Crimes financeiros na era das criptomoedas
Criptomoedas e crimes financeiros: Avanços investigativos, desafios da defesa e oportunidades jurídicas. Estratégias eficazes para garantir direitos e combater acusações infundadas no cenário digital.
domingo, 30 de março de 2025
Atualizado em 28 de março de 2025 14:19
A criminalidade financeira evolui na mesma velocidade das inovações tecnológicas. Nos últimos anos, o uso de criptomoedas tem sido cada vez mais associado a crimes como lavagem de capitais e evasão de divisas, o que tem despertado o interesse de autoridades reguladoras e investigativas ao redor do mundo. A crescente sofisticação dos mecanismos de fiscalização impõe desafios inéditos para a figura do acusado e seus defensores, exigindo novas estratégias jurídicas e uma abordagem técnico-especializada para garantir o devido processo legal e a ampla defesa.
A lavagem de capitais e a evasão de divisas no contexto das criptomoedas
O crime de lavagem de capitais, previsto na lei 9.613/98, consiste no processo de ocultação ou dissimulação da origem ilícita de bens, direitos ou valores. Já a evasão de divisas, disciplinada no art. 22 da lei 7.492/86, ocorre quando há envio de recursos para o exterior sem a devida comunicação às autoridades competentes.
A utilização de criptoativos em atividades ilícitas se dá, em grande parte, devido à descentralização e ao pseudonimato proporcionados por blockchains como bitcoin e monero. Entretanto, o rastro digital deixado pelas transações pode se tornar um elemento crucial tanto para a acusação quanto para a defesa, dependendo da forma como as provas são apresentadas e analisadas.
A evolução das investigações e as lacunas na acusação
As autoridades competentes vêm aprimorando suas técnicas de rastreamento de ativos digitais, utilizando ferramentas de análise forense de blockchain, como Chainalysis e CipherTrace. No Brasil, a Receita Federal já exige a declaração de operações com criptomoedas, e o COAF - Conselho de Controle de Atividades Financeiras monitora movimentações suspeitas.
Todavia, a maior parte das denúncias baseadas no uso de criptoativos ainda carece de robustez técnica, muitas vezes se sustentando em inferências imprecisas e na demonização do setor. Em inúmeros casos, há falhas na cadeia de custódia das provas, ausência de vínculo direto entre os valores movimentados e crimes antecedentes, bem como interpretações equivocadas sobre o funcionamento das exchanges e das carteiras digitais.
Estratégias de defesa e soluções jurídicas
Para aqueles que se veem envolvidos em acusações dessa natureza, algumas linhas de defesa podem ser decisivas:
- Desconstrução do nexo causal - A defesa deve demonstrar que a simples posse ou movimentação de criptoativos não configura, por si só, crime de lavagem de dinheiro ou evasão de divisas. A ausência de um crime antecedente identificado e provado enfraquece substancialmente a acusação.
- Desafios técnicos e perícia independente - A realização de perícia própria em transações blockchain pode revelar inconsistências nas investigações, provando, por exemplo, que os fundos rastreados não possuem origem ilícita ou que a conexão entre o acusado e as transações é equivocada.
- Questionamento da regularidade da obtenção das provas - Muitas investigações sobre criptomoedas extrapolam limites legais, violando garantias constitucionais. A quebra de sigilo bancário e telemático sem autorização judicial ou a obtenção de dados de forma clandestina são passíveis de nulidade processual.
- Oportunidade de regularização fiscal e compliance - Dependendo do caso concreto, a adesão a programas de regularização fiscal pode ser uma saída viável. Demonstrar que as operações foram realizadas sem dolo e que há intenção de conformidade com a legislação tributária pode afastar ou atenuar imputações criminais.
- Negociação de acordos e colaboração premiada - Em alguns cenários, a cooperação com as autoridades pode ser a melhor estratégia, possibilitando reduções de pena e até mesmo a exclusão de responsabilidade criminal, desde que haja segurança jurídica para o colaborador.
Conclusão
A ascensão das criptomoedas transformou o panorama dos crimes financeiros, trazendo tanto desafios quanto oportunidades para a advocacia criminal. O avanço das investigações exige que a defesa esteja cada vez mais capacitada para lidar com aspectos técnicos, questionar provas frágeis e assegurar que os princípios constitucionais sejam respeitados.
Com uma abordagem estratégica, baseada em conhecimento jurídico e tecnológico, é possível construir defesas sólidas e eficazes, garantindo que o direito não seja atropelado pelo avanço das inovações e pelo ímpeto punitivo do Estado.