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PEC dos Precatórios - A solução genial é nunca mais pagar

A Proposta de Emenda Constitucional dos Precatórios - a conhecida PEC - 12/06 - continua sendo defendida por membros dos Governos Estaduais como 'única forma de resolver o problema' da fila crescente de credores judiciais à porta dos Estados. Nesses termos manifestou-se, recentemente, o Sr. Procurador Geral do Estado de São Paulo, ao defender a adoção da PEC 12/06.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Atualizado em 3 de abril de 2009 11:42


PEC dos Precatórios - A solução genial é nunca mais pagar

Eduardo Ramires*

A Proposta de Emenda Constitucional dos Precatórios - a conhecida PEC - 12/06 (clique aqui) - continua sendo defendida por membros dos Governos Estaduais como 'única forma de resolver o problema' da fila crescente de credores judiciais à porta dos Estados. Nesses termos manifestou-se, recentemente, o Sr. Procurador Geral do Estado de São Paulo, ao defender a adoção da PEC 12/06.

A proposta defendida pelo Sr. Procurador, pode ser resumida nas seguintes regras:

1. Pagamento de precatórios apenas após prévia compensação com débitos do credor, inscritos na dívida ativa (art. 1º);

2. Pagamento de precatórios limitado ao correspondente a até 3% da despesa primária líquida do ano anterior para União e Estados, e de 1,5% para os Municípios (art. 2º);

3. Do montante comprometido com o pagamento de precatórios: 70% seriam destinados a pagamentos de credores habilitados em leilão, privilegiando aqueles que oferecerem deságios maiores.

4. Os restantes 30% seriam destinados aos credores não habilitados no leilão, a serem pagos na ordem crescente de valores dos precatórios: quanto menor o valor, mais cedo receberia o credor.

Em sua defesa da PEC, o Sr. Procurador Geral do Estado procurou chamar atenção para a última regra supra descrita, aquela pela qual a fila dos precatórios abandona a ordem cronológica e passa a privilegiar os créditos de menor valor. Trata-se, realmente, de uma solução genial: o fim da ordem cronológica, deixa os Administradores livres para reduzir, como quiserem, os valores comprometidos com o pagamento de credores judiciais, reduzindo o 'leve' desconforto político que a falta de pagamento desse tipo de dívida causa aos Srs. Governadores.

Certos de que a destruição da obrigação de atender a ordem cronológica eliminaria qualquer comprometimento de verbas públicas com o pagamento das dívidas judiciais, os Autores da indigitada PEC criaram então, um mecanismo ainda mais genial: o comprometimento mínimo obrigatório de 3% da despesa primária líquida do ano anterior (no caso da União e dos Estados e DF ou de 1,5% no caso dos Municípios). Com efeito, um dispositivo como esse daria aos Srs. Administradores Públicos a licença final para ignorar completamente o direito dos administrados e as conseqüentes decisões do Poder Judiciário: trata-se da institucionalização do 'devo não nego, pago se e quando puder'.

De tal maneira 'alforriado' o ente estatal da obrigação de responder pelos prejuízos pecuniários que causa aos administrados, já que as dívidas seriam parceladas ad infinitum, deparamo-nos com a terceira e última idéia genial contida na PEC: a maior parte do valor mínimo comprometido com o pagamento de precatórios seria destinado àqueles credores que se dispusessem, em leilão, a reduzir o valor da dívida, completando-se, dessa maneira, o engenhoso mecanismo de liquidação de dívidas sem pagamento. Em suma, quanto maior o valor da dívida, mais remota a expectativa de recebimento e maior o deságio (ou desconto) que o credor estaria disposto a aceitar para, finalmente, receber. Finalmente os Srs. Administradores teriam conseguido transformar a resistência ao cumprimento das obrigações de pagamento em desconto. Vejam a simplicidade da idéia genial, cada ano a mais que se posterga o pagamento da dívida, maior será o desconto a ser obtido.

A engenhosidade do mecanismo de calote concebido na PEC 12/06 não esconde a ameaça que ela representa para o futuro do Pais e de suas instituições.

Institucionalizar o calote das dividas constituídas no Poder Judiciário em face do Poder Público, significaria desacreditar de maneira cabal o papel e a relevância política do Poder Judiciário. Voltaríamos ao status quo das monarquias absolutas: o poder dos Juízes seria algo a ser aplicado meramente aos cidadãos, não ao Monarca ou aos seus interesses.

Essa conveniente condição de 'postergar ad infinitum' ou 'não pagar' as dívidas judiciais, entretanto, levaria, igualmente, ao descrédito institucional dos Poderes Executivos nas suas relações com financiadores (sobretudo externos) e fornecedores, obrigados e obter garantias de recebimento à vista, já que, diante de 'eventual' default deixariam de ter a (já alquebrada) possibilidade de acreditar no recurso ao Poder Judiciário.

Por tais razões é que a defesa de uma tal proposição não pode deixar de ser combatida por aqueles que acreditam que o Brasil é, sim, capaz de arcar com os custos do Estado Democrático de Direito, não havendo porque deixar de submeter-se, o Poder Executivo, às requisições pecuniárias oriundas do Poder Judiciário, em defesa do cumprindo da lei e das obrigações contratuais.

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*Sócio do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Advocacia

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