Holding familiar e confusão patrimonial: Entendendo os riscos e consequências
A holding familiar organiza e protege o patrimônio familiar, mas a confusão patrimonial pode levar à desconsideração da personalidade jurídica e a riscos financeiros.
sexta-feira, 21 de março de 2025
Atualizado em 20 de março de 2025 15:06
A holding familiar é uma estrutura comumente utilizada por famílias para gerenciar, proteger e organizar seu patrimônio. Referida empresa detém a propriedade de bens como imóveis, quotas de outras empresas, investimentos, dentre outros bens móveis ou imóveis e geralmente pertencentes a membros de uma mesma família. Essa estrutura permite que a família gerencie e controle todo o seu patrimônio de forma centralizada, além de proporcionar redução na carga tributária, organização familiar tanto em vida como na sucessão, bem como a proteção patrimonial.
No entanto, vale mencionar que este tipo de estrutura deve ser criado sempre observando que não pode ocorrer a mistura entre o patrimônio da holding familiar e o patrimônio individual de cada membro da família que participe desta holding. Essa mistura entre o patrimônio pessoal e o patrimônio da holding é chamado de confusão patrimonial.
A confusão patrimonial acontece quando não há uma clara separação entre os ativos e passivos da holding e os ativos e passivos individuais, ou seja, usar recursos pessoais para pagar dívidas da holding ou mesmo usar recursos da holding para pagar dívidas pessoais, pode ser visto pelo Fisco como um alerta para a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, pelo fato da pessoa física, sócia da holding, estar supostamente escondendo o seu patrimônio pessoal em uma pessoa jurídica e ter esvaziado todo seu patrimônio pessoal, ou seja, não ter mais patrimônio na pessoa física.
Nesse sentido, caso seja configurada a desconsideração da personalidade jurídica, os bens da pessoa jurídica podem responder pela dívida dos sócios pessoas físicas e, desta forma, caso hajam outros sócios na mesma holding ou mesmo os filhos que receberam estas quotas de herança ou doação de seus pais, estes também podem sofrer consequências patrimoniais, na medida em que a holding que eles participam, teve a desconsideração da personalidade jurídica decretada.
Em uma decisão recente, o TJ/SP, em um caso de holding familiar, determinou a aplicação de um incidente de desconsideração de personalidade jurídica com o fundamento de que houve confusão patrimonial, pois o patriarca que criou a holding nela colocou todos os bens e, em seguida, fez a doação das quotas para seus filhos.
Os imóveis foram então vendidos, mas o pai havia deixado uma dívida significativa. Neste caso os juízes entenderam que, visando proteger o patrimônio da família, a holding foi criada apenas para retirar o patrimônio do nome do pai para ele não ser penhorado. Foi também constatada a confusão patrimonial entre os bens do pai com os da holding familiar. Como resultado, o TJ/SP determinou a desconsideração de personalidade jurídica, responsabilizando os herdeiros, detentores das quotas da holding que venderam os imóveis, responsáveis pelo pagamento da dívida contraída pelo pai na pessoa física dele.
Referido julgamento cria um ponto de alerta para os planejamentos sucessórios, pois ao constituir uma holding familiar, é essencial que todos esses riscos sejam sopesados, a depender do caso concreto.
Apesar da holding familiar ser uma ferramenta que visa transferir bens aos herdeiros de forma organizada, promover harmonia familiar, perpetuar o patrimônio da família e reduzir a carga tributária na sucessão, deve ser utilizada com muita transparência e segurança, de modo que tanto os doadores que constituíram a holding para fazer seu planejamento sucessório e doar as quotas para seus herdeiros, quanto os donatários, que na qualidade de herdeiros estão recebendo essas quotas da holding, não sejam surpreendidos com prejuízos financeiros que não são seus.
Aryane Braga Costruba
Gerente da Divisão de Consultoria do escritório Braga & Garbelotti - Consultores e Advogados.