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Compra de veículos usados de pessoa física: Riscos e medidas para prevenção

Para evitar problemas na compra de veículos usados, é essencial analisar tanto as condições do vendedor quanto do bem adquirido.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Atualizado às 13:22

A aquisição de veículos usados tem ganhado cada vez mais relevância, seja devido ao elevado custo dos veículos novos, seja pelo interesse de colecionadores em automóveis antigos com valor histórico, ou somente a aquisição de um seminovo confiável.

Contudo, essa transação pode acarretar problemas significativos para o comprador, especialmente quando realizada com pessoa física sem habitualidade, caso em que não se aplica o CDC.

Quando o negócio jurídico se submete às relações de consumo, o comprador possui direitos e garantias mais abrangentes, o que confere maior segurança à contratação.

Entretanto, quando o vendedor é pessoa física, que não realiza a venda de veículos usados com habitualidade, serão aplicáveis as regras do CC, que apresenta rol de direitos e garantias reduzido, o que exige atenção redobrada, especialmente quando surge a efetiva necessidade de invocar essas regras, seja por má sorte no negócio, ou até mesmo má intenção por parte do vendedor, que pode ter o objetivo de ocultar defeitos para se livrar de um bem problemático.

A primeira consequência jurídica decorrente da compra de veículo usado de pessoa física que não realiza essa atividade corriqueiramente consiste na imposição de responsabilidade subjetiva ao vendedor. Isso significa que ele apenas poderá ser responsabilizado por defeitos no veículo caso seja comprovado que já tinha conhecimento do problema e omitiu essa informação de forma intencional. Dessa forma, é necessário provar o dolo para que haja a obrigatoriedade de indenização.

A segunda consequência reside em aspectos processuais de eventual ação proposta pelo comprador em face do vendedor para a cobrança dos prejuízos decorrentes do defeito e de danos indiretos causados por esse defeito.

Cenário desafiador para o comprador, pois diferentemente das relações de consumo, não há presunção de veracidade das alegações do comprador, tampouco inversão automática do ônus da prova, sem considerar a vulnerabilidade e hipossuficiência do comprador, como ocorreria se houvesse relação de consumo.

Na prática, significa dizer que, em regra, identificado o defeito pelo comprador, caberá a ele a comprovação de que essa condição já existia no momento da compra e que apareceu apenas após a celebração do negócio.

A terceira consequência constitui no prazo para a reclamação de defeitos de veículos usados adquiridos de vendedores pessoas físicas, que será de até 30 dias, contado a partir da constatação do defeito pelo comprador. Esse prazo reduzido impõe ao comprador a necessidade de agir rapidamente caso encontre algum problema no veículo.

Por fim, a quarta consequência, diferentemente das compras realizadas em concessionárias ou lojas, nas quais há obrigatoriedade de oferecimento de garantia mínima, a aquisição de um veículo de pessoa física não impõe essa exigência, exceto se as partes estipulem o contrário em contrato, prática não comum em nossa sociedade, de modo que o vendedor particular não é obrigado a cobrir eventuais defeitos ou realizar reparos.

Sobre esse assunto, não podemos deixar de reforçar que, demonstrado que o vendedor omitiu informações relevantes a respeito das condições do veículo, como a existência de sinistros não comunicada, falhas mecânicas, ou que agiu de má-fé, é absolutamente exigível a indenização do comprador independentemente de previsão contratual, seja por meio da sua correção, seja por meio da devolução do valor pago pelo bem, que ainda pode ser acrescido de outras despesas de acordo com o caso concreto ou seja por meio do abatimento proporcional do valor do bem.

Por isso, é essencial que o comprador tenha cautela e atenção duplicada ao adquirir um veículo usado. Isso pode ser reforçado pela formalização de um contrato de compra e venda por escrito, com todas as especificidades detalhadas, devidamente assinado pelas partes e por testemunhas.

Além disso, contar com a assessoria de um despachante pode ser um grande aliado no levantamento de informações formais sobre o veículo, tais como histórico de restrições por alienação fiduciária, impedimentos administrativos e até bloqueios judiciais.

Atualmente, também é possível recorrer às ECVs - Empresas Credenciadas de Vistoria, que emitem o laudo obrigatório de compra e venda. Esse documento proporciona segurança básica em verificar possíveis adulterações de hodômetro e em conferir os sinais identificadores do veículo e a conformidade das placas principais.

Existe também a possibilidade de se realizar uma análise ainda mais aprofundada, com a solicitação do laudo cautelar, documento temido por muitos vendedores, pois avalia a estrutura do veículo e realiza outras consultas para assegurar que o bem negociado está de acordo com o que foi informado pelo vendedor. Embora esse laudo não elimine completamente os riscos, trata-se de uma ferramenta muito importante para reduzir eventuais problemas futuros.

Outra precaução indispensável é a realização de um "test drive", bem como a verificação do histórico de manutenção do veículo e a conferência das revisões realizadas, não descartando a avaliação da idoneidade dos profissionais responsáveis pelos serviços prestados ao automóvel.

Embora essas medidas possam parecer excessivas, é importante lembrar que elas são aplicáveis tanto para veículos de menor valor quanto para automóveis que ultrapassam cifras milionárias. Nenhum veículo está isento de defeitos ocultos, e uma análise criteriosa antes da compra pode evitar transtornos e prejuízos futuros.

Rodrigo Vieira Augusto

VIP Rodrigo Vieira Augusto

Sócio do escritório Chelotti & Augusto Advogados. Sócio da GRP Transportes. Sócio do Grupo R. Passarinho. Pós-graduando em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo -FDSBC

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