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O constitucionalismo feminista e a sua influência nas decisões do STF

O constitucionalismo feminista analisa a interseção entre gênero e direito constitucional, buscando ampliar a igualdade de gênero e garantir direitos fundamentais das mulheres.

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Atualizado às 11:45

O constitucionalismo feminista emerge como uma abordagem teórica e prática que busca redesenhar o direito constitucional a partir de uma perspectiva de gênero, questionando as estruturas tradicionais que reproduzem desigualdades. Essa visão propõe uma leitura inclusiva da constituição, visando garantir a igualdade material entre homens e mulheres e promover mudanças estruturais que contemplem as diversidades. No Brasil, esse movimento dialoga diretamente com decisões históricas do STF, que vêm incorporando reflexões de gênero em suas interpretações constitucionais.

O STF, como guardião da Constituição, tem um papel fundamental na concretização de direitos fundamentais e na promoção da igualdade de gênero. Decisões emblemáticas mostram como o constitucionalismo feminista influenciou a jurisprudência brasileira. Um exemplo significativo é a decisão no julgamento da ADI 4424, que reconheceu a inconstitucionalidade da criminalização do aborto em casos de anencefalia. Nesse caso, o STF considerou o impacto desproporcional da proibição sobre as mulheres, especialmente em termos de dignidade e autonomia, conceitos centrais para o feminismo jurídico.

Outra decisão de destaque é a que tratou da inconstitucionalidade do afastamento automático de candidatas grávidas de concursos públicos (RE 1058333). O tribunal reconheceu que tal prática violava o princípio da igualdade, reforçando estereótipos de gênero e punindo a maternidade. Essa decisão não apenas protege direitos fundamentais, mas também representa um avanço no reconhecimento da necessidade de políticas públicas que promovam a equidade no mercado de trabalho e no acesso a oportunidades.

Além disso, a decisão no RE 898.060, que assegurou o direito ao uso do nome social por pessoas trans, reflete o constitucionalismo feminista ao considerar as especificidades de grupos historicamente marginalizados. Embora a questão da identidade de gênero não esteja exclusivamente vinculada ao feminismo, a decisão dialoga com a busca pela desconstrução de normas sociais rígidas que limitam as possibilidades de existência e autonomia, especialmente para mulheres trans.

Apesar desses avanços, a realidade demonstra que a igualdade formal garantida pela CF/88 ainda não foi plenamente efetivada. A interseção entre gênero, raça e classe social impõe barreiras adicionais para mulheres negras, indígenas, pobres e LGBTQIA+. O STF, ao adotar um enfoque sensível às questões de gênero, tem a oportunidade de transformar o constitucionalismo brasileiro em um instrumento de emancipação social, contribuindo para uma sociedade mais igualitária.

No entanto, é preciso reconhecer os limites de uma abordagem exclusivamente judicial para a concretização dos direitos das mulheres. A transformação estrutural exige a articulação entre o STF, o Legislativo, o Executivo e a sociedade civil, garantindo que políticas públicas e programas sociais sejam implementados para enfrentar desigualdades sistêmicas. Além disso, o constitucionalismo feminista deve avançar para incluir as vozes das mulheres mais vulneráveis, que muitas vezes permanecem à margem do debate jurídico e político.

O constitucionalismo feminista, ao questionar as estruturas de poder e propor novas formas de organização social e jurídica, é uma ferramenta essencial para a construção de uma democracia substancial. Decisões do STF que incorporam essa perspectiva demonstram o potencial transformador de um direito constitucional comprometido com a igualdade de gênero. Entretanto, a verdadeira mudança depende de um esforço coletivo e contínuo para enfrentar os desafios históricos e culturais que ainda sustentam a desigualdade no Brasil.

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Bruna Secreto Rocha de Sousa

VIP Bruna Secreto Rocha de Sousa

Advogada. Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Católica de Brasília. Pós-graduada em Direito Público pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI).

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