Contribuição ao INCRA e seguridade social
Inúmeras discussões sobre a legalidade da Contribuição ao INCRA foram submetidas à análise do Judiciário. Questionava-se a extinção do referido tributo ora pela Lei 7.787/89, ora pela Lei 8.212/91, tendo o STJ positivado soluções cambiantes, porém sempre no sentido da revogação da referida contribuição, tendo em vista a sua natureza previdenciária.
quinta-feira, 3 de abril de 2008
Atualizado em 1 de abril de 2008 09:59
Contribuição ao INCRA e seguridade social
Marina Vieira de Figueiredo*
Andréa Medrado Darzé**
Inúmeras discussões sobre a legalidade da Contribuição ao INCRA foram submetidas à análise do Judiciário. Questionava-se a extinção do referido tributo ora pela Lei 7.787/89 (clique aqui), ora pela Lei 8.212/91 (clique aqui), tendo o STJ positivado soluções cambiantes, porém sempre no sentido da revogação da referida contribuição, tendo em vista a sua natureza previdenciária.
Todavia, a 1ª Seção deste Tribunal, no julgamento dos EREsp 770.451, dirimindo dissídio existente entre as Turmas de Direito Público, reviu seu posicionamento, entendendo tratar-se de contribuição de intervenção no domínio econômico. Por conta disso, concluiu que a Contribuição ao INCRA permanece exigível, na medida em que:
a) a Lei 7.787/89 apenas suprimiu a parcela destinada ao PRORURAL;
b) o INCRA herdou as atribuições da SUPRA no que diz respeito à promoção da reforma agrária e, apenas em caráter supletivo, as medidas complementares de assistência técnica, financeira, educacional e sanitária (extensão rural);
c) possuindo natureza e destinação diversa da contribuição previdenciária sobre a folha de salários, não foi extinta pela Lei 8.212/91 ou Lei 8.213/91 (clique aqui).
Ocorre que o critério que permite identificar as contribuições interventivas é o atendimento a uma finalidade: servir de instrumento da União em determinada área da economia. Noutros termos, a autorização para instituir contribuições desta natureza decorre da necessidade de carrear fundos para patrocinar a atuação positiva do Estado no respectivo setor econômico, o que não se verifica no caso concreto.
A Contribuição ao INCRA foi instituída pela Lei 2.613/55 (clique aqui) para custear as atividades do Serviço Social Rural - SSR, que, inquestionavelmente, integram a seguridade social. Após ser criada, sofreu inúmeras alterações em seu regime jurídico, especialmente no que se refere ao órgão competente para a sua gestão. Vejamos as modificações mais relevantes.
A Lei Delegada 11/62 (clique aqui) incorporou o SSR à Superintendência de Política Agrária - SUPRA. Assim, foram transferidas a esta autarquia as atribuições e o patrimônio do extinto órgão, dentre os quais se incluíam os recursos provenientes da arrecadação deste tributo.
O Estatuto da Terra, por sua vez, extinguiu a SUPRA, tendo delegado ao Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário - INDA as atividades de extensão rural e as demais atribuições que competiam ao SSR, até que fosse criado um órgão da previdência social destinado a tutelar os trabalhadores rurais, ao qual caberia a metade do valor referente à contribuição ora tratada.
Nova alteração foi inserida pelo Decreto-Lei 582/69 (clique aqui), que, tendo em vista a criação de um fundo de previdência social rural, dividiu o produto da sua arrecadação nos seguintes termos: 25% ao INDA, 25% ao Instituto Brasileiro de Reforma Agrária - IBRA e 50% ao Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural - FUNRURAL.
No ano seguinte, o Decreto-Lei 1.110/70 (clique aqui) criou o INCRA, para o qual foram destinados todos os direitos, competências, atribuições e responsabilidades do IBRA, do INDA e do Grupo Executivo de Reforma Agrária - GERA. Por conta disso, passou a ser responsável pela promoção da reforma agrária (IBRA e GERA) e das atividades de extensão rural (INDA).
Como forma de viabilizar a execução dessas atividades, também lhe foram outorgadas as respectivas fontes de custeio, que se mantiveram vinculadas às funções anteriormente destacadas. E não poderia ser diferente, já que é este o fundamento destas receitas.
Em todos esses momentos, o que se vê é que a contribuição muda de destinatário, porém mantém incólume a sua afetação. Ou seja, nenhuma das alterações legislativas comprometeu a específica destinação do produto da sua arrecadação, que permaneceu vinculado às despesas decorrentes da execução dos serviços sociais descritos no art. 3º da Lei 2.613/55 relacionados com a extensão rural. A única diferença, como é possível perceber, é que o ente responsável pelo desempenho dessas atribuições passou a ser outro: o INCRA.
Conforme esclarecido, o objeto social do INCRA é híbrido, competindo-lhe a execução de atividades de diferentes naturezas, de forma concomitante e paralela, não sendo possível estabelecer uma relação de prioridade ou preponderância de uma em detrimento das outras. Assim, diferentemente do que sugere a nova orientação do STJ, o INCRA não tem funções precípuas e supletivas, sendo simplesmente uma autarquia multifuncional, com patrimônio e receita claramente vinculado a cada uma dessas funções.
E, na medida em que a titularidade sobre o produto da arrecadação deste tributo decorreu do repasse de todos os direitos e atribuições do INDA, os quais têm inquestionavelmente natureza previdenciária, resta claro que estas verbas permaneceram vinculadas ao custeio das atividades sociais da autarquia extinta. Este é o fundamento de validade desta receita. Em face disto, não há como sustentar que a Contribuição ao INCRA tem natureza interventiva. A norma de destinação comprova a fragilidade dos argumentos apresentados pelos julgados do STJ.
Por fim, é importante destacar que, justamente por reconhecer a natureza previdenciária desta exação, o Supremo Tribunal Federal declarou que não há impedimento à sua cobrança também das empresas urbanas, já que, diversamente da referibilidade aplicável às contribuições interventivas, o princípio que rege as contribuições sociais é a solidariedade.
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*Advogadas do escritório Barros Carvalho Advogados Associados
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