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A decisão que alterou o perfil do mandado de injunção

Clever Rodolfo Carvalho Vasconcelos

Ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial que visa suprir uma omissão do Poder Público, no intuito de tornar viável o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista no art. 5.º, LXXI, da Constituição Federal (CF), o mandado de injunção possui uma característica peculiar, que é a estipulação de efeitos "inter partes" da decisão que supre a denominada "síndrome da inefetividade", o que o difere, singularmente, entre outros pontos, da ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. n°. 103, § 2.º, da CF e Lei n°. 9.868/99), de competência privativa do Supremo Tribunal Federal (STF), cujos efeitos são, em regra, erga omnes, conquanto exercício do controle concentrado de constitucionalidade.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Atualizado em 22 de novembro de 2007 12:44


A decisão que alterou o perfil do mandado de injunção

O julgamento da omissão legislativa referente ao direito de greve do servidor público no STF

Clever Rodolfo Carvalho Vasconcelos*

Ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial que visa suprir uma omissão do Poder Público, no intuito de tornar viável o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista no art. 5º, LXXI, da Constituição Federal (clique aqui), o mandado de injunção possui uma característica peculiar, que é a estipulação de efeitos "inter partes" da decisão que supre a denominada "síndrome da inefetividade", o que o difere, singularmente, entre outros pontos, da ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. n°. 103, § 2º, da CF e Lei n°. 9.868/99 - clique aqui -), de competência privativa do Supremo Tribunal Federal (STF), cujos efeitos são, em regra, erga omnes, conquanto exercício do controle concentrado de constitucionalidade.

Diversas correntes procuraram determinar qual seria o resultado prático do julgamento dos efeitos de ambos os institutos, chegando o STF a pacificar a posição majoritária não-concretista, exortando apenas o Poder omisso a elaborar a norma, sem suprir a ausência de regulamentação da matéria, o que tornava inócuo o desfecho judicial das demandas, tudo com fundamento do art. 2º da CF, cuja transcrição é de independência de cada Poder, não estando autorizado o Poder Judiciário a legislar, o que seria atitude usurpadora (STF, MI n. 586-5/RJ, rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 27.8.98).

Por outro lado, em posição vencida, os próprios Ministros Carlos Velloso e Néri da Silveira, hoje aposentados, e Marco Aurélio Mello, na ativa, reconheciam a posição concretista, isto é, acolhiam a mora do Poder omisso, determinando a satisfação do direito do autor, implementando regra a seu exercício, transparecendo a funcionalidade dos institutos.

Pois bem, o STF alterou drasticamente sua posição em recente julgamento, em 25 de outubro deste ano, nos Mandados de Injunção (MI) n°. 670, n°. 708 e n°. 712, impetrados para viabilização do direito de greve aos servidores públicos, autores da ação, reconhecendo a aplicabilidade do art. 9º da CF.

A partir de agora, com o julgamento das ações citadas, a posição vigente no STF é a concretista, mais comprometida com a efetividade do direito em face da ausência de legislação, não reconhecendo somente a mora, porém, determinando também a aplicação do direito, que foi o caso da subsunção da Lei de Greve (Lei n°. 7.783/89 - clique aqui -) aos servidores públicos, objeto dos writs injuncionais em apreço, em estreita ligação com a denominada "teoria dos freios e contrapesos", reconhecendo a possibilidade do exercício de harmonia na relação entre Poder Judiciário e Legislativo, também mencionada no art. 2º da CF, em face da instrumentalidade de mecanismos de controle recíprocos.

O mais curioso, porém, no caso do julgamento do direito de greve aos servidores públicos é que as três ações injuncionais citadas foram impetradas por entidades específicas, ou seja, uma do Pará, outra do Espírito Santo e a última do Município de João Pessoa, na Paraíba, e, curiosamente, o STF atribuiu efeitos erga omnes em sua decisão, estendendo a funcionalidade do direito de greve não somente aos impetrantes, mas também a todos os outros servidores do País, restando vencidos, nessa parte, os Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio Mello, que se posicionaram na tradição de o mandado de injunção ter efeitos apenas "inter partes" (concretista individual).

No contexto, a clássica visão de ação individual do mandado de injunção perde sua característica, reconhecendo-se o efeito geral ao writ. Ou seja, adotou o STF, no caso, a posição concretista geral, idêntica finalidade de efeitos da ação direta de inconstitucionalidade por omissão que, em regra, tem efeito erga omnes, podendo ser este restringido, excepcionalmente, em razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social (art. n°. 27 da Lei n°. 9.868/99).

Esse, portanto, é o novo perfil dos efeitos do julgamento do mandado de injunção, cuja decisão passa de efeitos "inter partes" para concretos gerais (erga omnes), estando todos os servidores públicos do País aptos a exercerem o direito de greve, estampado no bojo da Lei n°. 7.783/89.

No mais, agora é acompanhar os próximos julgamentos em mandado de injunção no STF para verificar se os efeitos ainda permanecerão erga omnes noutros casos, ou se, conforme a relevância do tema, o próprio STF fica autorizado a determinar quais serão os efeitos da decisão em sede individual injuncional.

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*Promotor de Justiça e Professor de Direito Constitucional e Administrativo do CJDJ - Complexo Jurídico Damásio de Jesus







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