Uma nova defesa na demanda executória, sem a necessidade de se assegurar o juízo
O processo de execução não deve impedir que o executado possa se defender eficazmente diante da supremacia quase napoleônica do exeqüente. O contraditório participativo exige que os jurisdicionados tenham perfeitas condições de influir nas decisões a que serão submetidos, devendo ser amenizada a fragilidade do executado diante do exeqüente, que detém todas as prerrogativas e facilidades de um processo voltado exclusivamente à satisfação de seu título executivo.
terça-feira, 18 de maio de 2004
Atualizado em 17 de maio de 2004 09:25
Uma nova defesa na demanda executória, sem a necessidade de se assegurar o juízo
Hugo Filardi *
O processo de execução não deve impedir que o executado possa se defender eficazmente diante da supremacia quase napoleônica do exeqüente. O contraditório participativo exige que os jurisdicionados tenham perfeitas condições de influir nas decisões a que serão submetidos, devendo ser amenizada a fragilidade do executado diante do exeqüente, que detém todas as prerrogativas e facilidades de um processo voltado exclusivamente à satisfação de seu título executivo.
Não podemos de forma alguma coadunar com o desenrolar do processo de execução sem a existência de um contraditório efetivo sob pena de violarmos a cláusula due process of law. O processo não pode engessar a atividade democrática dos jurisdicionados, mas sim trazer a tona todas as pertinentes assertivas para a pacificação social.
Analisando a existência de contraditório no processo de execução, manifestou-se RODRIGO CAMPOS ZEQUIM no sentido de que
"admitindo-se a existência de um controle de admissibilidade na execução, bem como a incidência do contraditório, deve-se permitir á parte que, no bojo do processo de execução, utilizando-se da exceção de pré-executividade, colabore com a atividade do juiz, auxiliando-o na realização do juízo de admissibilidade do processo, ou seja, dando-lhe conhecimento principalmente sobre a falta de quaisquer condições ou pressupostos da ação, possibilitando a este, extinguir de ofício um processo que se encontra eivado de nulidades".
Definitivamente não é crível que concebamos que o executado, diante de uma demanda executória temerária, possa ficar a disposição dos desmandos do exeqüente. É hora de aceitarmos a existência de carga de cognição do processo de execução a fim de viabilizar o exercício desburocratizado da ampla defesa e contraditório. Muito se fala no direito de ação como prerrogativa cívica dos jurisdicionados, mas a pacificação social e aplicação de vontade da lei ao caso concreto somente ocorrerão quando pusermos à disposição de todos a prestação de tutela jurisdicional participativa, onde haja influência nos provimentos com a inexistência de óbices desnecessários.
Esclareça-se por oportuno que diante de uma demanda temerária, o executado deve ser ouvido sem a prévia constrição de seu patrimônio para segurança do Juízo. Nas questões de ordem pública, apresenta-se pacífica a possibilidade da parte alertar ao Juízo sobre a existência destes vícios insanáveis. Qualquer questão apreciável de ofício pode e deve ser passível de argüição do jurisdicionado interessado.
O Estado Democrático de Direito não deve ser encarado com apenas uma abstração jurídica, mas como um valor capaz de impregnar todo o ordenamento jurídico com seus direitos e garantias aos indivíduos. A necessidade de segurança do Juízo e do recolhimento de custas referentes á propositura de nova demanda somente trazem à baila o resquício de autoritarismo, inflexibilidade e burocracia da legislação editada à época do regime ditatorial militar iniciado em 1964 e que infelizmente perduram mesmo após a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Como não houve uma revogação expressa de tais diplomas insensíveis aos direitos individuais, somos obrigados a litigar diante de um ordenamento jurídico híbrido que ao passo que busca desobstruir o acesso à justiça e ao judiciário, mantém freios e bloqueios à obtenção da pacificação social.
A função da exceção de executividade seria justamente rechaçar os óbices desnecessários a prestação da tutela jurisdicional, como a segurança do Juízo e o recolhimento de custas, quando a demanda instaurada contiver algum vício de ordem pública. A constrição patrimonial se faz ainda mais perversa quando nos deparamos com demandas executórias temerárias, onde de plano verifica-se vício insanável. Por que penalizar o executado para que este possa participar no processo de execução, quando esta manifestamente se afigura nula?
Além disso, para a propositura dos embargos do executado fazem-se necessários o recolhimento das custas processuais e da taxa judiciária. Tais pagamentos são extremamente onerosos e muitas vezes não conseguem ser revertidos pela sucumbência, pois existe a possibilidade de insucesso dos embargos do executado ou a insuficiência de bens do exeqüente vencido.
A argumentação de que estes tributos não mais são inconvenientes aos hipossuficientes economicamente com o advento da lei nº 1.060/50 não merece prosperar, visto que muitos jurisdicionados não se enquadram no conceito de miserabilidade jurídica, mas encontram enormes dificuldades para efetuar os pagamentos relativos à propositura da demanda cognitiva. A burocratização não termina neste aspecto pecuniário, atingindo também o aspecto procedimental, pois a demanda incidental requer a distribuição de um novo processo, seu registro e autuação. Todo este trâmite por si só paralisa o desenrolar processual, constituindo-se num verdadeiro empecilho a concreção da justiça.
Nesse sentido, faz-se imperiosa a criação de nova modalidade de defesa do executado sem a burocracia da arcaica legislação totalitária remanescente e sem o bloqueio da constrição ou violação patrimonial para a possibilidade de debate do processo de execução. Surge então a exceção de executividade como alternativa sólida e democrática de participação eficaz do executado no processo de execução, permitindo que este influa de forma útil na formação da decisão judicial a qual será submetido.
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*Advogado do escritório Siqueira Castro Advogados
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