Concessão de Aeroportos: aspectos jurídicos
Recentemente, voltou-se a falar na possibilidade da concessão de aeroportos à iniciativa privada. O Governo Federal sinalizou a intenção de conceder, pelo menos, os aeroportos internacionais do Rio de Janeiro (Antonio Carlos Jobim-Galeão) e de Campinas (Viracopos), bem como um novo aeroporto a ser eventualmente construído no Estado de São Paulo.
quinta-feira, 27 de novembro de 2008
Atualizado em 26 de novembro de 2008 11:16
Concessão de Aeroportos: aspectos jurídicos
Ricardo Pagliari Levy*
Introdução
Recentemente, voltou-se a falar na possibilidade da concessão de aeroportos à iniciativa privada. O Governo Federal sinalizou a intenção de conceder, pelo menos, os aeroportos internacionais do Rio de Janeiro (Antonio Carlos Jobim-Galeão) e de Campinas (Viracopos), bem como um novo aeroporto a ser eventualmente construído no Estado de São Paulo.
Além dos estudos de viabilidade técnica e econômico-financeira a serem feitos, será necessário definir o formato jurídico das concessões. Neste texto, fazemos algumas considerações a respeito desse formato e de outras questões jurídicas.
Previsão legal
Segundo o Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/86 - clique aqui), aeroportos são aeródromos públicos, dotados de instalações e facilidades para apoio de operações de aeronaves e de embarque e desembarque de pessoas e cargas.
O artigo 36 do Código Brasileiro de Aeronáutica dispõe que os aeródromos públicos serão construídos, mantidos e explorados:
(i) diretamente pela União;
(ii) por empresas especializadas da Administração Federal Indireta ou suas subsidiárias, vinculadas ao atual Ministério da Defesa;
(iii) mediante convênio com os Estados ou Municípios; ou
(iv) por concessão ou autorização.
Atualmente, a maior parte dos aeroportos brasileiros - 67 deles, incluindo Galeão e Viracopos -- é explorada pela Infraero - Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária, empresa pública federal (item "ii" acima). Há, ainda, aeroportos explorados mediante convênios com Estados e Municípios (item "iii" acima), como os 30 aeroportos sob a responsabilidade do Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo - DAESP, uma autarquia estadual (SP).
Eventual concessão de aeroportos à iniciativa privada será feita com base no inciso IV do artigo 36 do Código Brasileiro de Aeronáutica (item "iv" acima). Ou seja, já há previsão legal suficiente para que isso seja feito, sem a necessidade da promulgação de uma nova lei. Bastará apenas a edição de normas infralegais pelos órgãos competentes (notadamente o Ministério da Defesa, o Comando da Aeronáutica e a ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil).
Remuneração do concessionário
As mais importantes fontes de renda na exploração de aeroportos são as tarifas aeroportuárias referentes à movimentação de carga e ao transporte de passageiros, bem como as receitas acessórias, principalmente as decorrentes da locação de áreas para a instalação de lojas e serviços, estacionamento de automóveis, veiculação de anúncios publicitários, etc.
Evidentemente, cada aeroporto tem o seu próprio perfil. Por exemplo, quanto maior o volume de passageiros transportados, mais alto o valor potencial das receitas acessórias.
Os aeroportos do Galeão e de Viracopos são ambos superavitários, este último sobretudo graças ao grande volume de carga transportada. Nesses casos, é possível que o edital de licitação preveja o pagamento de um valor expressivo pelo concessionário à União Federal, em contrapartida à outorga da concessão.
Alternativamente, condicionado à liberalização do valor das taxas aeroportuárias pela ANAC, o edital poderá dispor que a concessão será outorgada ao licitante que propuser as menores tarifas - de modo similar ao que foi feito na bem-sucedida concessão de sete trechos de rodovias federais, no ano passado.
No caso da concessão para construção e exploração de um novo aeroporto no Estado de São Paulo, os estudos de viabilidade poderão concluir que as taxas aeroportuárias e demais receitas terão sido suficientes, ao final do contrato, para a remuneração integral da obra de construção e das despesas de operação e manutenção. Isso permitiria a outorga de uma concessão tida como "comum", regida pela Lei de Concessões (Lei nº 8.987/95 - clique aqui). Já na hipótese de se concluir que a renda será insuficiente, será necessária uma parceria público-privada (PPP), conforme tratado a seguir.
Aeroportos deficitários - parceria público-privada (PPP)
A maioria dos aeroportos brasileiros é deficitária. Uma das formas para outorga da sua exploração à iniciativa privada é a concessão, a um mesmo licitante, de um ou mais aeroportos deficitários, juntamente com um ou mais aeroportos superavitários. Os lucros obtidos com estes compensariam os prejuízos sofridos com aqueles.
O ideal, porém, é que aeroportos deficitários tenham a sua exploração concedida através de concessões "patrocinadas". Trata-se de uma das duas modalidades de PPP, de que trata a Lei nº 11.079/04 (Lei Federal das PPPs - clique aqui).
Pela concessão patrocinada, o parceiro público (poder concedente) paga ao parceiro privado (concessionária) uma contraprestação pecuniária, em complemento à tarifa cobrada dos usuários dos serviços. É justamente o formato jurídico criado para as situações em que interessa ao poder público a outorga dos serviços (e eventuais obras) à iniciativa privada, mas que as tarifas e as eventuais receitas acessórias não serão suficientes para a viabilidade do contrato.
Em 2006, o Governo Federal chegou a submeter a consulta pública um edital de PPP de concessão patrocinada, que se destinava à exploração de trechos das rodovias BR 116 e BR 324. Porém, o processo foi cancelado, no momento em que se concluiu que os projetos seriam superavitários -- ou seja, não se poderia mais cogitar uma concessão patrocinada, mas sim uma concessão comum.
No caso dos aeroportos, é teoricamente possível que estudos concluam que alguns dos aeroportos atualmente deficitários sob administração estatal tornar-se-ão superavitários sob eventual administração privada. Nessas hipóteses, evidentemente, será adequada a concessão comum.
Participação estrangeira
Não há nenhuma restrição legal à construção e/ou exploração de aeroportos em território brasileiro por empresas estrangeiras ou por empresas brasileiras controladas por estrangeiros.
Será desejável que os editais de licitação para concessão de aeroportos permitam a participação de empresas estrangeiras, isoladamente ou em consórcio com outras empresas, constituídas ou não no Brasil. Isso propiciará maior competitividade no processo, aumentando-se a possibilidade de condições mais vantajosas ao poder público e aos usuários dos aeroportos.
Entretanto, mesmo que, por razão relevante, se vede a participação de empresas estrangeiras, não poderá haver restrições à participação de empresas constituídas no Brasil, controladas por estrangeiros.
Modalidade de licitação
Desde 2005, por força da Lei nº 11.196/05 (clique aqui), os editais para outorga de concessões comuns, regidas pela Lei de Concessões, podem prever a inversão das fases de habilitação e de propostas, com o oferecimento de lances sucessivos pelos licitantes (o chamado "leilão"). No caso das concessões patrocinadas, desde a promulgação da Lei das PPPs, é permitida a licitação com a inversão de fases e o oferecimento de lances.
No mais, as licitações devem seguir basicamente o rito da modalidade "concorrência" sob a Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93 - clique aqui), com as peculiaridades previstas, respectivamente, pela Lei de Concessões e pela Lei das PPPs.
Conclusão
Sob o ponto de vista jurídico, a concessão da exploração de aeroportos à iniciativa privada é perfeitamente factível. O estabelecimento de regras detalhadas e claras dará o conforto legal necessário à ampla participação de operadores e investidores, nacionais e estrangeiros, nas licitações a serem lançadas.
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*Associado da Área Contenciosa do escritório Pinheiro Neto Advogados
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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