Ministro Jobim e o Judiciário
O conhecido professor de Direito Constitucional Paulo Bonavides (Ciência Política, 1983) ensina que o poder somente será legítimo quando conseguir a aceitação na vida social por ele disciplinada. Assim, governantes, legisladores e juízes exercerão o poder legitimamente quando respaldados pela aceitação geral dos cidadãos.
sexta-feira, 15 de outubro de 2004
Atualizado em 14 de outubro de 2004 09:54
Ministro Jobim e o Judiciário
Rogério Medeiros Garcia de Lima*
O conhecido professor de Direito Constitucional Paulo Bonavides (Ciência Política, 1983) ensina que o poder somente será legítimo quando conseguir a aceitação na vida social por ele disciplinada. Assim, governantes, legisladores e juízes exercerão o poder legitimamente quando respaldados pela aceitação geral dos cidadãos.
O Brasil vive grave crise de legitimidade dos poderes. Executivo e Legislativo estão às voltas com a opinião pública. Quanto ao Judiciário, o ministro Nélson Jobim, ao assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal, afirmou que as agruras da Justiça brasileira chegaram à boca do povo. É cara, morosa e ineficiente.
Efetivamente todos reclamam, inclusive os magistrados, da lentidão do Judiciário em nosso país. Pouco tem sido feito para erradicá-la. Os juízes precisam abrir-se à sociedade. Para o ministro Jobim, não podem mais permanecer encastelados em seus gabinetes.
Da sua parte, governos federal, estaduais e municipais são os principais figurantes de processos judiciais. Violadores de direitos constitucionais dos cidadãos, contribuintes, servidores públicos e aposentados, respondem por mais de 80% dos processos represados nos diversos tribunais brasileiros. Recorrem a esmo.
Em setembro de 2003, o ministro da Defesa José Viegas comentou recurso judicial interposto pelo governo contra sentença de uma juíza federal. A decisão determinou a devolução, para as respectivas famílias, dos corpos de 61 militantes da esquerda desaparecidos. Viegas concluía: - Você já viu réu não recorrer?
A alta autoridade republicana ilustra bem o menosprezo que os governos têm para com a Justiça e a paciência dos cidadãos. O fato também revela a inutilidade das decisões dos juízes de primeiro grau. As demandas somente são definitivamente decididas pelos tribunais, depois de vagarem os processos por várias instâncias.
O mesmo ocorre com as liminares concedidas pelos juízes de primeiro grau. São medidas concedidas em favor das partes, logo no início do processo (por exemplo, impedir a cobrança de um imposto inconstitucional, suspender reajuste abusivo de tarifas públicas etc.). Velha lei do Regime Militar autoriza a cassação dessas medidas liminares pelos presidentes dos tribunais. Em época recente, diversas liminares, concedidas pelos juízes de primeira instância contra os afobados procedimentos das privatizações, foram cassadas com base naquela lei autoritária. Passada a febre privatizante, o BNDES levou monumental calote de empresa norte-americana. O atual governo federal celebrou questionável acordo para reestatizar empresa privatizada do setor elétrico.
O emérito jurista baiano J.J. Calmon de Passos criticou a concentração exagerada de poderes nos tribunais, em detrimento dos juízes de primeiro grau (Direito, Poder, Justiça e Processo, 1999). O ministro Nélson Jobim já afirmou, noutra ocasião, que o fortalecimento da primeira instância é uma das urgências da reforma judiciária.
É verdade que os juízes de direito incomodam bastante os poderes político e econômico. No entanto, os brasileiros precisam recordar a figura de Di Pietro, juiz italiano que viabilizou a "Operação Mãos Limpas". Era magistrado de primeiro grau, mas revolucionou os costumes políticos em sua pátria.
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*Juiz de Direito, membro do IAMG - Instituto dos Advogados de Minas Gerais
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