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A responsabilidade pós-contratual: Limites e obrigações após o encerramento do vínculo contratual

Júlia Lopes Justino e Ana Flávia Beteto Giacomelli

A responsabilidade pós-contratual garante obrigações após o fim do contrato, visando a proteção de interesses legítimos e o cumprimento das cláusulas acordadas.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Atualizado em 25 de fevereiro de 2025 14:25

A finalização de um vínculo contratual nem sempre põe fim às obrigações pactuadas entre as partes em um instrumento de contrato. Não são raros os casos em que se verifica a chamada responsabilidade pós contratual, também conhecida como "post pactum finitum", que é a continuidade da aplicação de responsabilidade civil mesmo após o final da relação contratual. 

É, em síntese, o dever de arcar com as obrigações provenientes do contrato mesmo após seu término, apesar do adimplemento da obrigação, devido à verificação tanto de cláusulas expressas quanto da aplicação de princípios norteadores das relações contratuais: boa-fé objetiva, equidade e necessidade de proteção de interesses legítimos das partes. Neste sentido, o CC estabelece de forma clara no art. 422 que as partes têm por obrigação manter as responsabilidades contratuais mesmo após o fim da vigência do pacto. 

Podemos destacar algumas cláusulas bastante comuns, incluídas especialmente em contratos empresariais, que tem por objetivo preservar os interesses das partes envolvidas, como a de confidencialidade, que impede a divulgação de informações sigilosas; a de não concorrência, que limita a atuação profissional de ex-parceiros; a de propriedade intelectual, que garante que as produções desenvolvidas ao longo do contrato ou em decorrência do contrato sejam devidamente protegidas, de acordo com a legislação aplicável; e a de garantias, mantendo a responsabilidade por vícios ocultos verificados mesmo após o desenvolvimento do contrato. 

Em juízo, os tribunais avaliam essas cláusulas sempre à luz da boa-fé. As cláusulas de confidencialidade são aplicáveis a informações efetivamente reveladas e que sejam comprovadamente sensíveis para a parte divulgadora. Já as cláusulas de não concorrência devem ser equilibradas, de modo a não inviabilizar a continuidade das atividades do ex-parceiro, ao mesmo tempo em que sejam razoáveis e aplicadas com moderação para evitar abusos, sob pena de invalidação da disposição contratual.

A formalização de um contrato bem estruturado é essencial para evitar litígios e garantir previsibilidade às relações negociais. A falta de clareza ou a omissão de cláusulas relevantes podem comprometer a execução do pacto, tornando o vínculo frágil e vulnerável a conflitos. 

Para mitigar riscos e fortalecer a segurança jurídica, é necessário observar alguns pontos fundamentais e garantir que as cláusulas sejam redigidas de forma clara e equilibrada:

  • Clareza e objetividade: Contratos devem ser diretos, sem ambiguidades ou termos vagos que possam gerar interpretações conflitantes. 
  • Definição das obrigações e condições: A delimitação clara das obrigações e deveres de cada parte é essencial. 
  • Aplicação de multas e cláusulas penais: Prever penalidades para descumprimentos contratuais desestimula o inadimplemento e garante meios para reparação. 
  • Rescisão e solução de conflitos: É imprescindível estipular condições para rescisão, prevendo prazos, penalidades e regras para devolução de valores ou indenizações. 
  • Proteção contra vícios ocultos e defeitos: A responsabilidade por vícios ocultos deve ser devidamente regulamentada, conforme os arts. 441 e seguintes do CC, que preveem o direito à rescisão ou abatimento de valores em caso de defeitos que comprometam o uso do bem. O CDC (arts. 18 e 26) também impõe prazos específicos para reclamações sobre produtos e serviços defeituosos.
  • Cláusula de não concorrência e confidencialidade: O uso de cláusulas de não concorrência é essencial para proteger segredos comerciais e evitar a concorrência desleal, especialmente em contratos empresariais e trabalhistas. Já a cláusula de confidencialidade resguarda informações estratégicas e comerciais, impedindo seu uso indevido mesmo após a rescisão do contrato, com sanções previstas para eventual descumprimento.

Diante da relevância da responsabilidade pós contratual, é importante que as partes envolvidas estejam sempre atentas às obrigações que podem perdurar ao longo do tempo, mesmo após a finalização do contrato em si. A inclusão de cláusulas bem estruturadas e juridicamente equilibradas não apenas reduz o risco de litígios, mas também fortalece a segurança das relações negociais. 

Amparado pelas decisões que discutem os reflexos da responsabilidade pós contratual, é importante que se leve sempre em consideração para aplicação de tais cláusulas a boa-fé e a equidade, garantindo que a aplicação dessas disposições seja feita de maneira justa e proporcional, evitando abusos e preservando os interesses legítimos dos envolvidos.

Júlia Lopes Justino

Júlia Lopes Justino

Advogada de contratos do escritório Sartori Sociedade de Advogados. Graduada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).

Ana Flávia Beteto Giacomelli

Ana Flávia Beteto Giacomelli

Estagiária do escritório Sartori Sociedade de Advogados

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