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Crime ambiental e responsabilidade penal de pessoa jurídica de direito público

A pessoa jurídica pode ser sujeito ativo de crime? A pessoa jurídica de Direito Público pode ser responsabilizada "penalmente" por crime ambiental?

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Atualizado em 11 de abril de 2008 08:40


Crime ambiental e responsabilidade penal de pessoa jurídica de direito público

Luiz Flávio Gomes*

A pessoa jurídica pode ser sujeito ativo de crime? A pessoa jurídica de Direito Público pode ser responsabilizada "penalmente" por crime ambiental?

A rigor, sujeito ativo a pessoa jurídica não pode ser nunca, porque ela não tem capacidade de ação ou de omissão (não tem capacidade para praticar conduta humana). Não realizará nunca o verbo descrito no tipo legal. Em nossa opinião, a pessoa jurídica pode ser responsabilizada em algumas situações, mas não pode ser sujeito ativo. Tecnicamente isso é impossível (cf. GOMES, L.F. e GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, A., Direito penal-PG, v. 2, São Paulo: RT, 2007, p. 259 e ss.).

Nossa Constituição Federal (clique aqui), segundo majoritária doutrina, prevê duas possibilidades de responsabilização da pessoa jurídica:

(a) art. 173, § 5º: "a lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular";

(b) art. 225, § 3º: "As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, de sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados."

O princípio da responsabilidade "pessoal" nos conduz, entretanto, a cuidar do tema da responsabilidade "penal" da pessoa jurídica (prevista legalmente, entre nós, na lei ambiental, Lei 9.605/98 (clique aqui), art. 3º) com muita cautela. Para nós, na verdade, a única interpretação possível desse texto legal consiste em admitir que a responsabilidade da pessoa jurídica não é "penal" (no sentido estrito da palavra). Aliás, segundo nossa visão, essa responsabilidade faz parte de um tipo novo de Direito, que estamos chamando de sancionador (ou judicial sancionador). Responsabilidade pessoal e responsabilidade penal da pessoa jurídica são duas realidades inconciliáveis. A pessoa jurídica não conta com capacidade penal ou de ação. O velho societas delinquere non potest continua vigente.

Teoria da dupla imputação: de qualquer modo, saliente-se que o STJ já admitiu ação penal contra pessoa jurídica (REsp 564.960, j. de 2.6.05). E é certo que forte doutrina entende que a lei ambiental contempla verdadeira situação de responsabilidade "penal". Nesse caso, então, pelo menos se deve acolher a teoria da dupla imputação, isto é, o delito jamais pode ser imputado exclusivamente à pessoa jurídica. Deve ser imputado à pessoa física responsável pelo delito e à pessoa jurídica. E quando não se descobre a pessoa física? Impõe-se investigar o fato com maior profundidade. Verdadeiro surrealismo consiste em imputar um delito exclusivamente à pessoa jurídica, deixando o criminoso (o único e verdadeiro criminoso) totalmente impune.

Responsabilidade por ricochete ou indireta ou mediata: a responsabilidade da pessoa jurídica, destarte, é indireta ou mediata ou por ricochete, porque o principal responsável pelo delito é uma pessoa física. A pessoa jurídica responde pelo fato de modo indireto.

Pode ser responsabilizada a pessoa jurídica de direito público? Não vemos motivo para excluir da responsabilização a pessoa jurídica de direito público que, com certa freqüência, envolve-se em delitos ambientais. De qualquer modo, segundo nossa perspectiva, essa responsabilidade não seria "penal". Faz parte do que estamos chamando de Direito sancionador (ou judicial sancionador). Aliás, assim entendido o tema, fica mais fácil admitir a responsabilidade inclusive da pessoa jurídica de direito público.

TJ paulista condena Petrobras por crime ambiental

A Revista Consultor Jurídico (em matéria assinada por Fernando Porfírio) noticiou o seguinte:

"Empresas que provocam danos ao meio ambiente podem ser condenadas tanto na esfera civil, como na criminal. Mas como não é possível privar da liberdade uma pessoa jurídica, a pena é transformada em condenação em dinheiro, que não pode ser confundida com mera multa administrativa.

"Com esse fundamento, por unanimidade, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou a Petrobras à pena de prestação de serviços à comunidade, convertida em pagamento de R$ 250 mil em favor de uma entidade ambiental do estado. A decisão foi confirmada pela 6ª Câmara Criminal ao julgar recurso (embargos infringentes) da estatal brasileira de petróleo.

"A Petrobras foi condenada, em primeira instância e depois pelo TJ paulista, por crime de poluição, com prejuízo ao meio ambiente e à saúde humana. A empresa é acusada de provocar acidente na cidade de Paulínia (região de Campinas), onde funciona a Replan, a maior unidade de refino de petróleo do país. O crime teria ocorrido em 10 de julho de 1998, causado por falha técnica em dois setores da unidade, que provocou a liberação de gases tóxicos.

"No novo recurso, a empresa sustentou que a pena aplicada pela Justiça seria de simples multa. Assim, já teria socorrido a extinção da punibilidade. Segundo a empresa, como para os casos de multa a pena prescreve no prazo de dois anos, esse tempo teria sido ultrapassado entre o oferecimento da denúncia e a sentença de condenação.

"O Código Penal (clique aqui) estabelece prazos diferentes de prescrição para a pena privativa de liberdade e para a de multa. Para a última, a prescrição ocorre em dois anos, argumento sustentado pela Petrobras. Para a primeira, pode variar de acordo com a pena máxima. No entanto, a Lei 9.605/98 - Lei dos Crimes Ambientais - inovou ao criar a possibilidade de a pessoa jurídica responder a processo penal. A pena prevista para o crime de poluição vai de um a cinco anos de reclusão.

"Mas a Petrobras alegava que a condenação à prestação de serviços à comunidade convertida em pagamento em dinheiro seria multa, não pena. A tese da defesa não encontrou apoio da turma julgadora. O entendimento da 6ª Câmara Criminal foi o de a pena imposta à Petrobras, ainda que não privativa de liberdade, deveria ser entendida como se fosse assim.

"Parece não haver fim a criatividade do ser humano para aproveitar inventos em benefício de sua feição criminosa, como parece também não haver fim a incursão em crimes ambientais para destruição da própria vida", afirmou o relator, Ruy Cavalheiro. Para ele, os crimes ambientais têm a capacidade de atingir gerações, levando seus efeitos por vários estágios de ofensas a direitos, sendo que a vida é o mais atingido.

"Os desembargadores rechaçaram a tese da prescrição. A juíza de primeira instância aplicou a pena máxima prevista no artigo 54 da Lei Ambiental, de cinco anos de reclusão, e os motivos foram a gravidade da conduta, a forma qualificada e a reincidência. Assim, decidiram os desembargadores, a prescrição se daria no prazo de 12 anos e não de dois como queria a defesa da empresa.

"Em sua defesa, a Petrobras contou com o argumento apresentado no primeiro recurso pelo desembargador Ericson Maranho. "Na verdade, a entrega de dinheiro, de uma só vez, a entidades ambientais, rotulada de prestação de serviços à comunidade, tem cor, odor e sabor de multa."

Naquele julgamento o desembargador foi voto vencido no apoio à defesa de que para o caso o prazo entre o recebimento da denúncia e a publicação da sentença seria de dois anos, sob risco de prescrever se ultrapassado. No segundo julgamento, contudo, Ericson Maranho rejeitou o recurso da Petrobras.

"Venceu a tese de que as penas restritivas de direito têm a mesma duração da pena privativa de liberdade. No caso de empresas, aplica-se isolada, cumulativa ou alternativamente a prestação de serviços à comunidade. Esta última seria uma das medidas restritivas de direito. Na lei penal ambiental é raro o réu cumprir pena de prisão. As condenações inferiores a quatro anos admitem substituição por penas restritivas de direitos".

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Fundador e Coordenador Geral da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes







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