TCU decide sobre a comprovação de reserva de cargos para PCDs
O TCU, no acórdão 523/25, decidiu que a certidão de reserva de cargos do MTE não é o único meio válido para comprovar o cumprimento das cotas de PCDs em licitações.
quinta-feira, 27 de março de 2025
Atualizado em 26 de março de 2025 16:50
O TCU - Tribunal de Contas da União, por meio do acórdão 523/25, entendeu pela impossibilidade de inabilitação de licitante com base exclusivamente na certidão de reserva de cargos emitida pelo MTE - Ministério do Trabalho e Emprego, possibilitando a comprovação do cumprimento das cotas por outros documentos legais.
A lei 8.213/91, que regulamenta os direitos dos beneficiários da previdência social, exige que todas as empresas com mais de 100 empregados preencham uma cota de 2% a 5%, de seus cargos com reabilitados ou com PCDs (art. 93). A determinação reflete a promoção de políticas públicas de inclusão e efetivação de direitos sociais.
A nova lei de licitações e contratos, em seu art. 63, inciso IV, dispôs sobre a reserva de cargos para PCDs - pessoas com deficiência e reabilitados da previdência social como documento obrigatório na fase de habilitação.
Logo, ao apresentar os documentos de habilitação, os licitantes devem assinar ou elaborar, a depender das disposições do edital, uma declaração, a qual possui presunção de veracidade, informando o cumprimento da reserva de cargos.
Dessa forma, o responsável pela licitação somente poderia exigir a apresentação de documentação comprobatória caso haja questionamento, por meio de recurso, de outra licitante, havendo indícios da ausência de cumprimento da determinação legal.
O tema foi assunto de julgado recente do Tribunal de Contas da União. Em representação (TC 019.969/2024-4) formulada por licitante do pregão eletrônico 90014/24, cujo objeto era a contratação de empresa especializada em serviços de prevenção de incêndio e pânico, alegou-se que a empresa habilitada teria descumprido com a reserva de cargos prevista no art. 63, inciso IV, da lei 14.133/21.
Segundo a representante, a declaração apresentada pela empresa habilitada seria falsa, uma vez que a certidão emitida pelo MTE - Ministério do Trabalho e do Emprego constatava um quantitativo inferior ao das cotas exigidas.
A referida certidão do MTE corresponde a um documento que captura informações do cadastro do e-Social (o qual é preenchido pela própria empresa) na qual consta quantidade total de funcionários, contabilizando matriz e filiais, e dos funcionários classificados como PCDs, referente aos últimos 3 dias. Assim, ela realiza o cálculo da porcentagem exigida de cargos indicando se o percentual está inferior, igual ou superior ao exigido no art. 93, da lei 8.213/91.
Portanto, a certidão, em tese, indicaria o descumprimento da reserva possibilitando a punição da licitante por crime de falsidade ideológica no âmbito penal (art. 299, do CP), e no âmbito administrativo (art. 155, inciso VIII, da lei 14.133/21), com a sanção de impedimento de licitar e contratar com a Administração Pública (art. 156, §5º, lei 14.133/21).
No julgado, a licitante habilitada apresentou documentos demonstrando os esforços tomados para o preenchimento das vagas, documentos de atendimento do percentual exigido, bem como uma certidão atualizada do MTE indicando o cumprimento da reserva prevista em lei.
Ao analisar os documentos, o plenário do TCU, por meio do acórdão 523/25, entendeu pela impossibilidade de inabilitação de licitante baseado exclusivamente na certidão de reserva de cargos emitida pelo MTE - Ministério do Trabalho e Emprego, possibilitando a comprovação do cumprimento das cotas por outros meios documentais.
Dessa forma, a Corte entendeu pelo caráter não vinculativo e pela ausência de obrigatoriedade de consulta ao MTE, diante da volatilidade da certidão, que representa a condição da empresa referente apenas aos últimos 3 dias das atualizações realizadas por ela no sistema do e-Social, podendo não representar a real situação da empresa no momento da emissão.
Percebe-se a extrema relevância do julgamento do TCU, o qual não apenas considerou a indispensabilidade da exigência da reserva de cargos, observando que se trata de uma política social fundamentada na equidade, mas também ponderou a questão sob a ótica da verdade material e do formalismo moderado.
Portanto, para fins de comprovação, o Tribunal entendeu que a certidão emitida pelo MTE é apenas uma das formas de informar o cumprimento da medida, não sendo o único meio exclusivo. Logo, a certidão que indicar percentual inferior não é suficiente, por si só, para inabilitar uma licitante.
Portanto, o licitante poderá comprovar o preenchimento por meio de dados do e- Social, de contratos de trabalho, comprovantes de vínculo empregatício ou quaisquer outros meios de provas admitidos em direito.
Conclui-se que é acertado o entendimento do TCU não apenas pela relevância do cumprimento da reserva de cargos para assegurar o pleno cumprimento da função social dos contratos administrativos, mas também pelo fato que não se devem criar obstáculos formais como impedimento à participação em licitações, possibilitando a ampla competitividade e o atendimento ao interesse público.
Isadora França Neves
Sócia no Fenelon, Barretto e Rost Advogados. Mestre em Direito pela Universidade de Brasília. Professora de Direito Administrativo e Empresarial na Universidade Católica de Brasília.
Luíza Benon Soares Peixoto
Sócia do Fenelon, Barreto e Rost. Pós-graduanda em Direito Processual pelo UniCEUB. Graduada em Gestão Pública pelo Instituto Federal de Brasília.