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Ministério Público - Breve esboço

Lato Sensu, muito se fala acerca do Ministério Público nas aulas do curso de Direito, entretanto, a matéria não recebe a atenção efetivamente necessária. Não há ementa específica que trate o tema ou uma explicação pormenorizada, por este fato, surgem dúvidas quanto a natureza jurídica do orgão ministerial, bem como sua estrutura e seu funcionamento.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Atualizado às 11:28


Ministério Público - breve esboço

Clarissa Pires Pamplona*

Lato Sensu, muito se fala acerca do Ministério Público nas aulas do curso de Direito, entretanto, a matéria não recebe a atenção efetivamente necessária. Não há ementa específica que trate o tema ou uma explicação pormenorizada, por este fato, surgem dúvidas quanto a natureza jurídica do órgão ministerial, bem como sua estrutura e seu funcionamento.

Inicialmente, cumpre-nos resgatar acerca do nascimento do Ministério Público. A origem mais aceita é a Ordenança do Rei Felipe IV (o Belo) na França, que instituiu aos seus representantes ("avocatus du roi" e "procureurs du roi") a prestação de um juramento similar ao dos magistrados, sendo-lhes defeso prestar serviços a outro monarca, incumbindo-lhes fiscalizar a atuação dos juízes.

Com a Revolução Francesa houve melhor estruturação da instituição, ao serem conferidas garantias aos seus integrantes. Entretanto, especialmente com o advento do Código de Instrução Criminal e da Lei de 20 de abril de 1810, efetivamente se instituiu o "parquet".

Oportunamente, há que se dizer que a expressão "parquet" remonta também da França. Neste idioma a palavra significa assoalho. Os doutrinadores elucidam a questão, ao se referirem aos primórdios da instituição, pois os agentes do órgão ministerial permaneciam em salas de audiências em um local separado daquele reservado aos magistrados, ressalte-se, em um nível inferior, no "parquet" (assoalho). Na atualidade o termo é usado para denominar tanto o Ministério Público quanto seus membros.

No Brasil, o órgão ministerial encontra raízes no Direito Lusitano do período colonial. O marco inicial são as Ordenaçoes Manuelinas em 1514, que já mencionavam o promotor de justiça.

Após breve relato histórico, observamos que a instituição surgiu da necessidade de se criar um órgão "que se encarregasse de promover a defesa dos interesses coletivos da sociedade na repressão dos crimes [...] era preciso encarregar alguém de defender permanentemente os interesses comuns da sociedade perante o Poder Judiciário" (Theodoro, 2007, p.174). Assim, o referido órgão tem como função primeira a de ser o titular da pretensão punitiva estatal, evoluindo sua atuação posteriormente também ao processo civil.

A ilustre Professora Ada Pelegrini Grinover (1974), sobre o papel do Ministério Público, assegura tratar-se de "instituição destinada à preservação dos valores fundamentais do Estado enquanto comunidade". Já Gabriel Rezende Filho define ser "a personificação do interesse coletivo ante os órgãos jurisdicionais, o representante da ação do Poder Social do Estado junto ao Poder Judiciário".

Como se vê, contrariamente do que se imagina, trata-se de órgão autonômo (visto que possui autonomia orçamentária, administrativa e funcional) e independente do Poder Judiciário, muito embora exerça funções junto à este. Cabe-lhe segundo o artigo 129 da Carta Magna (clique aqui), in verbis:

"a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis".

Estruturalmente, o MP é regulado pelo art. 128 da Constituição Federal, dividindo-se em Ministério Público da União (MPU - regido pela Lei Complementar nº. 75/1993 - clique aqui) e Ministério Público estadual (MPE - regido pela Lei nº. 8.625/1993 - clique aqui). O órgão do "parquet" que atua no primeiro grau de jurisdição no âmbito estadual é o promotor de Justiça, e no âmbito de segundo grau a atuação é conferida ao Procurador de Justiça. Já no âmbito da União, o Procurador-Geral da República é o chefe máximo do órgão, sendo os Procuradores da República designados para oficiar junto ao primeiro grau de jurisdição.

Cabe-nos aqui abrir um parenteses para informar quanto à questão da terminologia empregada. Ao nos referirmos ao MPU ou MPE, tomemos a divisão elencada no art. 128, inc. I e II da Constituição Federal, já ao utilizarmos o termo MP, tomemos a forma global do órgão.

Assim, o MP possui princípios inerentes à sua atividade, quais sejam:

1) independência funcional (onde de cada membro do órgão se exige submissão à lei, sem no entanto significar que não possa emitir sua opinião)

2) unicidade e indivisibilidade (o que significa que a atuação do MP é corporativa, podendo ser substituídos seus membros, um por outro, sem prejuízo aos autos já que não há vinculação de um promotor ao processo). Os princípios da unidade e indivigibilidade deve ser visto com ressalvas, já que como explanado, "inexiste unidade entre o Ministério Público Federal e o dos Estados, nem entre o de um Estado e outro." (Moraes, 2004, p. 518)

Por força da EC 45/2004 (clique aqui), que incluiu o art. 130-A na norma fundamental, foi criado o Conselho Nacional do Ministério Público, órgão análogo ao Conselho Nacional de Justiça, com a função de controlar a autuação financeira e administrativa do Ministério Público e ainda o cumprimento dos deveres funcionais de seus membros (tanto em sede federal quanto na estadual).

O MP é um órgão de carreira, cujo ingresso ao seu quadro funcional se dá por meio de concurso de provas e títulos (art. 129 § 3 da CF), sendo resguardado a seus membros prerrogativas idênticas às dos magistrados (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade dos subsídios - art. 128 da CF § 5º, I.

A organização do MPE é prevista nos artigos 5º a 7º da Lei 8.625/93. As promotorias de justiça é o órgão que atua mais diretamente junto à população. Podem ter caráter judicial ou extrajudicial, e função geral, cumulativa ou especial (que tratam de uma matéria especifica como defesa da criança e do adolescente, meio ambiente, etc...)

Quanto à competência material, no âmbito criminal, segundo o artigo 129, inciso I da Constituição Federal e art. 24 do Código de Processo Penal (clique aqui), o Ministério Público possui o "dominius litis", ou seja é o senhor da ação penal pública. O exercício dessa prerrogativa se dá pelo oferecimento da denúncia. Esta, segundo Tourinho (2007, p.398/399):

"na técnica processual brasileira, significa a peça inaugural da ação penal, quando promovida pelo Ministério Público [...] É a petição inicial, quando se tratar de crime de ação pública, e petição que corresponde àquela do Processo Civil."

A atuação no processo penal é a noção mais costumeira que se tem do "parquet". Resta esclarecer que o órgão ministerial tem outras funções institucionais encartadas no mesmo artigo da Carta Magna.

No Processo Civil, o órgão possui caráter dúplice, atuando ora como sujeito (art. 81 do CPC) ora exercendo o "custos legis", ou seja, o papel de fiscal da lei (Art. 82 do CPC - clique aqui).

Curioso demonstrar que Humberto Theodoro Júnior (2007) adota como título de um capítulo de seu Livro Curso de Direito Processual Civil - vol. 1 a expressão "Sujeito Especial do Processo" ao se referir ao MP. Afirma que "sua posição jurídica é a de substituto processual (art. 6º), em razão da própria natureza e fins da instituição do Ministério Público ou em decorrência da vontade da lei. Age, assim, em nome prório, embora defendendo interesse alheio. [...] quer atue como parte principal quer como substituto processual, é parte quanto está em juízo e nunca procurador ou mandatário de terceiros." (Theodoro, 2007 p.174 apud Assis).

Verifica-se a legitimidade do referido órgão para figurar no pólo ativo da demanda, nos casos de Ação Civil Pública (art. 5º da Lei nº. 7.347/85 - clique aqui), nos processos que envolvem os direitos do consumidor (art. 82,I da Lei nº. 8.078/90 - clique aqui), nas ADIN's (Lei nº. 9.868/99, art. 2, inc. VI - clique aqui), idosos, infância e juventude, povos indigenas, eleitoral, dentre outras matérias. Ressalte-se que o órgão em análise não se sujeita ao pagamento de custas; ainda o prazo para contestação lhe é contado em quádruplo e para recorrer em dobro (art. 188 do CPC). Entretanto, nunca poderá ser demandado como sujeito passivo ou réu, podendo assumir ocasionalmente a defesa de terceiros (em caso de interdição, por exemplo).

No caso da atuação como fiscal da lei, a previsão legal está no art. 82 do Código de Processo Civil, devendo o órgão ministerial intervir nas causas que envolvam incapazes, o estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, casamento, interdição, litígios coletivos pela posse da terra rural ou que envolvam interesse público, em especial a defesa do patrimônio público. Nestas situações em que a lei obriga a intervenção do Ministério Público, a falta de sua intimação para o feito gera a nulidade do processo (art. 84 e 246 do CPC).

Atuando como "custos legis", o Ministério Público possui direitos e deveres. O mesmo diploma processual garante ao "parquet" vistas aos autos após as partes, intimação pessoal de todos os atos processuais, sendo-lhe garantido juntar documentos e certidões, produzir provas e requerer diligências no processo. É também cabível opor exceção de impedimento e suspeição do juiz, suscitar conflito de competência e mesmo interpor recurso.

Na contramão, há responsabilidade civil do órgão ministerial quando o membro do MP no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraudulentamente. A parte prejudicada deverá ingressar com Ação de Ressarcimento contra o Poder Público, que por sua vez promoverá ação regressiva contra seu integrante.

Na prática cível, o "parquet" emite cotas e pareceres, destinados ao Juiz da causa, visando fiscalizar e auxiliar o andamento processual. A sua atuação se dá de maneira imparcial, objetivando fundamentalmente o esclarecimento da verdade dos fatos.

"Não lhe cabe decidir ou solucionar litígios, mas apenas bater ou propugnar pela prevalência do interesse geral e do bem comum na prestação jurisdicional a cargo do Poder Judiciário" (Theodoro, 2007, p.175)

O presente esboço não busca de forma alguma esgotar a matéria, mas tão somente esclarecer aspectos acerca do Ministério Público, que por inúmeras vezes carecem de informação ao meio acadêmico e à população em geral.

Por todo exposto fica claro que a instituição Ministério Público, quer atuando no âmbito penal ou no cível, busca atuar ativamente no seio da comunidade, prestando-lhe serviços de inestimável valia como defensor da cidadania e da ordem pública. Ainda que não seja um dos três poderes delineados pelo conhecido filósofo iluminista:

"O Ministério Público se apresenta com a figura de um verdadeiro poder do Estado. Se Montesquieu tivesse escrito hoje o Espírito das Leis, por certo não seria tríplice, mas quádrupla, a Divisão dos Poderes. Ao órgão que legisla, ao que executa, ao que julga, um outro órgão acrescentaria ele - o que defende a sociedade e a lei, perante a justiça, parta a ofensa de onde partir, isto é, dos indivíduos ou dos próprios poderes do Estado" (Lyra, 1989, p.15)

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*Acadêmica do 4º ano de Direito





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