TJ/SP entende que não há crime na conduta de executar músicas em casa noturna
O TJ/SP, em acórdão relatado pelo desembargador Pinheiro Franco, da 5ª Câmara de Direito Criminal, em julgamento realizado em novembro de 2009, entendeu que não há crime na conduta (de executar músicas) dos proprietários da casa noturna Anzu Club, localizada em Itu, determinando que a ação penal promovida contra eles seja trancada e o processo arquivado.
Da Redação
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
Atualizado em 27 de janeiro de 2010 16:30
Direitos autorais
TJ/SP entende que não há crime na conduta de executar músicas em casa noturna
O TJ/SP, em acórdão relatado pelo desembargador Pinheiro Franco, da 5ª Câmara de Direito Criminal, em julgamento realizado em novembro de 2009, entendeu que não há crime na conduta (de executar músicas) dos proprietários da casa noturna Anzu Club, localizada em Itu, determinando que a ação penal promovida contra eles seja trancada e o processo arquivado.
Em 2006, o Ecad formulou com base no artigo 184, § 1º do CP (clique aqui), notícia crime perante a autoridade policial de Itu, alegando que a danceteria, por executar as obras musicais, estaria violando direitos autorais nos termos da lei penal, e não somente da lei civil. O inquérito policial foi instaurado e a consequente ação penal ajuizada pelo promotor de justiça contra os dois sócios da casa noturna.
Segundo a acusação, a danceteria incorreu nesse crime pelo fato de reproduzir obra musical dentro do seu estabelecimento. "Confundiram o conceito de "reprodução" com o de "execução pública de música, que são absolutamente distintos e muito bem delineados na Lei de Direitos Autorais (lei 9.610/98)", destaca o advogado dos proprietários da Boate, Jaime Rodrigues de Almeida Neto.
Esclarecimentos
"Primeiramente, é importante informar que ao contrário do que foi noticiado, a decisão da Corte Estadual de SP em nenhum momento entende pela legalidade da utilização de músicas sem autorização dos detentores dos direitos dos autores e dos que lhe são conexos, mas apenas e tão somente determina, com equivocada fundamentação, o trancamento da ação penal, a partir de uma análise processual. O Ecad, como representante de milhares de titulares de música, espera que o Ministério Público, como autor da ação penal, recorra de tal decisão.
A Anzu Club vem praticando, através de seus representantes legais, a execução pública musical sem prévia autorização de forma constante, o que é uma prática ilícita. O caput do art. 184 do CP Brasileiro dispõe que: "Violar direitos de autor e do que lhe são conexos. Pena de detenção de três meses a um ano ou multa"
Para complementar o entendimento do artigo 184 do CP no que se refere à "direito do autor", é preciso considerar a Lei de Direito de Autor (lei 9.610/98), que, por sua vez, proíbe expressamente o uso público de músicas sem autorização de seus autores e titulares (art. 68 e §§).
A lesão prevista no CP fere o direito exclusivo do autor de autorizar ou não o uso de suas obras por terceiros, conferido também pela Constituição Federal, além da lei 9.610/98.
O artigo 184 do CP abrange todas as modalidades do direito do autor e dos que lhe são conexos, incluindo-se, logicamente, os direitos derivados da execução pública de músicas. Assim, o uso desautorizado de músicas pelos estabelecimentos comerciais imputa aos seus representantes e diretores, sanções, não apenas de ordem civil, mas também criminal."
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RelatorPODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n° 990.09.215873-2, da Comarca de Itu, em que é impetrante JAIME RODRIGUES DE ALMEIDA NETO, Pacientes MILTON MURARO FILHO e SALETE MURARO MORENO.
ACORDAM, em 5ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "CONCEDERAM A ORDEM PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL N° 921/06, QUE TRAMITA PERANTE O JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DE ITU, INSTAURADA CONTRA OS PACIENTES MILTON MURARO FILHO E SALETE MURARO MORENO, DETERMINANDO O IMEDIATO ARQUIVAMENTO DOS AUTOS.
OFICIE-SE AO MAGISTRADO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.O julgamento teve a participação dos Desembargadores PINHEIRO FRANCO (Presidente),TRISTÃO RIBEIRO E MARCOS ZANUZZI.
São Paulo, 19 de novembro de 2009
PINHEIRO FRANCO
PRESIDENTE E RELATOR
Habeas Corpus n° 990.09.215873-2 - Itu
Impetrantes : José Roberto Amaral e Jaime Rodrigues de Almeida Neto
Pacientes : Milton Muraro Filho e Salete Muraro Moreno
Impetrado : MM. Juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca
Voto nº : 13.223
Habeas Corpus. Violação de Direito Autoral. Execução Pública de Música em estabelecimento comercial, com intuito de lucro, ainda que indireto. Hipótese que não se assemelha, para fins penais, de reprodução, esta sim vedada e que tipifica a conduta. Reflexos meramente patrimoniais, não penais, Inteligência dos artigos 184, § 1.°, do C. Penal e 5.°, inciso VI, da Lei n.° 9.610/98. Ordem concedida para trancar a ação penal.
Os advogados José Roberto Amaral e Jaime Rodrigues de Almeida Neto impetram a presente Ordem de HABEAS CORPUS em favor de MILTON MURARO FILHO e SALETE MURARO MORENO, sob a alegação de eles estarem sofrendo constrangimento ilegal por ato do MM. Juiz da 2a Vara Criminal da Comarca de Itu.
Sustentam os impetrantes que contra os pacientes recai a acusação de violação de direito autoral, por serem sócios da empresa de entretenimento denominada Anzu, na Cidade de Itu e ali teriam reproduzido obras musicais. Asseveram que a denúncia oferecida contra os pacientes é inepta, merecendo sua rejeição sumária, uma vez que não apresenta a narração do fato delituoso com todas as suas circunstâncias, o que viola o artigo 41, do Código de Processo Penal, não podendo ser realizadas imputações vagas, sem a necessária e minuciosa narração dos fatos delituosos, com a indicação de todos os elementos estruturais e circunstanciais que lhe são inerentes. Da exordial, pode-se depreender somente que nos dias indicados supostamente houve a realização de eventos noturnos no local e que a retribuição devida ao
ECAD não teria sido repassada. Alegam que nem mesmo houve individualização das condutas de MILTON e SALETE, limitando-se a inicial a indicar que "são sócios da empresa e que agindo em concurso, com unidade de desígnios e identidade de propósitos" violaram direitos autorais. Batem-se pela inépcia da peça acusatória, por ela ser vaga, genérica e superficial em relação aos fatos que deveria descrever como comportamentos infracionais. Ressaltam que SALETE é sócia minoritária da empresa, não possuindo controle sobre as atividades gerenciais da empresa, tendo sido incluída na denúncia simplesmente por ser sócia, sem qualquer outra menção à sua atividade na prática do suposto crime.
Alegam, ainda, que as condutas descritas na peça inicial sequer constituem crime, o que justifica o trancamento da ação penal.
Argumentam que naquele local apenas ocorre execução pública de música, o que não é tido como crime pela legislação penal. Sustentam que a ação imputada aos pacientes, pirataria, é diversa da conduta descrita - executar obras musicais sem o devido recolhimento dos direitos autorais ao ECAD - o que não caracterizaria crime. Asseveram que a norma contida no artigo 184, do Código Penal, é norma penal em branco, necessitando de uma norma complementadora para definir o tipo penal incriminador, qual seja, a Lei n° 9.610/1998. Tal diploma legal, em seu artigo 5o, inciso VI define o termo reprodução como sendo "a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível, incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer meio de fixação que venha a ser desenvolvido". Assim, tem-se que comete o crime previsto no artigo 184, § 1o, do Código Penal quem, com o intuito de lucro, viola direito autoral mediante a cópia (total ou parcial), de obra intelectual, de interpretação, de execução ou de fonograma, sem autorização expressa de quem deva conceder, não havendo previsão de conduta criminosa no ato de executar obras musicais. Aduzem que o artigo 68, § 2o, da Lei n° 9.610/1998, define a execução pública musica! como "a utilização de composições musicais ou lítero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica". Afirmam que o que ocorre na empresa dos pacientes é a execução pública musical, cujo controle é realizado única e exclusivamente na esfera civil, pelo ECAD, com o fim de cobrar e arrecadar os valores. Liminarmente, requereram a suspensão do andamento da ação penal e, por todo o exposto, buscam a concessão da ordem para que seja determinado o trancamento de referida ação.
O pleito liminar foi concedido (folhas 34).
Nas informações, o Ilustre Magistrado relata que os pacientes estão sendo processados pela suposta prática do crime de violação de direito autoral, sendo a denúncia recebida em 6 de setembro de 2007. Citados, os pacientes foram interrogados e apresentaram defesa prévia (folhas 38).
Parecer da Ilustrada Procuradoria Geral de Justiça pela denegação da ordem (folhas 40/44).
É o relatório.
A impetração busca o trancamento da ação penal instaurada contra os pacientes por violação a direito autoral. É que eles, sócios de empresa de eventos, reproduziram, total ou parcialmente, com intuito de lucro, obra musical sem autorização expressa do autor, intérprete ou de quem o represente.
A impetração bate-se pela inépcia da inicial e pelo trancamento da ação, fundado este argumento na inexistência de figura típica.
Inépcia não há.
O vício decorreria da falta de narrativa específica da conduta de cada um dos pacientes. Mas a narrativa é satisfatória e permitiu, inclusive, a defesa plena das imputações.
Os pacientes são sócios da empresa, fato incontroverso. E tudo o que ocorre ali, evidentemente, é feito a partir do norte traçado por eles. A acusação atribui a ambos violação de direito autoral decorrente da reprodução parcial ou total, com intuito de lucro, de obras musicais. O fato por si só tem contornos genéricos e é impossível especificar condutas próprias a um e outro. O fundamento que admite denúncia geral, não genérica, nos casos de crimes societários, pode e deve ser aplicado ao caso presente. Nesse sentido (RHC-MG n.° 21.804 - STJ - Relatora Ministra JANE SILVA).
De outro lado, a definição de que a paciente SALETE não tem participação ativa na empresa demanda prova, não produzida nesta via, de sorte que por esse fundamento não é possível seu afastamento da ação.
É importante frisar, ainda, que a atuação do ECAD não demanda a comprovação de filiação e autorização dos compositores de músicas, como tem entendido o C. Superior Tribunal de Justiça (REsp n.° 262.839-PB - Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO). E a ação, na letra do artigo 186, II, do C. Penal, é pública incondicionada. 1 Resta, então, saber se o fato é típico.
A imputação é de reprodução total ou parcial de músicas sem autorização expressa do autor, intérprete ou de quem o represente.
Art. 186 - Procede-se mediante II - ação penal publica incondicionada, nos cnmes previstos nos parágrafos primeiro e segundo do artigo 184 O artigo 184, § 1.°, do C. Penal2, estabelece que é crime a reprodução, total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente.
Mas a lei define o que entende por reprodução. O artigo 5.°, da Lei n.° 9.610/98, que consolida a legislação sobre direitos autorais, enuncia que reprodução representa a cópia de um ou vários exemplares de uma obra literária, artística ou científica ou de um fonograma, de qualquer forma tangível incluindo qualquer armazenamento permanente ou temporário por meios eletrônicos ou qualquer outro meio de fixação que venha a ser desenvolvido. Isso é reprodução para o legislador.
E a acusação, na verdade, diz com a execução pública de obra (artigo 68, § 2.0)3, não de reprodução por cópia, coisa substancialmente diferente, de sorte que crime não há, senão mera " Art. 184 - Violar direitos de autor e os que lhe são conexos Parágrafo primeiro - Se a violação consistir em reprodução total ou parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por qualquer meio ou processo, de obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista interprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente Art. 68 - Sem prévia e expressa autorização do autor ou titular, não poderão ser utilizadas obras teatrais, composições musicais ou htero-musicais e fonogramas, em representações e execuções publicas Parágrafo segundo - Considera-se execução publica a utilização de composições musicais ou litero-musicais, mediante a participação de artistas, remunerados ou não, ou a utilização de fonogramas e obras audiovisuais, em locais de freqüência coletiva, por quaisquer processos, inclusive a radiodifusão ou transmissão por qualquer modalidade, e a exibição cinematográfica obrigação civil quanto ao pagamento dos direitos autorais, tema a ser debatido em outra esfera.
O fato, então, é atípico e o trancamento da ação penal de rigor, sem prejuízo dos reflexos civis do que foi apurado.
Pelo meu voto, pois, CONCEDO A ORDEM para trancar a ação penal n.° 921/06, que tramita perante o Juízo da 2ª Vara Criminal de Itu, instaurada contra os pacientes MILTON MURARO FILHO e SALETE MURARO MORENO, determinando o imediato arquivamento dos autos. Oficie-se ao Magistrado.
PINHEIRO FRANCO
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