Lei 10537/2002 - Custas judiciais no Processo do Trabalho
Até que ponto a instituição de cobranças de custas e emolumentos no processo de execução trabalhista irá auxiliar no desafogamento e solução do problema da morosidade? Ocorrerá realmente o desestímulo à "protelação" dos atos processuais?
domingo, 20 de outubro de 2002
Atualizado em 1 de abril de 2003 11:49
Lei 10.537/2002 - Custas judiciais no Processo do Trabalho
AVANÇO OU RETROCESSO?
Alessandro R. Veríssimo dos Santos
*Com o advento da Lei nº 10.537/2002, editada em 27.8.2002 e que entrou em vigor em 27.9.2002, a dinâmica no processo de execução trabalhista será outra; pelo menos essa foi a intenção que o legislador passou à sociedade ao editar a norma.
Mas, diante de tantas mudanças e alterações no cenário político, econômico e social, resta a pergunta no ar: qual foi o real intento do legislador ao editar a mencionada norma?
Tudo remonta a algum tempo atrás, quando corria pelos corredores do Congresso Nacional o boato sobre a extinção da Justiça do Trabalho.
A justificativa utilizada pelos defensores desta idéia era de que a Justiça do Trabalho, além de ser morosa, trazia enormes prejuízos aos cofres públicos, vez que não havia qualquer fonte de renda capaz de despertar o interesse público.
Outros, mais radicais, ou verdadeiros, apontavam a necessidade da extinção da Justiça do Trabalho, em virtude de sua inadequação à realidade atual, dentre outros argumentos.
O fato a que devemos estar atentos é o econômico. Este sim nos parece merecedor de maior atenção por parte de toda a sociedade e dos estudiosos.
Um dos primeiros passos dado pelo governo nesse sentido foi a aprovação da Lei 10.035/2000, que estendeu a competência da Justiça do Trabalho para executar, de ofício, os valores referentes às contribuições previdenciárias decorrentes da relação havida entre as partes.
Necessário frisar, nesse particular, que as parcelas previdenciárias deverão ser recolhidas aos cofres da União, independente da existência da relação de emprego.
A presente medida fez com que a Justiça do Trabalho, até então criticada por muitos, passasse a ser uma interessante fonte de fiscalização e de arrecadação das contribuições previdenciárias, aumentando em muito a receita do governo.
Segundo dados fornecidos pelo Colendo Tribunal Superior do Trabalho, informações obtidas no site do C. TST, "... Somente para os cofres da Previdência Social, a Justiça do Trabalho já arrecada anualmente cerca de R$ 750 milhões, valor das contribuições sociais do INSS recolhidas no ano passado em processos de execução de débitos trabalhistas e que deve se repetir este ano". (matéria do dia 2.10.2002)
Constata-se que a fiscalização e a arrecadação de valores, referentes às contribuições previdenciárias, feita pela Justiça do Trabalho revelou-se uma grande e importante fonte de renda para a União, vez que tais valores são recolhidos, não aos cofres da Autarquia Federal Previdenciária, INSS, mas sim diretamente aos cofres da União, que se incumbe de repassá-l
os à Previdência Social.Diante do sucesso com a aplicação da Lei nº 10.035/2000 e da grande fonte de renda que a Justiça do Trabalho demonstrou ser, não demorou muito para que o governo editasse uma nova Lei, que tivesse como finalidade a arrecadação de mais divisas aos cofres da União.
No entanto, a justificava para a edição da referida norma foi outra, muito embora o objetivo final seja idêntico ao da norma anteriormente analisada, qual seja, aumentar a arrecadação de divisas aos cofres públicos.
Desta feita o governo utilizou-se do argumento da morosidade na solução dos litígios trabalhistas, morosidade da efetivação da tutela jurisdicional, alto custo para o governo no desenvolvimento de um processo, entre outros.
Utilizou-se, na realidade, da própria torpeza para editar a presente norma, uma vez que, se a Justiça do Trabalho é morosa, isto decorre não da inexistência de custas no processo de execução, mas sim da não valorização dos funcionários que lá trabalham, do desrespeito aos Magistrados que lá tentam entregar, da melhor forma, o bem da vida, da falta de investimentos na estrutura física e do quadro de pessoal para agilizar o andamento dos processos.
Enfim, utilizou-se de um fato social, provocado pelo desrespeito do governo a toda a sociedade e de um discurso político, para aumentar ainda mais os gastos daqueles que buscam a solução de seus problemas pela via Judicial, que em muitos casos pode não ser a melhor, mas com certeza é a mais confiável.
Mas, enfim, qual a matéria tratada nesta norma legal ?
A referida lei institui no processo do trabalho, e com mais ênfase no processo de execução, a cobrança de custas e taxas ou emolumentos, que até então não existiam.
Assim, para a interposição de embargos a execução, por exemplo, além da garantia do juízo, efetivada pela penhora de um bem ou depósito judicial, a parte terá de recolher custas no valor de R$
44,26 (quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos), ao final do processo, o mesmo ocorrendo no caso de agravo de petição, impugnação à liquidação de sentença, sendo que os valores específicos para cada caso estão discriminados na texto da norma legal.Segundo o entendimento do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, a referida lei "não só aumentará a arrecadação da União mas, sobretudo, será um desestímulo à protelação da solução final das ações. A parte, não tendo qualquer custo, aproveitava-se disso, gerando despesas e serviços adicionais para a Justiça do Trabalho e protelando a solução do processo".
O entendimento ora defendido demonstra, em parte, a verdadeira intenção do governo, que é indubitavelmente o aumento de suas divisas.
Porém, laboram em erro, data maxima venia, aqueles que entendem que com a edição da Lei nº 10.537/2002 o processo trabalhista será mais célere e ágil. Isso porque o que realmente atravanca o andamento do processo na Justiça do Trabalho não é o fato da inexistência de custas e emolumentos, mas sim a falta de condições para a realização de um trabalho digno, dentro de um espaço físico coerente com a grandeza e importância desta Justiça Especializada.
Por outro lado, é de conhecimento de todos que o processo do trabalho é regido por princípios e peculiaridades que visam a torná-lo mais célere e eficaz, dentre os quais a informalidade dos atos, a oralidade, a irrecorribilidade de decisões interlocutórias, o que nos mostra que a própria estrutura processual existente já prevê condições para que o processo atinja a finalidade alegada com a edição desta lei.
No entanto, o que temos? Uma Justiça sobrecarregada de processos, varas do trabalho com número de funcionários insuficiente para o regular andamento dos feitos, Magistrados com excesso de trabalho, Oficiais de Justiça com muitas diligências a serem realizadas, más acomodações, enfim, questões outras que não guardam qualquer relação com o processo, sendo estes os verdadeiros responsáveis pela demora e morosidade da solução dos litígios trabalhistas.
As peculiaridades processuais existentes no processo trabalhista, bem como seus princípios, como anteriormente mencionado, são suficientes para resguardar e atingir a finalidade da justiça trabalhista, que é a entrega do bem da vida na maior brevidade possível. Ou seja, processualmente não há a necessidade da edição de uma norma instituindo cobranças de custas e emolumentos para fazer com que o processo trabalhista seja mais ágil e eficaz.
Um exemplo disso é a existência do depósito prévio recursal devido na interposição de cada recurso na fase de conhecimento.
A existência de tais depósitos tinha como finalidade, além de "garantia" da execução, o que é discutível por muitos doutrinadores, também a de desestimular a interposição de Recursos, tornando o processo mais ágil e célere. No entanto, nada disso funcionou e a justiça continua com todos os problemas mencionados acima.
Diante de todo esse quadro, indaga-se: até que ponto a instituição de cobranças de custas e emolumentos no processo de execução trabalhista irá auxiliar no desafogamento e solução do problema da morosidade? Ocorrerá realmente o desestímulo à "protelação" dos atos processuais?
Essa questão só saberemos com o passar do tempo. Só teremos noção com a efetiva aplicação da lei e com a apresentação dos números ao final de cada ano.
Por outro lado, uma conclusão pode ser extraída de plano: a real intenção com a edição da Lei 10.537/2002, foi a de criar mais uma fonte de renda para os cofres da União, a exemplo do que ocorreu com a edição da Lei 10.035/2000, que até o momento é um "sucesso de bilheteria".
Se efetivamente solucionar o problema da morosidade, ótimo. Mas, o que a prática nos tem mostrado é outra realidade, o que faz com que olhemos com muita desconfiança os objetivos e as finalidades alegadas pelo governo para a edição de mais esta lei.
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* Especialista em Direito do Trabalho - PUC/SP, advogado da área Trabalhista do escritório Rayes, Fagundes & Oliveira Ramos, Advogados Associados.
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Clique aqui para ver a íntegra da novel lei 10.537/02
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