Validade das provas obtidas de modo ilícito
O constante desenvolvimento da tecnologia vem trazendo, cada vez mais, a necessidade da adequação e tutela dos direitos à vida privada, à intimidade, à honra da pessoa humana quando da outorga de mecanismos hábeis e eficientes à produção de provas, não autorizando invasões desnecessárias ou desmedidas na vida dos cidadãos.
quarta-feira, 8 de abril de 2009
Atualizado em 7 de abril de 2009 12:33
Validade das provas obtidas de modo ilícito
Gustavo Lorenzi de Castro*
Cinthia Ambra Lizot*
O constante desenvolvimento da tecnologia vem trazendo, cada vez mais, a necessidade da adequação e tutela dos direitos à vida privada, à intimidade, à honra da pessoa humana quando da outorga de mecanismos hábeis e eficientes à produção de provas, não autorizando invasões desnecessárias ou desmedidas na vida dos cidadãos.
A prova, do latim proba, de probare, que significa demonstrar, reconhecer, formar juízo, tem uma tarefa reconstrutiva dos fatos, sendo o elemento atestador do fato e busca revelar a verdade processual, a convicção e a lógica em relação a determinados fatos, elementos ou coisas. Quanto mais clara, ampla e firme a prova, mais eficaz ela será, fazendo surgir no magistrado a crença de estar de posse da verdade, a qual chamamos de convicção.
A utilização de meios ilegítimos ou ilícitos para se resguardar um direito, que está na iminência de ser lesado ou violado, também constitui prova.
Muito se discute na atualidade sobre a validade da prova ilícita. É necessária a ponderação de motivos para se admitir a prova ilícita em observância ao critério de proporcionalidade para que não haja ofensa desnecessária a direitos fundamentais das partes.
Os defensores da utilização da prova ilícita baseiam sua argumentação no fato de que por mais que a prova tenha sido obtida ilicitamente, ela alcançaria o seu objetivo maior, que é a demonstração da realidade dos fatos, que na maioria das vezes é o ponto essencial do litígio entre as partes.
De mais a mais, apresentando os elementos de convicção relevantes ao caso, nada impede a aplicação de sanções civis ou penais aos responsáveis pela produção da prova ilícita em processo distinto.
Já aqueles que condenam a validade da prova ilícita argumentam que ela viola preceito constitucional previsto no art. 5° LVI da CF (clique aqui). Tal preceito é também conhecido como princípio da inadmissibilidade da prova ilícita.
Entretanto, o direito à prova também está assegurado na CF através dos direitos de ação, ampla defesa e contraditório. Portanto, verifica-se que há um conflito entre os princípios constitucionais e sabe-se que em nosso ordenamento jurídico nenhum direito ou garantia constitucional é absoluto, sendo, portanto, possível o sacrifício de um direito em prol de outro de igual valia, dada a relatividade dos direitos e garantias constitucionais.
Desta forma, levando em conta que os direitos dos homens devem conviver em harmonia com os direitos de ordem constitucional, deve haver uma ponderação entre eles, devido ao Princípio da Relatividade ou Convivência das Liberdades Públicas.
Nessa esteira surge a teoria da proporcionalidade ou da razoabilidade, consistente num balanceamento ou preponderância de interesses. Sua criação é doutrinária e jurisprudencial permitindo que, no caso concreto, em face de uma vedação probatória, se proceda a escolha entre os valores constitucionalmente conflitantes.
Tal princípio constitucional já é amplamente utilizado no processo penal, devendo também ser aplicado por analogia no direito civil e nos processos de tal área, até porque sua índole é puramente constitucional.
Entretanto, aos 09 de junho de 2008, foi sancionado pelo Presidente da República o PL 4205/01 (clique aqui), que deu origem à Lei 11.690/08 (clique aqui), que alterou diversos dispositivos Código de Processo Penal. Tratam-se de importantes modificações às regulamentações referentes às provas, os exames periciais, às perguntas ao ofendido, à inquirição das testemunhas e às causas de absolvição do réu.
A alteração referente às provas, de significativa importância, é aquela feita pela nova redação do art. 157 do CPP (clique aqui), que incluiu expressamente, pela primeira vez, em lei infraconstitucional, a vedação prevista no Art. 5°, LVI da CF, ou seja, a inadmissibilidade das provas ilícitas no processo.
E mais, com a nova redação há determinação expressa à obrigatoriedade de se desentranhar dos autos as provas consideradas ilícitas.
Evidente que o objetivo da nova Lei é imprimir mais celeridade, simplicidade e segurança ao processo penal, alcançando-se assim a efetiva prestação jurisdicional.
Todavia, mencionada lei poderá trazer novas discussões quanto ao emprego do princípio da proporcionalidade e da preponderância anteriormente citados. Seriam estes inúteis diante da nova lei ?
Na prática, a adoção da nova redação do art. 157 do CPP, pode trazer prejuízos enormes à Justiça, como, exemplificativamente, na operação Satiagraha.
A apuração da PF sobre os métodos usados pelo delegado Protógenes Queiroz só afetará a ação penal contra o banqueiro Daniel Dantas. Se o MPF entender que, durante as investigações da Operação Satiagraha, foram obtidas provas ilícitas, capazes de contaminar o processo principal, elas deverão ser desentranhadas e destruídas impedindo a condenação de muitos envolvidos nos esquemas ilegais.
Desta feita, inquestionável que hoje a regra é a da inadmissibilidade da prova ilícita no processo civil, como ocorre no processo penal. Porém, essa garantia constitucional, como qualquer outra, é relativa e deve ser analisada caso a caso, o que significa dizer que a doutrina e a jurisprudência terão muito a discutir a este respeito, já que nunca houve uma lei infraconstitucional que regulamentasse a utilização das provas ilícitas e das provas ilícitas por derivação.
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*Advogada do escritório De Vivo, Whitaker, Castro e Gonçalves Advogados
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