato na peça inicial da ação, este era exatamente o caso do autor: em contato permanente com explosivos, em condições de risco acentuado, ele era responsável por instalar dinamites nas rochas e dar os tiros necessários para a detonação. Trabalhava cerca de 12 horas por dia. O crédito trabalhista que gerou os precatórios foi proveniente da decisão favorável relativa aos pedidos de adicional de periculosidade, aviso prévio e horas extras.
Entenda os precatórios
Precatório é uma ordem judicial para pagamento de débitos dos órgãos públicos Federais, Estaduais, municipais ou distritais. Esses débitos recaem sobre esses órgãos públicos por terem sido condenados a indenizar o cidadão.
O precatório só pode ser iniciado após o trânsito em julgado, ou seja, quando a ação judicial não comporta mais recurso. O pagamento da dívida depende de depósito pela esfera de governo condenada a indenizar o credor. Cada um desses níveis de governos deve fazer constar de seus orçamentos anuais a previsão de pagamento de seus precatórios.
O pagamento deve seguir a ordem cronológica de registro (autuação) dos processos. Isso significa que a quitação de cada precatório tem, obrigatoriamente, que seguir a ordem numérica das autuações. A determinação está expressa na CF/88, em seu artigo 100. Apesar dessa exigência, a própria CF/88 autorizou, no ano de 2002, o pagamento dos precatórios de pequeno valor, ou seja, aqueles de até 40 salários mínimos (R$ 10,4 mil), no prazo de até 60 dias (EC 37/02 - clique aqui).
A EC 62/09 abriu uma exceção à regra da ordem de apresentação, dando preferência para pessoas com mais de 60 anos ou com doenças graves.
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Processo Relacionado : TST-RO-2698-94.2010.5.04.0000 - clique aqui.
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