A hora do planejamento sucessório
O ITCMD vem sendo objeto de alterações substanciais no curso da reforma tributária, evidenciando a conveniência dos projetos de planejamento sucessório para redução dos custos inerentes à sucessão.
sexta-feira, 4 de abril de 2025
Atualizado às 11:32
A reforma tributária em curso suscita muitas dúvidas, mas há, ao menos, uma certeza: as alterações já promovidas impactarão consideravelmente no custo do ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos, sinalizando para a conveniência da antecipação da sucessão de bens e direitos, através de projetos de planejamento sucessório.
Além de instrumento eficiente para prevenir ou, ao menos, minimizar potenciais conflitos que soem acompanhar a abertura da sucessão, e os impactos deletérios de tais disputas sobre o núcleo familiar, o planejamento sucessório consiste em um conjunto de estratégias lícitas voltadas, do ponto de vista econômico, à redução da carga tributária incidente na transmissão causa mortis de bens e direitos, otimizando os custos inerentes à sucessão patrimonial nessas circunstâncias.
O ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação é um tributo de competência dos Estados e do Distrito Federal que incide sobre a transmissão de quaisquer bens e direitos, no contexto a que alude o art. 155, inciso I, da CF/88.
A EC 132, de 20/12/23, que alterou o Sistema Tributário Nacional, promoveu alterações imediatas e substanciais no regramento do imposto em tela.
Inicialmente, convém destacar que a referida emenda acresceu o inciso VI ao § 1º do art. 155 da CF, para determinar que o ITCMD "será progressivo em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação". Vale dizer, quanto maior o valor do patrimônio sucedido, maior a alíquota do imposto, obrigatoriamente.
Avulta notar, ainda, que, sem promover qualquer alteração na redação do inciso III do § 1º do art. 155 da CF, que condiciona a possibilidade de incidência do imposto, nas hipóteses de transmissão de bens situados no exterior, à edição de lei complementar para regular a competência para sua instituição, a EC 132/23, visando contornar a lacuna legislativa subsistente, regulou, transitoriamente, a matéria, até o advento da lei complementar reclamada.
Com isso, abriu caminho para que os Estados e o Distrito Federal promovam as adequações legislativas necessárias para viabilizar a cobrança do imposto nas hipóteses de transmissão, por doação ou herança, de bens situados no exterior.
E não é só. Por determinação constitucional, a alíquota máxima do imposto será fixada pelo Senado Federal (art. 155, § 1º, IV, CF). No particular, convém observar que tramita no Senado o projeto de resolução 57/19, que tem por finalidade alterar a alíquota máxima do ITCMD, atualmente fixada em 8%, para 16%.
Se aprovada a resolução, cujo projeto ainda aguarda a designação de relator, Estados e Distrito Federal poderão promover a adequação de suas leis para elevar as alíquotas máximas até o percentual de 16% do patrimônio transferido, respeitada a progressividade do imposto.
A fim de evidenciar a dimensão do impacto financeiro das novidades, convém trazer exemplos do cenário atual. No Estado de São Paulo, o cálculo do imposto é efetuado mediante a aplicação dos porcentuais de 2,5%, sobre a correspondente parcela do valor da base de cálculo até o montante de 12.000 UFESPs, e acima desse limite, 4%. Para 2025, o valor da UFESP - Unidade Fiscal do Estado de São Paulo é de R$ 37,02.
Atualmente, já tramita na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, o PL 7/24, que pretende alterar a lei estadual 10.705/00, para que se aplique ao ITCMD alíquotas progressivas que variam de 2%, sobre a parcela da base de cálculo que for igual ou inferior a 10.000 UFESPs, a 8%, sobre a parcela da base de cálculo que exceder 280.000 UFESPs.
O Estado da Bahia também já adotava a progressividade do imposto, impondo alíquota máxima (8%), nas hipóteses em que a patrimônio transferido, por morte, supere R$ 300.000,00; ao passo que, nas doações, a alíquota progressiva foi introduzida recentemente pela lei estadual 14.802, de 26/12/24, que substituiu a alíquota fixa de 3,5%, para doações até R$ 200.000,00, e 04%, para doações acima de R$ 300.000,00. É o que se extrai da nova redação do art. 9º da lei estadual 4.826/1989, que produzirá efeitos a partir de 27/3/25.
Na Bahia, se aprovada a resolução do Senado, com o conteúdo proposto, o Estado, que já adota a alíquota máxima de 8%, poderá dobrá-la. Assim, a transmissão causa mortis de um patrimônio avaliado em R$ 1 milhão, que ensejaria, atualmente, a cobrança de ITCMD no valor R$ 80.000,00, obrigará o pagamento de R$ 160.000,00.
Nesse caso, um planejamento sucessório, para a imediata transmissão aos sucessores de bens e direitos integrantes de espólio futuro, atrairia a incidência da alíquota máxima fixada até então para doação, qual seja, 4%, ensejando o pagamento de R$ 40.000,00, a título de ITCMD, gerando uma economia de R$ 120.000,00, em relação ao cenário futuro hipotético, porém provável, e de R$ 40.000,00, se considerado o cenário atual.
No Distrito Federal, ainda não houve alteração das alíquotas do imposto, fixadas entre 4%, sobre a parcela da base de cálculo que não exceda a R$ 1.000.000,00, e 6% sobre a parcela da base de cálculo que exceda R$ 2.000.000,00 (art. 9º da lei distrital 3.804/06).
À insegurança quanto às alíquotas soma-se, ainda, a preocupação com a base de cálculo do imposto. A propósito, recentemente, em 18/2/25, o STJ julgou REsp 2139412 - MT.
Na ocasião, o Estado do Mato Grosso pretendia fazer prevalecer, para fins de apuração de ITCD, a avaliação do fisco de quotas de participação em sociedade cujo capital social fora majoritariamente integralizado com imóveis, considerando o valor de mercado dos bens, em detrimento do montante declarado pelo contribuinte, correspondente ao valor patrimonial contábil na data da ocorrência do fato gerador.
No julgamento do recurso, o STJ afirmou que a jurisprudência do Tribunal "entende que a base de cálculo do ITCD é o valor venal dos bens e direitos transmitidos, assim compreendido como aquele que corresponde ao valor de mercado do patrimônio integral que serviu de base para a apuração do imposto"1.
O julgado reforça a conveniência de se promover a antecipação, em vida, da transferência de bens e direitos, a fim de assegurar a cobrança de ITCMD com base em alíquotas mais favoráveis, mormente porque a fixação da base de cálculo tem suscitado diversas controvérsias entre fisco e contribuintes, restando ao Poder Judiciário promover a conformação da matéria, fomentando um ambiente de constante insegurança jurídica.
Daí possível concluir-se que, em que pese não haja projeção temporal quanto à elevação da alíquota máxima do ITCMD, idealizada pelo projeto de resolução do Senado 57/19, as alterações já implementadas pela reforma do Sistema Tributário Nacional são suficientes, por si sós, para onerar consideravelmente a transmissão causa mortis de bens e direitos, evidenciando os benefícios da antecipação da sucessão, mediante a realização de um projeto de planejamento sucessório, sob a orientação de profissionais capacitados.
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1 Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202401479235&dt_publicacao=21/02/2025. Acesso em: 24 mar. 2025.