O pesadelo da penhora on-line de contas bancárias
É certo que a inadimplência, favorecida pela morosidade da Justiça, aflige o credor e acarreta o desgaste da imagem do Poder Judiciário.
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
Atualizado em 10 de novembro de 2009 11:02
O pesadelo da penhora on-line de contas bancárias
Adalberto Pimentel Diniz de Souza*
Evane Beiguelman Kramer*
É certo que a inadimplência, favorecida pela morosidade da Justiça, aflige o credor e acarreta o desgaste da imagem do Poder Judiciário.
Como solução a esse problema, buscando a efetividade do processo, várias alterações vem sendo feitas ao CPC (clique aqui). Para isso surgiu a penhora on-line, criada inicialmente como instrumento tecnológico tendente a facilitar a agilização do processo ao garantir o pagamento de débitos.
A constrição 'on-line' visa a redução da inadimplência, garantindo a efetividade da jurisdição e a satisfação do credor, conferindo ao juiz, além da possibilidade de permitir a satisfação da execução por meio de penhora de bens, o acesso à conta bancária do devedor e a indisponibilização dos ativos financeiros lá existentes, mediante requisição via Internet, viabilizada por convênio selado entre o Banco Central e os órgãos jurisdicionais.
No último dia 19 de outubro o Jornal Folha de São Paulo divulgou que nos últimos quatro anos, os juízes bloquearam pela internet R$ 47,2 bilhões em contas bancárias para garantir o pagamento de dívidas judiciais. Naquela montante, a propósito, não estão incluídas as dívidas do Estado, pagas por meio de precatório. Mas essa é outra questão.
O problema que se apresenta não é o valor total bloqueado em penhoras nos últimos quatro anos. O problema é que, cada vez mais frequentemente, a penhora on-line é utilizada sem a observância dos critérios da legalidade e razoabilidade.
Preocupante e não razoável tem sido a determinação da penhora sobre todas as contas do devedor, determinação esta que viola claramente o princípio da menor onerosidade da execução e, no entanto, segue acontecendo. Não menos preocupante é a penhora de contas de sócios, ex-sócios e acionistas do devedor, sem que exista sequer um incidente de decretação de fraude à execução, que legitime a desconsideração da personalidade jurídica ou seja: a simplificação tecnológica facilita a supressão do processo. Se no passado, antes da instituição da penhora on line, a escassez de medidas para a cobrança do inadimplente gerava grande insatisfação, o que se nota atualmente, em especial na Justiça do Trabalho, é o uso desmedido desse mecanismo, quando ordens de bloqueios de contas feitas pela Justiça atingem todas as contas de quem foi indicado como devedor. Não importa, por exemplo, se o dinheiro bloqueado se destina ao pagamento de salários ou de fornecedores, nem importa que o atingido nunca administrou a empresa devedora, nem dela recebeu dividendos ou benefícios.
Na verdade, enquanto o processo de constituição do débito em juízo está cercado de todas as oportunidades de defesa por parte do devedor, na prática corrente da 'desconsideração da personalidade jurídica', uma simples decisão do Magistrado basta para atingir bens de sócio, ex-sócio, administrador ou ex-administrador da empresa devedora ou de outras empresas ditas participantes do mesmo grupo econômico do devedor ou, de algum modo, ligada ao devedor, em qualquer das situações pessoas que não são parte no processo e que nele são introduzidas, em notícia, com base na presunção de uma fraude. Trata-se, na verdade, de verdadeira socialização do débito e a utilização desmedida do mecanismo da penhora, contra a qual, muitas vezes, não se admite recurso.
Essas constatações levam a concluir que a penhora on-line, em que pese representar um instrumento de otimização da execução patrimonial não pode seguir sendo utilizada como um mecanismo de socialização das dívidas, mediante execuções sumárias e independentes do devido processo legal. O que se espera dos que formulam a política judiciária, sobretudo das alterações legais que diuturnamente são realizadas nas leis processuais, são alterações que conduzam à abolição da fraude presumida - uma verdadeira excrescência - que deve ser substituída pela observância do contraditório, da ampla defesa e, principalmente, do princípio da menor onerosidade da execução, seja ela civil ou trabalhista. A agilidade da penhora on-line deve servir à agilidade do processo e não à sua supressão.
*Advogados do Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques, Advocacia
____________