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O silêncio do violão sorriso de Chico Soares, o Canhoto da Paraíba

"Nossas vidas, inclusive as dos artistas e gênios, estão sob a égide das leis universais da Natureza. Uma caótica e incompreensível Lei que faz girar o universo, transformando a tudo e a todos, inexoravelmente. O que atinge hoje o nosso Canhoto da Paraíba, atingiu antes a tantos e tantos gênios e nobres seres humanos, quanto a simples e insignificantes mortais.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Atualizado em 29 de abril de 2008 09:50


O silêncio do violão sorriso de Chico Soares, o Canhoto da Paraíba

Abílio Neto*

"Nossas vidas, inclusive as dos artistas e gênios, estão sob a égide das leis universais da Natureza. Uma caótica e incompreensível Lei que faz girar o universo, transformando a tudo e a todos, inexoravelmente. O que atinge hoje o nosso Canhoto da Paraíba, atingiu antes a tantos e tantos gênios e nobres seres humanos, quanto a simples e insignificantes mortais. A diferença é que os artistas e gênios tiveram a dádiva também propiciada pela incompreensível Lei de possuírem talentos superlativos e criaram obras primas que a todos pertencem e a todos deleitam. 'Subindo ao Céu', uma valsa de desenvolvimento ascendeste, tipo moto perpétuo, constitui para mim sua criação mais genial, antevendo que sua subida a este sublime espaço será magistral. Obrigado a Canhoto da Paraíba, à Lei da Natureza, divina e sábia, por nos propiciar ouvir, ver, saber e viver em um espaço divino, onde os gênios nos antecipam os céus, mesmo 'Pisando em brasas' ". Vicente Antonio da Silva - Fã de Canhoto

Quem fala mais sobre Canhoto é o pesquisador Paulo Eduardo Neves, um dos grandes defensores da nossa música popular:

"...Em 1959, uma legendária excursão de músicos nordestinos viajou dias de jipe com destino à casa de Jacob do Bandolim no bairro de Jacarepaguá no Rio de Janeiro, onde aconteciam os maiores saraus da época. Reza a lenda que no primeiro sarau em que se apresentaram para a nata dos músicos brasileiros, Radamés Gnattali ficou tão impressionado que gritou um palavrão e jogou seu copo de cerveja no teto. Para recordar o momento, Jacob nunca limpou a mancha no teto. Considerando o temperamento explosivo de Radamés e o virtuosismo de Canhoto, a história até é factível, pena que parece que é falsa. Histórias saborosas assim todo mundo deveria acreditar. O fato é que esta reunião foi tão impactante que um moleque que a assistiu, filho de um dos músicos participantes, resolveu por causa disso aprender música... Se você não tá levando fé no que estou escrevendo: Ora, como um violonista que quase ninguém ouviu falar pode ser tão bom? Vou transcrever aqui a opinião de duas pessoas que entendem muito mais de música do que eu. Uma é o Paulinho da Viola, que não só produziu seu primeiro disco, como rodou o país com Canhoto pelo Projeto Pixinguinha. Paulinho dizia que era comum Chico Soares roubar o show, sendo muito mais aplaudido do que ele. Paulinho também gravou em seu primeiro disco de 1971 o belíssimo choro 'Abraçando Chico Soares', que fez no estilo de composição do amigo".

Veja o que Paulinho diz sobre ele:

'Eu não queria participar daquelas rodas (de choro) como músico. Quando vi o Canhoto tocar fiquei tão entusiasmado que me toquei. Era tão sublime, tão tecnicamente perfeito! Acho que o Canhoto me influenciou a tocar, mais do que meu pai e Jacob (do Bandolim).'

Quer mais? Então veja este trecho de entrevista de um dos mais perfeccionistas músicos brasileiros, Jacob do Bandolim. Ele está mostrando uma gravação e falando de 1959, quando recebeu a excursão de músicos nordestinos em sua casa. Veja que ele se refere a Canhoto por seu apelido de "Sacristão", que ganhou quando criança como assistente do padre de sua cidade. Fala aí, Jacob:

'... O problema aqui nesta gravação do Chico Soares reside apenas em que vocês pra executarem estas músicas gravadas, vocês vão virar canhotos de uma hora para outra. E só assim, porque o homem tem o diabo no corpo... Nós vivíamos a correr de um lado para outro, a tocar para uns, para outros, e todos queriam conhecer o Sacristão, que, aliás, era a vedete do grupo. E observe bem que você não vai encontrar qualquer erro da parte dele. Quero afirmar a você, sob palavra, que durante os 15 dias que esse homem permaneceu aqui, em nossa casa em Jacarepaguá, este homem repetiu estas músicas várias vezes, dezenas e dezenas de vezes, em vários lugares, nas condições mais absurdas, sentado confortavelmente ou não, num ambiente agradável ou não..., nas condições mais absurdas. De manhã cedo, às 6h da manhã, ele às vezes me acordava tocando violão. Adormecia tocando violão. Dentro de uma simplicidade tremenda sem errar nem uma nota! Eu nunca vi Sacristão errar uma nota! ... o homem tocava mesmo, não era brincadeira. Os outros tinham suas falhas, suas emoções, suas emotividades, mas o Chico Soares, não. Tocava rindo na minha cara, com um sorriso muito ingênuo de quem não estava fazendo nada de mais. Um artista enterrado lá em Recife... é digno de toda nossa admiração, de todo nosso respeito, porque ele encarna nesta figura, uma porção de brasileiros que vivem enterrados por estes rincões afora, verdadeiros valores completamente no ostracismo ...'

Prezados migalheiros, a homenagem não poderia ser completa se não houvesse uma música pra fixar na memória de vocês o talento do nosso Canhoto que se despediu nesse 24/4/08. Vai ser com o choro "Escadaria", de Pedro Raymundo. Canhoto teve nessa gravação o auxílio luxuoso de Paulinho da Viola (no cavaquinho), César Faria, pai de Paulinho (no violão) e Celsinho Silva (no pandeiro). No linguajar nordestino Canhoto era isso: "coisa mais maior de grande"! Saudades.

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O Presidente Lula abraça Canhoto por ocasião do relançamento do Projeto Pixinguinha em Brasília. Canhoto já não falava e se locomovia através de cadeira de rodas. Palácio do Planalto, 9.6.04.

 

 

 

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*Migalheiro





 

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