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A penhora on line na justiça do trabalho

Ricardo Licastro Torres de Mello

A Lei 9.800/99, publicada no D.O.U. veiculado em 27.05.1999, permitiu ao Judiciário a utilização de sistema eletrônico de transmissão de dados para a prática de atos processuais. Em suma, pretendeu o legislador adequar a atuação dos órgãos públicos às facilidades proporcionadas pela difusão da internet, em benefício do interesse social.

terça-feira, 11 de maio de 2004

Atualizado em 10 de maio de 2004 11:44

A penhora on line na justiça do trabalho

 

Ricardo Licastro Torres de Mello*

 

1. Histórico

 

A Lei 9.800/99, publicada no D.O.U. veiculado em 27.05.1999, permitiu ao Judiciário a utilização de sistema eletrônico de transmissão de dados para a prática de atos processuais. Em suma, pretendeu o legislador adequar a atuação dos órgãos públicos às facilidades proporcionadas pela difusão da internet, em benefício do interesse social.

 

Com base nessa lei, foi firmado, em maio de 2001, convênio entre o Superior Tribunal de Justiça e o Banco Central do Brasil, que possibilitou aos juízes federais e estaduais a penhora on line de eventuais valores decorrentes de ações judiciais em trâmite perante essas duas esferas.

 

Seguindo a experiência da Justiça Comum, em 05.03.2002 foi a vez do Tribunal Superior do Trabalho firmar convênio com o Banco Central do Brasil, por meio do qual se estabeleceu a penhora on line de débitos oriundos de Reclamações Trabalhistas, visando agilizar a morosa fase de execução no processo trabalhista.

 

Atualmente, a penhora on line de débitos trabalhistas está amplamente difundida e vem sendo utilizada com bastante freqüência pelos magistrados trabalhistas no decorrer do processo de execução. O site do TRT da 2.ª Região disponibilizou informação segundo a qual, apenas no ano de 2003, foram realizadas 63.886 solicitações de bloqueio on line.

 

2. Conceito

 

Grosso modo, a penhora on line é meio de garantir a execução, através da solicitação eletrônica de informações sobre as contas-correntes / aplicações financeiras do executado, solicitação esta efetuada, mediante senha pessoal, pelo Juiz da causa ao Banco Central do Brasil. Tal solicitação pode culminar com o bloqueio instantâneo dos créditos existentes em quaisquer contas e/ou aplicações financeiras do executado, sendo que os valores eventualmente bloqueados são transferidos para conta bancária própria à disposição do Juízo, garantindo-se, assim, o crédito exeqüente.

 

De fato, o Código de Processo Civil prevê, em seu artigo 655, a penhora em dinheiro, não restando dúvidas de que o citado convênio realizado com o Banco Central do Brasil é uma adequação de uma previsão legal às novas tecnologias disponíveis, viabilizando a aplicação e a efetivação da lei. Afinal, é certo que uma ordem de penhora enviada por computador é infinitamente mais rápida e eficaz do que a expedição de ofício ou Mandado de Penhora a ser cumprido por Oficial de Justiça, por exemplo.

 

3. Objetivo

 

Atualmente, segundo dados fornecidos pelo site do Tribunal Superior  do Trabalho, existem cerca de 1.600.000 processos, em fase de execução, tramitando pelo Judiciário Trabalhista.

 

Assim, tendo-se em vista esse gigantesco número e o fato de que os recursos judiciais relativos ao processo de execução demandam uma espera de aproximadamente três anos para sua apreciação e julgamento, é certo que a penhora on line teve como efeito (i) evitar que os devedores dificultem o pagamento do débito judicial e (ii) tornar mais célere a execução no processo do trabalhista.

 

4. Problemas originados com a aplicação do instituto

 

Não obstante as vantagens que podem ser obtidas com a penhora on line, no tocante à agilização e solução de processos trabalhistas em fase de execução, alguns problemas e distorções têm se tornado freqüentes na Justiça do Trabalho, com a intensificação do uso desse sistema.

 

Um dos problemas ocorre quando o Juiz do Trabalho determina a penhora em qualquer conta onde for encontrado crédito (com a imediata transferência dos valores em conta bancária até o limite do credito exeqüente), inclusive sobre créditos futuros. Isso porque, se a empresa executada supostamente possuir diversas contas bancárias com saldo suficiente para pagar a execução, o bloqueio será realizado não apenas em uma das contas, mas em todas as que possuírem saldo para garantir o crédito do Reclamante. Tal fato poderá se caracterizar em excesso de execução, pois eventualmente ficarão à disposição do Juízo, não apenas o valor executado, mas também o quantum em excesso, indevidamente constrito.

 

Além disso, o procedimento em questão não distingue automaticamente os tipos de contas que são bloqueadas, apesar de o Provimento 3/2003 da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho assegurar a prerrogativa de indicação prévia pelo executado da conta bancária a ser penhorada. Fato é que, muitas vezes, por falhas no sistema, ou por inobservância do Provimento 3/2003, aplicações financeiras específicas são indiscriminadamente constritas, prejudicando, em incontáveis casos, o fluxo de caixa da empresa, seu capital de giro, o pagamento de salários, etc.

 

Assim, se de um lado a instituição da penhora on line possibilita o eficaz cumprimento do artigo 655 do Código de Processo Civil, por outro, afronta o artigo 620 do mesmo diploma, que obriga o Juiz a promover a execução, sempre que possível, pelo modo menos gravoso ao devedor.

 

Importante ressaltar que, em tese, entendemos não ocorrer a quebra do sigilo fiscal do executado quando da emanação da ordem de bloqueio pelo Juiz do Trabalho. Isso porque, o Juiz, ao comunicar-se eletronicamente com o Banco Central do Brasil, recebe informações apenas sobre a existência de contas-correntes e/ou aplicações financeiras do executado, não tendo acesso ao saldo disponível.

 

Curiosamente, e apenas a título de informação, temos que, se ao Juiz fosse possibilitado o acesso aos valores existentes nas contas e/ou aplicações financeiras do executado, seria possível que as falhas apontadas anteriormente deixassem de existir, já que, ao ordenar o bloqueio, o Juiz definiria exatamente qual seria o objeto da constrição. Obviamente, tal prática seria condenável e teríamos uma distorção ainda maior do alcance da aplicação do instituto da penhora on line, pois se estaria violando, além do sigilo bancário, o direito à propriedade, resguardado pelo artigo 5.º da Constituição Federal.

 

Outro problema que tem sido constatado, é o fato de o bloqueio de créditos da Executada ser praticamente instantâneo (bastando que o Juiz dê a ordem de penhora por meio informatizado) e a ordem de desbloqueio não acompanhar a mesma rapidez, ficando o devedor à mercê das Secretarias das Varas, as quais deveriam imediatamente proceder à solicitação de desbloqueio das contas penhoradas. Esse procedimento leva, em alguns casos, semanas, gerando transtornos e colocando em risco a saúde econômica das empresas executadas.

 

Finalmente, deve-se atentar para o fato de que, na esfera da Justiça do Trabalho, os magistrados trabalhistas possuem as senhas de acesso ao sistema de penhora on line. Assim, é possível dizer que os executados ficam, por assim dizer, vulneráveis à conduta do Juiz, que está sujeito a cometer erros ou excessos, além de haver o risco de tal senha ser subtraída por terceiros, já que, vale dizer, há pesquisas que indicam o Brasil como o líder mundial em crimes cometidos pela internet.

 

5. O Projeto de Lei N.º 2597/03

 

O Projeto de Lei n.º 2597/03, de autoria do Deputado César Bandeira (PFL/MA), tramita em regime de urgência na Câmara Federal. Basicamente, este projeto pretende restringir o bloqueio eletrônico na execução dos processos judiciais, autorizando-se sua aplicação apenas na hipótese de estar comprovado que o executado não possui outros meios de garantir a execução. Evidentemente, referido projeto tem sido alvo de críticas do Tribunal Superior do Trabalho, o qual entende que a penhora on line é o meio mais satisfatório de cumprir as demoradas decisões exeqüendas na Justiça do Trabalho.

 

6. Conclusão

 

Em que pese a praticidade e a eficácia da aplicação da penhora on line, pois evita, em grande parte, a morosidade na execução e as tentativas de fraudes objetivando o não-pagamento da dívida trabalhista, este instituto deve, ainda, ser objeto de estudos que visem seu aprimoramento, evitando-se, assim, sua má-aplicação no que tange aos excessivos e indevidos bloqueios de contas, que afetam especialmente a saúde econômica das empresas devedoras.

 

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* Advogado do escritório Brandi Advogados

 

 

 

 

 

 

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