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CNJ dificulta contraditório participativo

Previsão de sustentação assíncrona é uma indevida e retrógrada restrição ao amplo exercício da advocacia, caracterizando evidente violação às prerrogativas do advogado, o que é inaceitável.

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Atualizado às 09:14

O CNJ editou a resolução 591 que estabelece requisitos mínimos para a realização de julgamentos de processos em ambiente eletrônico, visando a modernização e transparência do Poder Judiciário.

A preocupação com a modernização e transparência é sempre muito bem-vinda, desde que não haja interferência indevida no exercício de direitos de terceiros.

A resolução, entre outros pontos, estabelece que os julgamentos virtuais poderão ser aplicados a todos os processos, a critério do relator, e que as sustentações orais podem ser enviadas eletronicamente em formato de áudio ou vídeo até 48 horas antes do início do julgamento.

Aqui reside uma indevida e retrógrada restrição ao amplo exercício da advocacia, caracterizando evidente violação às prerrogativas do advogado, o que é inaceitável.

Como já mencionei em artigo passado ("Prerrogativas do advogado são garantia da sociedade", Migalhas, publicado em 9 de janeiro de 2020), qualquer restrição às prerrogativas do advogado deve ser de pronto repelida, pois ferido estará não só o direito imposto à atuação do profissional, como também os direitos de seu cliente.

É exatamente o que ocorre na citada previsão contida na resolução 591 do CNJ, no ponto referente às sustentações orais serem enviadas eletronicamente em formato de áudio ou vídeo até 48 horas antes do início do julgamento, a chamada sustentação assíncrona, ou seja, aquela que não acontece em tempo real.

A sustentação oral nos julgamentos é momento de extrema importância para o amplo exercício da advocacia e consequente proteção dos direitos da sociedade. Para tanto, a sustentação oral deve ser realizada em tempo real, no exato instante do julgamento, mesmo que seja por meio virtual. Qualquer situação diferente é caracterizadora do cerceamento de defesa.

Não raras vezes há necessidade de intervenção imediata do advogado para elucidação de questões levantadas durante o julgamento, o que será inviabilizada se a sustentação for gravada e enviada com antecedência para apreciação dos julgadores.

Assim, em nome da modernização, transparência ou até mesmo da agilidade do Poder Judiciário, não se pode restringir ou criar embaraços para o exercício de um direito já consagrado.

Ademais, em última análise, parece-me que a resolução editada pelo CNJ ultrapassa os limites de sua competência, uma vez que ao prever a sustentação assíncrona, está, na realidade, criando uma nova modalidade processual de "defesa", cuja competência a meu sentir cabe exclusivamente ao Poder Legislativo.

Em conclusão, surge ser revista a resolução de modo que se restabeleça a situação anterior, assegurando a realização das sustentações orais em tempo real, único meio a garantir o contraditório participativo e o uso da palavra pela ordem, entre outras garantias consagradas em nossas legislações.

Renato de Mello Almada

VIP Renato de Mello Almada

Advogado e consultor jurídico, Diretor Jurídico da Confederação Brasileira de Cinofilia, membro da Comissão Disciplinar e de Arbitragem da FCI (Bélgica), foi Relator do TED/OABSP.

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