Cupins Tributários, CPMFs e PECs
Há 8 anos, Vito Tanzi, cultuado Diretor de Assuntos Fiscais do FMI, analisando a arrecadação dos países industrializados membros da OCDE, já prenunciava o esgotamento da tributação sobre a renda, a propriedade e o consumo, advertindo para o silencioso e ininterrupto trabalho dos "cupins tributários" (fiscal termites), devorando as fundações dos sistemas impositivos tradicionais e para urgente necessidade de se reinventar formas de custear o Estado. Para Tanzi, a "descoberta" do IVA em meados do Séc. XX e da recente tributação sobre transações financeiras, na América Latina, eram os dois mais importantes exemplos do desenvolvimento da tecnologia da tributação nos últimos 50 anos.
quarta-feira, 4 de junho de 2008
Atualizado em 3 de junho de 2008 11:51
Cupins Tributários, CPMFs e PECs
Eurico Marcos Diniz de Santi*
Há oito anos, Vito Tanzi, cultuado diretor de assuntos fiscais do Fundo Monetário Internacional - FMI, analisando a arrecadação dos países industrializados membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE, já prenunciava o esgotamento da tributação sobre a renda, a propriedade e o consumo, advertindo para o silencioso e ininterrupto trabalho dos "cupins tributários" ("fiscal termites"), devorando as fundações dos sistemas impositivos tradicionais, e para a urgente necessidade de se reinventar formas de custear o Estado. Para Tanzi, a "descoberta" do Imposto sobre Valor Agregado - IVA em meados do século XX e a recente tributação sobre transações financeiras, na América Latina, eram os dois mais importantes exemplos do desenvolvimento da tecnologia da tributação nos últimos 50 anos. Além disso, sua particular recomendação para o Brasil é objetiva: não aumentar impostos, mas sim reduzir gastos.
Siglas como CPMFs e PECs podem parecer eficientes pesticidas contra cupins tributários, entretanto, enredados pelo vício de nossa cultura de gastos e tributação, tendem a fortalecer o implacável calotermitídeo: é irresponsável a pretensão da Emenda Constitucional nº 29 (clique aqui) de aumentar gastos e absurdo propor uma nova CPMF para custeá-los. Por outro lado, nem a Proposta de Emenda Constitucional - PEC nº. 233 (clique aqui), nacionalizando o ICMS e criando o IVA federal, nem o sofisticado substitutivo do senador Francisco Dornelles, unificando estes dois tributos com o IPI e o ISS na formação do super-IVA, parecem sugerir soluções politicamente viáveis.
O sistema tributário brasileiro é refém de um fordismo tardio cujo coração ainda é a oneração da produção, do fator trabalho e do consumo, conforme tem denunciado, reiteradamente, o ministro Mangabeira Unger e um recente relatório do Ipea revelando que os pobres pagam mais tributos do que os ricos. E, entre si, mesmo os ricos pagam cargas tributárias distintas, pois em impostos declaratórios - como ICMS, IPI, IR, PIS, Cofins ou IVA - sempre é possível dizer a verdade com o dom de iludir: tais tributos não incidem sobre fatos geradores reais, mas sobre as versões consolidadas em provas de negócios direitos e indiretos repletos de margem para fraude, dissimulação e passeios em paraísos fiscais. São os cupins atacando. Enquanto a Europa procura soluções para os problemas de seu IVA, talvez não seja a melhor opção importar empecilhos em nome da harmonização solidária de compartilhar problemas fiscais.
Em meio a este cenário desolador, vale refletir sobre a PEC nº. 242 que se encontra em tramitação discreta na Câmara dos Deputados. Tal proposta apresenta um plano real de resgate dos trabalhadores da economia informal pela desoneração do trabalho. Elimina, radicalmente, a contribuição sobre a folha de salário do empregador e aumenta a faixa de isenção do Imposto de Renda das pessoas físicas dos atuais R$ 1.372,81 para até R$ 12.000,00 mensais.
O mérito desta PEC, de única página e que modifica apenas três artigos da Constituição Federal, é o de que, além de harmonizar-se completamente com a PEC nº. 233 proposta pelo governo, atinge, tão-apenas, estes dois tributos e assegura, sem aumento da carga tributária, o mesmo volume de recursos recebidos hoje pelo fisco. Trata-se de uma proposta simples e objetiva. Substitui a contribuição patronal que arrecada anualmente R$ 44 bilhões (considerando também o Supersimples) incidente sobre o empregador pela contribuição sobre lançamento a débito bancário - CDB com alíquota de 0,5% e que gerará R$ 46,5 bilhões para a Previdência Social, ao mesmo tempo em que garante, em contrapartida, a neutralização deste 0,5% aos empregados, via compensação salarial do respectivo valor, mediante regra constitucional dirigida aos sindicatos patronais e de empregados e programada para incidir nos respectivos dissídios coletivos de cada categoria.
Paralelamente, a PEC propõe um histórico aumento da faixa de isenção do Imposto de Renda das pessoas físicas, alforriando a classe média dos grilhões da impiedosa tributação na fonte e compensando o caixa do governo com a instituição do imposto sobre crédito bancário - ICB com alíquota inferior a 0,38%. Assim, uma pessoa física com rendimento até R$ 12 mil mensais pagaria apenas 0,38% de ICB e seria isenta do Imposto de Renda; rendimentos acima de R$ 12 mil pagariam 0,38% de ICB e Imposto de Renda em conformidade com os critérios de progressividade em vigor.
Note-se, a CPMF não era injusta e sequer festejamos no bolso sua eliminação. Mas, em sua eterna provisoriedade, foi definitivamente sepultada pelo Senado Federal, muito mais pelas promessas que não cumpriu do que pelos pequenos pecados atinentes a sua destinação.
Esta proposta é diferente, não aumenta carga tributária: substitui tributos declaratórios, como a contribuição do empregador sobre a folha e parte da incidência do Imposto de Renda, que geram grandes externalidades negativas na economia - como o incentivo à informalidade - por dois tributos que oferecem a mesma arrecadação, mas que apresentam base tributária mais ampla e são impassíveis de sonegação. É bom demais para ser verdade!
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