Extinção do contrato administrativo pela administração por razões de interesse público
A extinção de um contrato administrativo ocorre por diversos fatores, sendo uma das formas a rescisão unilateral, pela Administração, por razões de interesse público, com fundamento nos artigos n°. 58, inciso II c.c. art. n°. 78, XII e 79, inciso I, ambos da Lei nº. 8666/93.
sexta-feira, 18 de janeiro de 2008
Atualizado em 17 de janeiro de 2008 15:31
Extinção do contrato administrativo pela administração por razões de interesse público
Fernanda Ghiuro Valentini Fritoli*
A extinção de um contrato administrativo ocorre por diversos fatores, sendo uma das formas a rescisão unilateral, pela Administração, por razões de interesse público, com fundamento nos artigos n°. 58, inciso II c.c. art. n°. 78, XII e 79, inciso I, ambos da Lei nº. 8.666/93 (clique aqui).
Nesta forma de extinção, o contrato é encerrado mediante uma decisão unilateral da Administração, por questões de interesse público, antes que se concluíssem todos os efeitos que ordinariamente o contrato deveria produzir, vale dizer, antes que o objeto contratual fosse devidamente cumprido.
Dispõe o art. n°. 78, inciso XII da Lei n° 8.666/93:
Art. n°. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato:
"(...)
XII - razões de interesse público, de alta relevância e amplo conhecimento, justificadas e determinadas pela máxima autoridade da esfera administrativa a que está subordinado o contratante e exaradas no processo administrativo a que se refere o contrato;" (g.n.).
Cumpre-nos agora esclarecer quais seriam essas razões de interesse público, de alta relevância que ensejam a rescisão por parte da Administração. Vejamos:
Inicialmente, vale mencionar que se a Administração firmou determinado ajuste é porque, à época da contratação, a sua necessidade se impunha, ou seja, vinha ao encontro do interesse público.
O que se quer dizer é que, em primeiro lugar, a rescisão administrativa por razões de interesse público reclama, em regra, a existência de motivo superveniente, desconhecido à época do pactuado, pois, se conhecido fosse, constituir-se-ia óbice à contratação.
E esse motivo superveniente deve melhor se coadunar com o interesse público a ser perseguido, razão pela qual enseja a rescisão do contrato administrativo anteriormente firmado e que agora passa a ser inadequado para a Administração.
Em segundo lugar, para que haja a rescisão administrativa por razões de interesse público, a lei exige que o interesse público seja "de alta relevância e amplo conhecimento". Determina, desse modo, que o motivo a ensejar a rescisão do contrato deve ser conhecido publicamente.
Assim, não é qualquer nova valoração do interesse público por razões supervenientes que enseja a rescisão unilateral do contrato por parte da Administração.
Todavia, a eminente Lúcia Valle Figueiredo1, ao tratar do desfazimento do contrato por razões de interesse público ulterior, entende que as razões a alicerçar o ato de rescisão unilateral por conveniência e oportunidade são as mesmas que ensejam a revogação do ato administrativo, complementando que "no trato do ato administrativo, tem-se dado latitude bem mais ampla à competência revogatória da Administração Pública". Para a autora, a rescisão do contrato pela Administração por razões de interesse público consiste em "autêntica revogação do contrato administrativo"2 .
Data venia, a ilustre doutrinadora amplia demasiadamente o campo de liberdade do administrador.
Isso porque, conforme se depreende da análise do art. n°. 78, inciso XII, da Lei n°. 8.666/93, não se permite, por parte do administrador, a simples avaliação da conveniência e oportunidade para a rescisão do contrato anterior. Não é demais repetir que a lei exige que o interesse público deva ser de alta relevância e amplo conhecimento.
A questão central versa, a nosso ver, sobre o conceito de "interesse público", conceito este que denota certa imprecisão.
Celso Antônio Bandeira de Mello, ao tratar da discricionariedade e dos conceitos imprecisos cita o posicionamento de Garcia de Enterría, o qual, adotando os pensamentos da doutrina alemã, "sustenta que os conceitos indeterminados ou fluídos só apresentam tal característica considerados em abstrato; não porém em casos concretos, isto é, por ocasião de sua aplicação. Para ele a questão é apenas de interpretação e não de discricionariedade(...)" .
No entanto, ainda no que concerne aos conceitos imprecisos, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma, com muita propriedade, que "seria excessivo considerar que as expressões legais que os designam, ao serem confrontadas com o caso concreto, ganham, em todo e qualquer caso, densidade suficiente para autorizar a conclusão que se dissipam por inteiro as dúvidas sobre a aplicabilidade ou não do conceito por elas recoberto. Algumas vezes isto ocorrerá. Outras não.4"
Adotamos aqui o posicionamento do Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, no sentido de que os conceitos indeterminados conduzem à discricionariedade.
Isso porque, se é certo que em alguns casos não restam dúvidas quais situações ensejariam à extinção do contrato administrativo por razões de interesse público, em muitos outros essa certeza não haverá, razão pela qual, nesses casos, restará uma margem de opção ao administrador.
Todavia, há que se ressaltar que essa opção conferida ao administrador não é ampla como ocorre no caso de revogação de ato administrativo. Neste último, temos, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello5, uma "reapreciação sobre certa situação administrativa que conclui por sua inadequação ao interesse público", sendo que "é irrelevante distinguir se a inconveniência foi contemporânea ou superveniente ao ato que vai se revogar".
Portanto, pelos motivos acima expostos é que sustentamos que o administrador não poderá extinguir um contrato apenas porque, ao realizar novo juízo de conveniência e oportunidade, entende que há outra forma de se prestigiar o interesse público. Repita-se: o interesse público deve ser de alta relevância e de notório conhecimento.
Por outro lado, é certo que a valoração das "razões de interesse público de alta relevância" comporta subjetividade. Mas, uma vez constatada a sua presença no caso concreto, não há mais que se falar em discricionariedade, e sim em obrigatoriedade de se extinguir o contrato, até mesmo porque é dever da Administração perseguir, da melhor forma, o interesse público, tendo em vista a indisponibilidade deste.
Entendimento diverso ofenderia princípios que devem nortear a conduta da Administração Pública, tais como o da economicidade, da eficiência, dentre outros.
Há que se mencionar que a rescisão do contrato deverá ser motivada, assegurando-se ao contratado, antes de ser proferida a decisão que determinar a extinção do contrato, o contraditório e a ampla defesa, tendo tal decisão efeitos "ex nunc", respeitando-se, assim, os efeitos já produzidos.
O contratado também terá o direito de ser ressarcido de todos os prejuízos que a Administração der causa por ocasião da rescisão do contrato, vale dizer, terá direito a indenização aos danos emergentes e aos lucros cessantes, fazendo jus, portanto, ao lucro que auferiria se estivesse executado o contrato na íntegra. Trata-se, como muito bem asseverou Lúcia Valle Figueiredo6, de responsabilidade administrativa extracontratual por ato lícito, em respeito ao princípio da igualdade dos particulares perante os encargos públicos.
Conclui-se, portanto, que a discricionariedade no caso de rescisão administrativa por razões de interesse público decorre, para nós, apenas da imprecisão, da vagueza do conceito "interesse público". Todavia, entendemos que nas situações concretas, onde se puder verificar a sua existência, não haverá mais discricionariedade, mas, sim, obrigatoriedade, restando ao administrador uma única opção: rescindir o contrato administrativo.
Por fim, se não for possível a demonstração da existência de interesse público altamente relevante que justifique a rescisão, deve ser considerado vedado à Administração a rescisão do contrato.
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1 In "Extinção dos Contratos Administrativos", 3ª edição, Editora Malheiros, São Paulo, 2002, p. 49
2 Ob. cit., p. 49.
3 In "Discricionariedade e Controle Judicial", 2ª edição, 6ª tiragem, Editora Malheiros, São Paulo, 2003, p. 22
4 Ob. cit., p. 22
5 In "Curso de Direito Administrativo", 22ª edição, Editora Malheiros, São aulo, 2007, p. 433
6 Ob. cit, ver páginas 72/76.
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*Advogada do escritório Cammarosano Advogados Associados
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