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A questão da vedação da compensação das antecipações mensais de IRPJ/CSLL

Tema hodierno em ebulição e que nesta oportunidade analisarei, se encontra disposto no art. 29 da Medida Provisória nº 449, de 03 de dezembro de 2008, que dá nova redação ao art. 74 da Lei nº 9.430/96, com inserção de vedação da compensação de créditos fiscais com antecipações mensais de IRPJ/CSLL, matéria esta objeto de regulamentação pela Receita Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa nº 900/08, art. 34, § 3º, inciso IX e que mereceu até cômodas e insipientes Soluções de Consulta da 6º Região Fiscal (Minas Gerais), terra de meu berço a qual venero.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Atualizado em 13 de março de 2009 11:38


A questão da vedação da compensação das antecipações mensais de IRPJ/CSLL

J. Miguel Silva*

Tema hodierno em ebulição e que nesta oportunidade analisarei, se encontra disposto no art. 29 da Medida Provisória nº 449, de 3 de dezembro de 2008 (clique aqui), que dá nova redação ao art. 74 da Lei nº 9.430/96 (clique aqui), com inserção de vedação da compensação de créditos fiscais com antecipações mensais de IRPJ/CSLL, matéria esta objeto de regulamentação pela Receita Federal do Brasil, por meio da Instrução Normativa nº 900/08, art. 34, § 3º, inciso IX e que mereceu até cômodas e insipientes Soluções de Consulta da 6º Região Fiscal (Minas Gerais), terra de meu berço a qual venero (nº 6, de 9/2/09 e 10, de 13 de fevereiro de 2009), in verbis:

"Solução de Consulta nº 6 de 9 de Fevereiro de 2009

Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário

Ementa: Os débitos relativos ao pagamento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL não podem ser objeto de compensação pelo sujeito passivo, inclusive nos casos em que o sujeito passivo reduza o valor da estimativa mensal por meio de balanços ou balancetes mensais de redução.

Solução de Consulta nº 10 de 13 de Fevereiro de 2009

Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário

Ementa: Os débitos relativos ao pagamento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL não podem ser objeto de compensação pelo sujeito passivo, inclusive nos casos em que o sujeito passivo reduza o valor da estimativa mensal por meio de balanços ou balancetes mensais de redução."

É oportuno aqui relatar que o duque e escritor parisiense François de La Rochefoucauld, com seu amargor característico que influenciou pensadores de sua e demais gerações, no século XVII, concluiu que há três espécies de desconhecimento "(1ª) Não saber o que devia saber, (2ª) saber mal o que devia saber e (3ª) saber o que não deveria saber".

As esparsas análises acessadas a respeito do tema, afora as malfadadas e precipitadas Soluções de Consulta da 6º Região Fiscal da RFB, datíssima vênia, nos leva a reflexão apenas, se se trata, nas lentes do duque francês, da (1ª) ou (2ª) espécie de desconhecimento.

Explico e por amor à objetividade serei breve, mas não menos profícuo, para esclarecimento da matéria.

Vamos para o texto do inciso IX, do § 3º, do artigo 34, da Instrução Normativa nº 900/08, que é replica do previsto na Medida Provisória nº 449/08, já citada:

"Art.34 - O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive o reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo administrado pela RFB, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela RFB, ressalvadas as contribuições previdenciárias, cujo procedimento está previsto nos arts. 44 a 48, e as contribuições recolhidas para outras entidades ou fundos.

§ 1º A compensação de que trata o caput será efetuada pelo sujeito passivo mediante apresentação à RFB da Declaração de Compensação gerada a partir do programa PER/DCOMP ou, na impossibilidade de sua utilização, mediante a apresentação à RFB do formulário Declaração de Compensação constante do Anexo VII, ao qual deverão ser anexados documentos comprobatórios do direito creditório.

§ 2º A compensação declarada à RFB extingue o crédito tributário, sob condição resolutória da ulterior homologação do procedimento.

§ 3º Não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º:

(...)

IX - o débito relativo ao pagamento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL apurados na forma do art. 2º da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996; (...)" (com grifos)

Observem que o § 3º, inciso IX, supra, veda a possibilidade de preenchimento da Declaração de Compensação para realizar a quitação de débito relativo ao pagamento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL apurados na forma do art. 2º da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996".

Ora, já disse em outras oportunidades e me encontro roco de dizê-lo: "uma coisa é ler outra coisa é interpretar, pois lei não é revista para ser lida".

Aqui, requer-se necessariamente praticar, segundo as ferramentas da hermenêutica, a interpretação sistemática, teleológica e histórica para real e exata compreensão da matéria, sob pena de empobrecer a conclusão.

Pela ordem, façamos primeiramente a interpretação sistemática. O artigo 34 de IN faz remissiva ao art. 2º da Lei nº 9.430/96, que diz:

"Pagamento por Estimativa

Art. 2º - A pessoa jurídica sujeita a tributação com base no lucro real poderá optar pelo pagamento do imposto, em cada mês, determinado sobre base de cálculo estimada, mediante a aplicação, sobre a receita bruta auferida mensalmente, dos percentuais de que trata o art. 15 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995 (clique aqui), observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 29 e nos arts. 30 a 32, 34 e 35 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995 (clique aqui), com as alterações da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995 (clique aqui).." (com grifo)

Pois bem, a IN regulamentadora estabelece que é vedada a compensação de créditos fiscais com débito relativo ao pagamento mensal por estimativa de que trata o artigo 2º da Lei nº 9.430/96 e como vimos, tal artigo dispõe sobre uma das formas de recolhimento de antecipação mensal para as empresas que adotam o regime anual.

Notem que é sine que non para assimilação plena do tema à baila, saber de pronto como se opera o regime anual do IRPJ/CSLL, na medida em que neste regime tributário, há duas formas (e não só uma ressalta-se) de recolhimento de antecipação mensal:

a- Antecipação pela estimativa por presunção sobre a receita bruta de que trata o artigo 2º da Lei nº 9.430/96 (antecipação não apoiada na escrituração contábil completa, basta conhecer a receita bruta mensal);

b- Antecipação pelo balancete mensal real acumulado de suspensão ou redução de que trata o artigo 35 da lei nº 8.981/95 (antecipação apoiada na escrituração contábil completa).

Ora, qual forma de antecipação mensal é vedada quitar por declaração de compensação, segundo a MP 449/08, regulamentada pela IN:

As duas formas de Antecipação?

É latente que não.

A MP e a IN fazem remissiva a antecipação versada pelo artigo 2º da Lei nº 9.430/96, o qual trata da antecipação mensal calcada na presunção sobre a receita bruta. Assim, é cabal: A MP e a IN não veda em nenhum momento a empresa utilizar crédito fiscal para quitar débito de antecipação apurado segundo o balancete mensal real acumulado tratado em norma díspar do artigo 2º da Lei nº 9.430/96, quero dizer, artigo 35 da Lei nº 8.981/95.

Mas pode alguns, tomados pelo sono da indolência, no vão noturno dizer: mas o artigo 2º da Lei nº 9.430/96 cita também o artigo 35 da Lei nº 8.981/95.

Para estes o duque seria indócil, e dando vazão ao seu ardor, acordemos para o fato já conhecido até pelos iniciantes em banco escolar de direito que a interpretação literal é uma espécie de hermenêutica de baixíssima escala quando dissociada do contexto legal dado pela interpretação sistemática e teleológica (método que requer identificar o sentido da norma - a mens legis).

De fato o artigo 2º da Lei nº 9.430/96 cita o artigo 35 da Lei nº 8.981/95, mas isto basta e permite concluir preguiçosamente que está vedada também, apenas pela citação textual, a compensação da antecipação mensal por ela tratada (balancete real mensal acumulado).

Proponho um pacto profissional para o bem da ciência do direito. A partir de hoje, sugiro a seguinte fórmula de cunho hermenêutico: interpretação literal = interpretação indolente.

Ora, a mera interpretação gramatical só gera conclusão entanguida e desluzida, assim, pratiquemos aqui a interpretação teleológica e adentremos ao âmago do artigo 2º da Lei nº 9.430/96, já relatado e para tanto atentemo-nos para o já grifado acima.

O artigo 2º da Lei nº 9.430/96 estabelece que a empresa recolherá antecipação mensal pela estimativa por presunção sobre a receita bruta, porém, observado a outra forma de apuração de antecipação (balancete real mensal acumulado).

O que quer dizer a semântica "observado".

Para este intento, basta a íris se voltar para o dicionário Aurélio, sem a necessidade aqui de visitar o também excelente Houais, para identificar que "observar", é sinônimo de "obedecer", bem como "respeitar". Portanto, o artigo 2º da Lei nº 9.430/96 trata da antecipação por estimativa por presunção respeitando o direito do contribuinte de optar pela forma de antecipação mensal de que trata o artigo 35 da Lei nº 8.981/95.

Do exposto supra, através da conjugação de todas as normas, a conclusão inafastável dá conta de que, a partir de 1.1.2009, fica impedida a empresa de compensar crédito fiscal com a antecipação pela estimativa por presunção sobre a receita bruta. E pare aqui. Não avancemos na vedação, pois não nos esqueçamos da máxima: é incabível ao intérprete avançar naquilo que a norma não o fêz.

É bom dizer que a vedação adstrita ao teor acima tem todo sentido e pratica justiça fiscal.

Esclareço.

Como pode o contribuinte efetuar, como fazia até 31.12.2008, visando planejamento financeiro (mais que tributário), compensação de saldo real anual negativo de IRPJ, apurado com base na escrituração contábil completa, para quitar IRPJ mensal calculado sobre receita bruta (não requer escrituração contábil), ou seja, feria o princípio da razoabilidade, por se tratar de bases constitutivas diferentes.

Agora, não está impedida em norma a possibilidade de utilizar crédito fiscal oriundo, como exemplo, do saldo negativo de IRPJ decorrente de balanço real anual, apurado em escrituração contábil completa, para adimplir, via declaração de compensação, IRPJ decorrente de balanço real mensal, apurado na escrituração citada.

Por fim se alega: Mas o sistema PER/DCOMP (versões 4.0 e 4.1) disponibilizada pela Receita Federal do Brasil veda a possibilidade de compensação para as duas formas de antecipação. É verdade.

Ora, se um sistema fiscal eletrônico ultraja a norma aplicável, isto requer apenas simplória alteração do instrumento, pois o sistema está subordinado à norma e não o contrário. E não se diga que o sistema PER/DCOMP (4.0/4.1) é ilegal, pois não existe este instituto jurídico, do contrário é imaginar que o SERPRO (que elabora os sistemas fiscais segundo especificações apresentadas pelos técnicos da RFB) passou a ter prerrogativas legislativas, até porquê, é certo que este competente órgão público nem teria este interesse, por já terem ocupações demais a sacrificar as mentes dos servidores que a compõem.

Portanto, o correto é dizer, o sistema PER/DCOMP, nas versões citadas encontra-se incorreto e equivocado, lembrando que essas versões foram elaboradas "a toque de tambor da Salgueiro", pois se voltarmos para o fato histórico, observaremos que a MP nº 449 foi publicada no DOU de 4.12.2008 e já, por volta do dia 10.1.2009, a versão 4.0 se encontrava disponibilizada com a vedação generalizada para as duas formas de antecipação.

Que correria. Invoquemos aqui as sábias palavras de Cícero "Nenhuma invenção é perfeita ao nascer".

É patente o ocorrido. Sabemos que a ficha "Débitos" da DCOMP tem como parâmetros, códigos de DARF, e também é de nosso conhecimento que as antecipações mensais, nas suas duas formas (art. 2º da Lei nº 9.430/96 e art. 35 da Lei nº 8.981/95) se operam pela mesma codificação, assim, o SERPRO bloqueou o código de DARF de antecipações mensais, sendo que previamente seria necessário a RFB instituir desdobramento dos códigos e bloquear sistemicamente apenas o código correspondente à antecipação impedida na MP/IN, quer dizer, estimativa por presunção sobre a receita bruta e jamais a outra forma de antecipação (balancete mensal real acumulado) segundo o amplamente analisado supra.

Bem, o que fazer neste momento, na hipótese da RFB ser morosa e tardia em sanar a irregularidade do sistema PER/DCOMP, o que não se recomenda num cenário de crise financeira a assolapar as empresas, contrário até ao pensamento maior do governo federal que tem-se manifestado em favor de medidas que permitam fluxo de caixa para o desenvolvimento das atividades das empresas, num palco ofuscado pela crise financeira mundial. Concretamente:

1ª - De maneira conservadora e em ofensa ao fluxo de caixa da empresa, se mesmo assim for viável, recolher em DARF a antecipação mensal, mesmo que pautado por balancete mensal acumulado e utilizar os créditos fiscais para quitar, via DCOMP, débitos tributários de outras espécies (ex: PIS, COFINS e IPI);

2ª - De maneira conservadora, se for viável, para o ano-calendário 2009, adotar o regime trimestral real definitivo, por que apresenta código de DARF próprio e não vedado na versão atual de DCOMP (art. 1º da Lei nº 9.430/96);

3º - De maneira mais avançada, no âmbito do direito tributário, questionar em juízo a Receita Federal do Brasil, com os elementos patentes e cristalinos aqui analisados e relatados, visando obter por medida cautelar o direito de compensar os créditos fiscais com a antecipação mensal do IRPJ/CSLL apurado segundo balancete real mensal acumulado apoiado na escrituração contábil completa, de que trata o artigo 35 da Lei nº 8.981/95.

Por oportuno, não deixa de ser recomendável também para o Congresso Nacional, ao apreciar a MP nº 449/08 para conversão em lei, nos termos do artigo 62 da CF/88 (clique aqui), providenciar emenda com o propósito de melhorar o texto presente no art. 29 da MP nº 449/08, deixando expresso e a olhos nus que a vedação para a compensação não se estende à antecipação mensal com base em balancete real mensal acumulado de que trata o artigo 35 da Lei nº 8.981/95, algo que em seu bojo manifesto está e não poderia ser diferente, pois em persistir a vedação generalizada constante na versão atual da PER/DCOMP, estaria afastando o direito constitucional do contribuinte de exercer a tributação do imposto sobre a renda efetiva conforme o artigo 153 (inciso III), lembrando que o CTN, em seu artigo 43 define que o imposto de renda tem como fato gerador a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica; assim, não permitir o aproveitamento de saldo negativo de IRPJ do balanço real anual com IRPJ mensal do balancete real mensal é aceitar tributação não real, ou seja, seria impor ditatorialmente tributação por via indireta pelo lucro presumido, o que é inconstitucional.

Só resta alertar que o amargor das palavras advindo da bílis do duque só fêz sentido este articulista invocar, caso o leitor desta pequena escrita alcançou assimilação plena de seu teor, pois outro escritor francês disse de forma dócil "A clareza é cortesia do homem de letras" (Jules Renard, século XIX).

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* Advogado e Contabilista. Tributarista e Especialista em Direito Empresarial. Sócio do escritório Miguel Silva & Yamashita Advogados Associados

 

 

 

 

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