ADC nº. 18/07
Em que pese seja o assunto de fundo tributário, o tema das linhas que seguem, a meu ver, versa precipuamente sobre a manifesta disposição do atual Governo em não aceitar as regras do jogo democrático quando está em xeque a arrecadação (ou, ao menos, crer que pode manipular tais regras no sentido de seus interesses), e, o que é mais grave, sobre uma possível (e ainda só imaginária) submissão do Judiciário, via Supremo Tribunal Federal (STF), diante deste tipo de postura por parte do Executivo.
quarta-feira, 5 de dezembro de 2007
Atualizado às 10:34
ADC nº. 18/07
Thiago de Mattos Marques*
Em que pese seja o assunto de fundo tributário, o tema das linhas que seguem, a meu ver, versa precipuamente sobre a manifesta disposição do atual Governo em não aceitar as regras do jogo democrático quando está em xeque a arrecadação (ou, ao menos, crer que pode manipular tais regras no sentido de seus interesses), e, o que é mais grave, sobre uma possível (e ainda só imaginária) submissão do Judiciário, via Supremo Tribunal Federal (STF), diante deste tipo de postura por parte do Executivo.
A referida questão de fundo diz respeito à exclusão da base de cálculo das contribuições ao PIS/COFINS dos valores referentes ao ICMS devido pelas empresas aos Estados. A tese em comento, grosso modo, decorre do entendimento de que, como o PIS/COFINS tem por base de cálculo a receita das empresas, o que não é receita não deve ser tributado por meio de tais contribuições. Subsumindo tal premissa ao fato de que o ICMS é receita dos Estados, e não das empresas, não haveria lógica que justificasse a inclusão do valor dos impostos estaduais na base de cálculo das contribuições devidas pelas empresas à União. Em suma, trata-se de uma diferenciação dos conceitos de "ingresso" e "receita", prestigiada pela doutrina.
Além da boa acolhida dispensada pela doutrina à referida tese, também o Judiciário vem manifestando entendimento favorável à mesma, e não por outro motivo o leading case que está no STF (RE 240.785/MG - clique aqui -), tendo como relator o Ministro Marco Aurélio, conta com 6 (seis) votos favoráveis aos contribuintes, e somente 1 (um) desfavorável (do Ministro Eros Grau).
Ou seja, pelo que foi exposto até aqui poderíamos acreditar que o caso está resolvido - afinal, 6 (seis) votos são suficientes para garantir maioria no STF, que é composto por 11 (onze) Ministros.
No entanto, como o acolhimento da tese em voga representaria uma perda bilionária de arrecadação (perda esta que já foi estimada em R$ 60bi), parece que o Governo "arregaçou as mangas" e partiu para uma ofensiva que chega a ser grosseira.
Inicialmente, destaque-se que tal ofensiva somente é possível em razão de um pedido de vista por parte do Ministro Gilmar Mendes, em cujo gabinete estão "engavetados" os autos do Recurso Extraordinário nº. 240.785/MG desde 31.8.2006 (sim, há mais de um ano!). Existe mesmo quem sustente que este fato, por si, configura uma afronta, pois, como ventilado, a questão já está decidida, em função dos seis votos que acolheram a tese brevemente exposta acima, negando provimento ao recurso da Fazenda.
Quanto a esse ponto específico, se é certo que é conferido ao Ministro analisar os autos de determinado processo de maneira a formar adequadamente seu convencimento e conseqüente voto, também é certo tal exercício deve se pautar, no mínimo, pelo bom senso, sobretudo se, como no caso, a questão já estiver decidida, sob pena de, via ato monocrático, ser injustificadamente postergada a efetivação da decisão do colegiado.
Enquanto suspenso o julgamento do RE, em 10.10.2007, após o decurso de mais de um ano do malfadado pedido de vista, a Presidência da Republica, via Advocacia Geral da União (AGU), interpôs a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº. 18 (clique aqui), visando exatamente obter reconhecimento da constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS.
A adoção de tal expediente por parte do Ministro Gilmar Mendes leva a crer que o mesmo tenciona fazer valer, pela via prática, a idéia que defende, no sentido de que a ADC nº. 18 substitua o RE nº. 240.785/MG, desconsiderando os votos já proferidos neste.
Em uma tentativa de tranqüilizar os ânimos, e a despeito de todo o teatro criado em torno da disputa judicial, poderíamos pensar que os 6 (seis) Ministros que se mostraram favoráveis à tese, votarão, logicamente, pelo desprovimento da ADC nº. 18, o que manteria o cenário benigno aos contribuintes.
Bom seria se fosse fácil assim... Mas infelizmente não é.
Isso porque, um dos Ministros que votou com o Ministro Relator, Marco Aurélio, foi o Ministro Sepúlveda Pertence, que se aposentou em meados desse ano, dando lugar ao Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Ou seja, em razão da nova composição do STF, a pretensão do Governo pode sim resultar em uma virada de mesa (no pior estilo futebolístico) em desfavor dos contribuintes.
Dando o tom político em que se circunscreve o tema, ainda outro dia o Presidente Lula (em recado voltado à CPMF, mas que pode ser aplicado às demais discussões tributárias) comentou que quem reclama da tributação são os "ricos".
Sobre este comentário, e do alto de minha nada além de incipiente experiência
Enfim, este é o cenário que levou determinado tributarista a asseverar que tal iniciativa "é o fim do mundo". Mas, como há também os que dizem, com alguma propriedade, que "o fim do mundo é aqui", quem é capaz de prever o resultado?
Levanto o assunto, pois, nesta quarta-feira, dia 5.12.2007, será levada a julgamento pelo STF a ADC nº. 18.
O que devemos é ficar de olho, sobretudo para conhecermos até onde vai a real independência entre os Poderes.
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*Advogado no Rio de Janeiro
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