A inviolabilidade dos escritórios de advocacia
Contrário, embora, à chamada "criminalização da violação das prerrogativas profissionais" do advogado, em razão dos termos - vagos e ambiciosos demais - em que foi proposta no Congresso Nacional, não constato desejo de privilégios no projeto de lei que, especificamente, cuida da inviolabilidade dos escritórios de advogados, modificando o art.7º da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia.
quarta-feira, 6 de agosto de 2008
Atualizado em 5 de agosto de 2008 13:14
A inviolabilidade dos escritórios de advocacia
Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues*
Contrário, embora, à chamada "criminalização da violação das prerrogativas profissionais" do advogado, em razão dos termos - vagos e ambiciosos demais - em que foi proposta no Congresso Nacional, não constato desejo de privilégios no projeto de lei que, especificamente, cuida da inviolabilidade dos escritórios de advogados, modificando o art.7º da Lei 8.906/94 (clique aqui), o Estatuto da Advocacia. Minha única restrição é quanto à obrigatoriedade da presença de um representante da OAB na diligência, exigência que pode propiciar demoras na escolha do representante e eventuais alertas de solidariedade profissional. Alertas que permitiriam o desaparecimento de provas antes da chegada dos policiais ao escritório. Isso, sem falar na alta probabilidade da apreensão se transformar em conflito altamente inflamável, conforme o temperamento dos envolvidos.
Uma melhoria possível no projeto seria este dispor que a OAB só seria intimada da diligência quando já presentes os policiais no local e limitada sua atuação a simplesmente acompanhar o andamento do trabalho, podendo fotografar, gravar e filmar o que bem entenda, mas sem direito de estabelecer um "contraditório local", sem um juiz para impor a ordem. É previsível o que pode resultar de uma infindável e esquentada discussão sobre o que pode ou não ser apreendido. "A posteriori" o valor jurídico da apreensão poderá ser analisado, mais friamente, em juízo.
No mais, esse projeto não exagera em favor do advogado, que, à semelhança dos médicos e sacerdotes, precisa resguardar os segredos do seu cliente. Não proíbe a apreensão dessa prova quando o investigado é o próprio advogado. Nem proíbe a apreensão da prova contra algum cliente seu que, na realidade, seria mais comparsa que cliente. É o que propõe o legislador, ao alterar os parágrafos 6º e 7º do art. 7º do aludido Estatuto. Minha impressão é que muitos que manifestam opinião sobre o tema não se deram ao trabalho de ler, cuidadosamente, o que consta do projeto, disponível na internet.
O projeto é equilibrado, na sua essência, e não abusa da circunstância de o Congresso Nacional ter em sua composição grande número de bacharéis em direito. Em suma, se houver veto, que este se limite à referida exigência de presença de um representante da OAB. Ou, se presente, que apenas vigie, sem poder interferir. Algo difícil de não ocorrer, porque o advogado, de modo geral, tem a combatividade no sangue, o mesmo ocorrendo com o policial. Mais prudente - diminuindo as tensões - será manter o projeto, como está, exceto cancelando a presença de um representante da OAB, que pode demorar a chegar.
Por vezes, a discussão do tema "abuso das escutas" mistura-se com outros: "abuso da invasão de escritórios" para apreensão de provas e a "criminalização da violação das prerrogativas". A escuta não autorizada por juiz é sempre ilegal. Cabe à polícia reprimi-la, seja quem for a vítima. E presume-se que o juiz, antes de autorizá-la, examine sua pertinência, não se contentando com um vago "consta que", ou "dizem...". Se há convincentes informações de que, por exemplo, um magistrado está vendendo decisões; se um advogado está desvirtuando sua profissão, agindo mais como criminoso do que como defensor; se um sacerdote está servindo como "pombo correio" de traficantes, ou vendendo segredos obtidos em confissão; se um médico tira proveito econômico revelando a existência de um câncer do cliente a um inimigo ou concorrente deste - exemplos dificílimos de ocorrer, mas que comprovam uma tese - não há porque impedir escutas autorizadas, porque nenhum classe paira acima do bem e do mal. E o mesmo se diga da apreensão de prova em qualquer recinto. Cabe à autoridade judiciária agir com critério, sem timidez nem precipitação.
Enfim, o projeto de lei em referência não é mau nem abusivo. Espantoso é que, no tema conexo, "os grampos", ainda ocorra troca de segredos pelo telefone.
*Desembargador aposentado do TJ/SP e Associado Efetivo do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo
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