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Sucessão sem ruptura!

Sucessão familiar exige preparo, estrutura e diálogo. Sem planejamento, há risco de conflitos, crises e até o fim da empresa.

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Atualizado em 3 de abril de 2025 14:54

A sucessão em empresas familiares é inevitável. Mas o que pode - e deve - ser evitado é a ruptura, o conflito e a descontinuidade.

Em muitos casos, o fundador permanece no comando até o limite da sua capacidade, adiando conversas difíceis e deixando herdeiros despreparados. O resultado? Conflitos societários, quedas de faturamento e até o fim do negócio.

Neste artigo, vamos mostrar como uma sucessão bem planejada é um projeto de continuidade - e não um ato isolado. E, principalmente, como isso se faz com estrutura, tempo e conversa.

(I) O mito da sucessão natural: por que esperar "o momento certo" pode custar caro

A ideia de que a sucessão ocorrerá de forma natural, em um futuro conveniente, é um dos maiores erros de planejamento. Deixar para tratar do assunto apenas quando o fundador não é mais capaz de gerir o negócio costuma resultar em conflitos e desorganização, o que poderá culminar em uma grande crise e ser o fim daquela sociedade. Além disso, a falta de planejamento prévio deixa os herdeiros despreparados para tomar decisões estratégicas e operacionais. Sociedades que não antecipam a sucessão correm o risco de perder competitividade e até mesmo de ver seu patrimônio diluído.

(II) Planejamento sucessório é estratégia, segurança, continuidade e legado

É comum relacionar o planejamento sucessório a somente a transferência dos bens para uma suposta blindagem patrimonial. No entanto, fato é que não existe verdadeira blindagem patrimonial. O valor desse tipo de organização está na sua função estratégica: preservar o negócio enquanto legado, garantir a continuidade da gestão empresarial e reduzir potenciais conflitos entre herdeiros.

O planejamento sucessório permite antecipar decisões que, se deixadas para o momento da sucessão, podem resultar em disputas judiciais, paralisação de negócios ou até dissolução de sociedades. Ao organizar, ainda em vida, a forma como o patrimônio e o comando da sociedade serão transmitidos, o empresário assegura maior estabilidade e previsibilidade para o futuro da família e da atividade econômica, de acordo com seus desejos e com o que é factível em seu contexto familiar.

Para isso, diversas ferramentas podem ser utilizadas - como testamentos, criação de um conselho dentro da sociedade para decidir sobre questões específicas, doações com cláusulas específicas, acordos de sócios - sempre à luz da realidade de cada núcleo familiar e do porte da empresa. A constituição de uma holding, nesse contexto, é uma das formas possíveis de centralizar e organizar bens e participações societárias, favorecendo a governança e facilitando a transição entre gerações, quando bem estruturada e alinhada com os objetivos sucessórios.

O mais importante é compreender que o planejamento sucessório é, antes de tudo, uma medida de proteção e perenidade. Não se trata apenas de evitar conflitos, mas de promover segurança jurídica, organização patrimonial e um modelo de gestão alinhado à visão de longo prazo da família empresária e da própria operação em si.

(III) Papel dos herdeiros e dos gestores profissionais

É comum que as sociedades enfrentem conflitos relacionados ao papel dos herdeiros e dos gestores profissionais. Nem sempre os herdeiros dos fundadores possuem o perfil, o preparo ou mesmo o interesse em assumir a liderança do negócio.

Nesse cenário, torna-se fundamental definir com clareza as funções e responsabilidades de cada parte, considerando inclusive a possibilidade de contar com profissionais externos na gestão da empresa.

A governança corporativa exerce papel essencial nesse processo, ao alinhar interesses, promover a integração entre gerações e garantir a longevidade da organização. A criação de conselhos consultivos ou administrativos com participação de membros independentes, por exemplo, pode ser uma estratégia eficiente para equilibrar tradição e inovação.

Além disso, a adoção de processos decisórios bem definidos e mecanismos de transparência contribui para a redução de conflitos internos e para o fortalecimento de uma cultura organizacional orientada à continuidade e à sustentabilidade do negócio familiar.

(IV) Checklist: sua empresa está pronta para a sucessão?

- Existe um planejamento sucessório formalizado?

- Os herdeiros estão preparados e capacitados para assumir papéis estratégicos?

- Há protocolos e acordos de sócios bem definidos?

- Seu Contrato Social está bem estruturado para disputas societárias e a sucessão?

- O planejamento tributário está alinhado com o planejamento sucessório?

- A governança corporativa está estabelecida e em funcionamento?

A sucessão sem ruptura é um projeto que exige planejamento, diálogo e estrutura. Ao adotar uma abordagem estratégica e organizada, é possível garantir que a troca de mãos ocorra de forma harmoniosa, preservando o patrimônio e o legado da empresa para as próximas gerações.

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RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial: volume único. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2022.

VELLOSO, Simone Pitten; GRISCI, Carmen Ligia Iochins. Governança corporativa e empresas familiares em processo sucessório: a visão de consultores e de famílias empresárias. Revista de Gestão, São Paulo, v. 22, n. 1, p. 72-88, 2015. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=337232942008. Acesso em: 31 mar. 2025.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1, 11 jan. 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso em: 31 mar. 2025.

BRASIL. Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as Sociedades por Ações. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, p. 1, 17 dez. 1976. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6404consol.htm. Acesso em: 31 mar. 2025.

Barbara Rita Lamarca Escapin

Barbara Rita Lamarca Escapin

Advogada graduada em Direito pelas Faculdades Integradas Rio Branco - Fundação de Rotarianos de São Paulo, inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo (OAB/SP) (2019). Formação em Educação Executiva/Compliance pela Fundação Getúlio Vargas (2022). Pós-graduada em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas. Autora de artigos. Advogada no TM Associados.

Carolina Cotrin de Oliveira

Carolina Cotrin de Oliveira

Advogada, graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUCCAMP). Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP) (2019). Autora de artigos. Advogada do Departamento Consultivo no TM Associados.

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