Dias de liberdade e tempos de preocupação (I)
A manifestação exultante da liberdade, a interpretação de papéis diversos da realidade cotidiana, as cintilações das lentejoulas nos corpos femininos quase nus, o grito de alforria da depressão, a máscara do outro ser, o calidoscópio das inúmeras emoções, o combustível das paixões e outras infindáveis expressões são ainda insuficientes para identificar o que já se chamou de tríduo momesmo mas que os novos tempos ampliaram para muito além da quarta-feira de cinzas.
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008
Atualizado em 19 de fevereiro de 2008 13:27
Por trás da máscara da alegria a imagem da insegurança
René Ariel Dotti*
Gilberto Amado (1887-1969), disse muito bem: "O carnaval entre nós deixa de ser a festa pagã que o cristianismo não estragou de todo - e em que resta alguma vivacidade e algumas alegrias dionisíacas - para ser mais do que tudo isto: uma tradição venerável, uma festividade adorada, um hábito da sociedade que tem a significação de um desafogo na existência árida do brasileiro, que vive sem comodidade, sem dinheiro, sem orgulho, sem heroísmo, sem coisa nenhuma". (A chave de Salomão).
A manifestação exultante da liberdade, a interpretação de papéis diversos da realidade cotidiana, as cintilações das lentejoulas nos corpos femininos quase nus, o grito de alforria da depressão, a máscara do outro ser, o calidoscópio das inúmeras emoções, o combustível das paixões e outras infindáveis expressões são ainda insuficientes para identificar o que já se chamou de tríduo momesmo mas que os novos tempos ampliaram para muito além da quarta-feira de cinzas. Com inegável atualidade, o membro do MP e diplomata, Ribeiro Couto (1898-1963), observou que o carnaval "é a única festa nacional que consola a gente do calor, da queda do mil-réis, da política, dos programas de salvação pública e dos desastres da aviação militar".
Mas para além das multidões que desfilam nas ruas, pulam nos salões, dançam e cantam a pé ou nos carros alegóricos, há uma infinidade de pessoas que não podem disfarçar a imagem e nem se libertar do ofício diário. São os policiais de serviço, os médicos de plantão, os enfermeiros dos hospitais, os atendentes das farmácias abertas, os escrivães para registrar os acidentes e os crimes que compõem as tragédias, os motoristas que levam e trazem as pessoas para momentos de alegria ou tristeza. Há um mundo a parte, longe de confetes e serpentinas. E há também os que estudam novos meios para prevenir a violência e a criminalidade. Eles são absolutamente indispensáveis num tempo de insegurança com a multiplicação de homicídios
Essas considerações me remetem ao artigo do Delegado de Polícia Federal, Fernando Franceschini, publicado na Gazeta do Povo de terça-feira, dia 29, com o instigante título: "Tráfico de drogas x homicídios. A prisão de quantos Abadias são necessárias ?" Ele coordenou a operação que prendeu o megatraficante Juan Carlos Ramirez Abadia e é especialista na área de prevenção e repressão relacionadas com o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins. As primeiras frases do texto são aparentemente contraditórias com a missão que ele exerce há muitos anos. Está escrito: "A relação entre o tráfico de drogas e o aumento das taxas de crimes violentos, como homicídios, está cada vez mais nítida. A atuação repressiva do Estado sem a contrapartida preventiva não obtém resultados palpáveis". (segue)
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*Advogado do Escritório Professor René Dotti
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