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Pixinguinha e os 90 anos de Carinhoso

Hoje, 23 de abril, dia de São Jorge e do nascimento de Pixinguinha (23.4.1897), comemora-se o Dia Nacional do Choro. É uma justa homenagem a esse homem que trazia no rosto no início do século passado as marcas de uma doença braba, a bexiga. Apelidado Bexiguinha, depois Pixinguinha, porém, registrado em cartório como Alfredo da Rocha Vianna Júnior, é considerado o organizador ou o codificador da genuína música popular brasileira.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Atualizado em 22 de abril de 2008 14:47


Pixinguinha e os 90 anos de Carinhoso

Abílio Neto*

"... a roseira dá rosa em botão/ Pixinguinha dá Rosa em canção/ e a canção bonita é como a flor/ que tem perfume e cor/ e ele que era um poema de ternura e paz/ fez um buquê que não se esquece mais/ em rosas musicais..." (Jair Amorim, Evaldo Gouveia e Velha Guarda da Portela. Do tempo em que as escolas de samba ainda faziam samba-enredo, Carnaval de 1974, um ano após a morte de Pixinguinha).

Hoje, 23 de abril, dia de São Jorge e do nascimento de Pixinguinha (23.4.1897), comemora-se o Dia Nacional do Choro. É uma justa homenagem a esse homem que trazia no rosto no início do século passado as marcas de uma doença braba, a bexiga. Apelidado Bexiguinha, depois Pixinguinha, porém, registrado em cartório como Alfredo da Rocha Vianna Júnior, é considerado o organizador ou o codificador da genuína música popular brasileira.

Aos vinte anos Pixinguinha já era um grande flautista e compositor. Entre 1917 e 1918 já havia composto pérolas como a valsa "Rosa" e um choro que chamou de "Carinhos". Compôs e o depositou no fundo do baú. Por que ? Tinha vergonha de apresentá-lo e tocá-lo nas rodas de bambas de chorões que freqüentava. O motivo é que o do choro só tinha duas partes e naquele tempo quem se metesse a compor um choro com menos de três partes era ignorado ou até ridicularizado.

Em 1927 resolveu gravá-lo pela primeira vez com o seu regional e o de Donga. Não teve muito sucesso. Em 1936 a atriz e cantora Heloísa Helena participava de uma peça teatral na qual queria cantar uma música. Ela foi uma das poucas pessoas que tinham adorado o choro "Carinhos". Assim, pediu ao compositor João de Barro, o Braguinha, que pusesse uma letra naquela canção. Braguinha pediu autorização a Pixinguinha e dois dias depois a tarefa foi concluída.

Em 1937 a música "Carinhos" foi oferecida a dois medalhões do cancioneiro popular, Carlos Galhardo e Francisco Alves, os quais não se entusiasmaram em gravá-la. Sobrou a tarefa para Orlando Silva que já estava ficando um cantor famoso, mas esse também não demonstrou muito interesse. Gravou-o no lado A de um antigo disco de 78 rotações, o qual trouxe no lado B a famosa valsa "Rosa", também de Pixinguinha. Assim "Carinhos" se transformou em "Carinhoso". Diziam que a letra dessa canção era avançada demais pr'aquela época.

Pouco tempo depois "Carinhoso" virou prefixo musical de Orlando Silva, esse notável cantor brasileiro, que teve seu apogeu de 1935 a 1942. A vida de Orlando, no entanto, foi marcada por acontecimentos trágicos: aos dezesseis anos teve metade de um dos pés decepada por um trem e em 1942, no topo da escada da glória, aos 26 anos, foi vítima de uma inflamação nas gengivas que atacou também os nervos dos dentes provocando-lhe as maiores dores que um ser humano pode suportar. Foi aí que recorreu à morfina para se aliviar das dores, tornando-se depois um viciado. Após perder todos os dentes da arcada superior, extraídos por ordem médica, ficou depressivo e se atolou no alcoolismo. Com a dicção prejudicada pela ausência dos dentes naturais e as cordas vocais afetadas pela morfina, nunca mais conseguiu ser o mesmo cantor. Mesmo assim é considerado o nosso Frank Sinatra. João Gilberto, artista maior da bossa nova, considera-o "o maior cantor do mundo".

Na gravação de "Carinhoso" realizada em 28.5.1937, Orlando Silva foi acompanhado pelo conjunto musical (regional) da RCA do qual fazia parte o próprio Pixinguinha. Ouçamos este magnífico choro-canção de 90 anos que tinha tudo pra não acontecer, porque foi encostado pelo seu autor, esnobado por dois cantores de renome, desacreditado pelo letrista João de Barro e menosprezado inicialmente pelo artista que o gravou, Orlando Silva, "O Cantor das Multidões' que tentou até mudar a letra do choro.

Hoje "Carinhoso" é uma das músicas mais queridas do Brasil. O povo sentiu que às belas harmonias de Pixinguinha foi acrescentada uma letra irretocável, motivo principal das 207 gravações nacionais feitas por outros artistas. Destaque para uma gravação feita em 1973 por Ellis Regina, acompanhada pelo então magnífico regional de Caçulinha, aquele mesmo que hoje faz palhaçada no Domingão do Faustão.

O choro, como gênero musical, atravessou nossas fronteiras e atraiu a admiração de músicos da França, os quais criaram o Clube do Choro de Paris que é comandado por uma francesa que veio fazer curso de flauta no Brasil com Altamiro Carrilho. Em Paris também se ouve Carinhoso!

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*Migalheiro





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