As alterações da lei das sociedades anônimas e a projeção dos resultados das empresas
Há muito tempo aguardado pelo mercado e pelas grandes Cias. Brasileiras, dentre as quais aquelas dedicadas ao setor de energia, o projeto de Lei nº. 3.741/00 foi finalmente convertido na Lei nº. 11.638, de 28.12.07, a qual produziu consideráveis alterações no texto da Lei nº. 6.404, de 15.12.76 (Lei das Sociedades Anônimas - LSA).
segunda-feira, 27 de outubro de 2008
Atualizado em 24 de outubro de 2008 08:01
As alterações da lei das sociedades anônimas e a projeção dos resultados das empresas
Mauro da Cruz Jacob*
Há muito tempo aguardado pelo mercado e pelas grandes Cias. Brasileiras, dentre as quais aquelas dedicadas ao setor de energia, o projeto de Lei nº. 3.741/00 (clique aqui) foi finalmente convertido na Lei nº. 11.638, de 28.12.07 (clique aqui), a qual produziu consideráveis alterações no texto da Lei nº. 6.404, de 15.12.76 (Lei das Sociedades Anônimas - LSA - clique aqui). Estas alterações objetivaram aumentar o grau de transparência das Cias. Brasileiras e possibilitarão o fortalecimento do nosso mercado de capitais.
O atual texto apresenta importantes modificações de conceitos no campo societário, sobretudo em seu aspecto estrutural, quanto aos critérios de mensuração de ativos e passivos, e, conseqüentemente, na determinação dos resultados projetados pelas Cias. para os próximos anos.
Dentre as diversas modificações, é importante comentar a nova redação do Inciso V, do art. 179, da LSA, dispositivo que regula os critérios para a ativação de despesas incorridas para o desenvolvimento das atividades das Cias., isto é, se as mesmas devem ser registradas como ativo diferido (baixadas em resultado a longo prazo) ou reconhecidas imediatamente em resultado.
Para um adequado entendimento desta transformação é necessário analisar o tratamento anteriormente aplicável e pelo qual a classificação de despesas como ativo diferido era possível sem maiores restrições (sem redução imediata do resultado), desde que tais gastos pudessem ser atrelados à formação do resultado de mais de um exercício social, independentemente de aumento de resultado ou não. Pelo seu caráter genérico, a regra permitia que parte das despesas que poderiam afetar resultados futuros pudessem ser ativadas, preservando momentaneamente os lucros apurados pelas Cias.
Se, por um lado, a legislação societária brasileira apresentava-se de forma amplamente permissiva, no cenário internacional, as práticas reconhecidas sempre tenderam a restringir o deferimento de despesas, obrigando as Cias. ao reconhecimento imediato de gastos no resultado de cada exercício social.
Tal divergência de tratamento, por muito tempo, contribuiu para a diferença entre os resultados apurados segundo as práticas societárias reconhecidas no Brasil e àquelas aceitas em outros ambientes econômicos, o que se verificava de forma latente nas Cias. que, por obrigação legal ou contratual, estavam sujeitas a reportar as suas demonstrações financeiras para o exterior, fazendo a sua conversão para os padrões internacionais.
Já a nova redação do Inciso V, do art. 179 da LSA, somente admite a ativação de despesas que tenham natureza pré-operacional ou estejam vinculadas à reestruturação. Pelo conteúdo da norma, o conceito de "despesa pré-operacional" pode ser aplicado à Cia. como um todo ou somente em relação a uma atividade a ser desenvolvida.
No tocante à "reestruturação", expressão utilizada pelo dispositivo, é possível encontrar uma referência no item 44, da Deliberação CVM nº. 527, de 1.11.07 (clique aqui) "Reestruturação é um programa que é planejado e controlado pela administração e que muda, significativamente, o negócio levado a efeito por uma entidade ou a maneira como o negócio é conduzido".
Ainda, nas duas situações (pré-operacional e reestruturação), é necessário, para efeito de registro de despesa como ativo diferido, que tais gastos possam contribuir para o efetivo aumento do resultado de mais de um exercício social. Veja-se, portanto, que se trata de uma regra objetiva que não permite a classificação como ativo diferido por mera abstração, na medida em que somente por adequada demonstração de expectativa de incremento de resultados futuros, através de critérios econômicos; projeções e outros meios, é que será possível sustentar tal classificação.
O aumento do resultado - condição exigida pelo dispositivo para a ativação da despesa - não pode ser derivado de redução de custos ou acréscimo de eficiência operacional, ou seja, tem que haver, por estudos econômicos, demonstração clara e efetiva de que haverá aumento de receitas em razão daquele gasto que está sendo ativado.
Esta nova previsão, em vigor desde 1.1.08, pode atingir diretamente os resultados projetados pelas Cias., em especial quanto ao tratamento dos gastos que, pela regra anterior, poderiam ser classificados como ativo diferido, e, todavia, não se enquadrem na nova disposição, fazendo com que o lucro de algumas Cias. seja inferior àquele inicialmente esperado.
Certamente, as Cias afetadas pelas novas regras terão a difícil tarefa de adaptação para os próximos anos, revendo as suas projeções de resultados, sem perder de vista a expectativa dos seus investidores quanto aos respectivos fluxos de dividendos.
Para as Cias. com atuação no setor de energia em geral, cuja atividade demanda fortes aplicações de recursos necessários à consecução dos seus objetivos, estes impactos devem ser cuidadosamente dimensionados, através da revisão dos seus orçamentos, o que permitirá às suas respectivas Administrações se anteciparem a estes possíveis efeitos.
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*Advogado do escritório Gaia, Silva, Rolim & Associados - Advocacia e Consultoria Jurídica
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