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Contratação de empregados via MEI: Riscos, prejuízos e a forma correta de contratar

A contratação via MEI oferece flexibilidade e economia, mas exige cautela para evitar vínculo empregatício e passivos trabalhistas. É essencial seguir diretrizes e ter assessoria jurídica.

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Atualizado às 09:01

A contratação de profissionais via MEI - Microempreendedor Individual se tornou uma estratégia comum entre empresas que buscam maior flexibilidade e menor custo na relação com colaboradores. Contudo, a contratação via MEI exige cuidados rigorosos para evitar a configuração de vínculo empregatício e passivos trabalhistas. A seguir, abordamos como essa modalidade de contratação deve ser conduzida, os riscos envolvidos e os benefícios de contar com assessoria jurídica.

1. O que é a contratação via MEI?

O MEI foi criado como um modelo simplificado para que autônomos e pequenos empresários possam formalizar suas atividades, permitindo que contribuam para o INSS e emitam notas fiscais. Empresas podem contratar um profissional MEI para prestação de serviços específicos, desde que a relação não se configure como um vínculo de emprego.

No entanto, o MEI não foi pensado para contratos de trabalho dependentes e duradouros, mas sim para serviços pontuais, onde o profissional trabalha de forma autônoma. Essa é a chave para diferenciar uma contratação de um vínculo trabalhista.

2. Pode uma empresa contratar empregados via MEI?

Empregados, não. Profissional autônomo, talvez. A empresa pode contratar um profissional via MEI, desde que essa relação respeite determinados limites legais. O MEI deve trabalhar com autonomia e liberdade na execução de suas funções, sem subordinação ou exclusividade com a empresa contratante.

A legislação trabalhista brasileira é rigorosa quanto à caracterização de vínculo empregatício. Para que uma relação de trabalho seja considerada de emprego, quatro elementos devem estar presentes:

  • Subordinação: O trabalhador é subordinado e deve responder a ordens do empregador.
  • Pessoalidade: O trabalho é feito exclusivamente pelo mesmo trabalhador.
  • Habitualidade: O trabalhador exerce atividades de forma contínua.
  • Onerosidade: Há uma contrapartida financeira fixa.

Ao contratar um MEI, a empresa não deve exigir o cumprimento de horários rígidos, exclusividade, nem subordinação direta, pois isso configura vínculo empregatício. Logo, ao tratar o profissional "autônomo" da mesma maneira que os empregados comuns, este também será considerado um empregado independentemente de haver um CNPJ, um contrato de prestação de serviços ou qualquer outro documento. O que importa são as condições de trabalho.

3. O que a empresa pode exigir do contratado?

Uma das dúvidas mais frequentes é até que ponto a empresa pode direcionar o trabalho do MEI. Para evitar problemas, a empresa deve focar em resultados e não no processo de trabalho. Abaixo estão algumas práticas recomendadas:

  • Definição de prazos e metas: É possível estabelecer prazos e metas específicas para que o contratado entregue o serviço.
  • Contratação para serviços pontuais ou sazonais: O MEI é indicado para atividades temporárias, de curta duração ou que exijam uma habilidade específica.
  • Permissão para que o MEI atenda outros clientes: Evitar qualquer exclusividade é essencial para não caracterizar um vínculo direto.

Com essas diretrizes, a empresa pode se resguardar e garantir que a contratação seja feita da forma correta e que o MEI mantenha sua independência.

4. Riscos e prejuízos da contratação indevida via MEI

A contratação indevida via MEI, conhecida como "pejotização" traz diversos riscos tanto para a empresa quanto para o contratado. Abaixo, listamos os principais riscos e prejuízos para ambas as partes:

4.1. Reconhecimento de vínculo empregatício

Um dos riscos mais graves para a empresa é a possibilidade de reconhecimento judicial do vínculo empregatício. Se a Justiça do Trabalho considerar que houve subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade, o vínculo será caracterizado como emprego, e a empresa poderá ser condenada a pagar.

  • FGTS retroativo com multa de 40% sobre o saldo.
  • Férias e 13º salário proporcionais aos anos de trabalho.
  • Multas rescisórias e encargos previdenciários.

4.2. Processos trabalhistas

No Brasil, a pejotização indevida é uma das causas de processos trabalhistas que mais cresceram nos últimos anos. Segundo o TST, o número de ações envolvendo contratação via MEI tem aumentado cerca de 15% ao ano, refletindo uma busca crescente dos trabalhadores pela regularização dos direitos.

4.3. Exemplo estimado de prejuízo

Aqui podemos analisar uma estimativa de valores para entender a dimensão dos prejuízos que a empresa pode enfrentar caso a Justiça reconheça o vínculo empregatício de um prestador de serviços contratado via MEI.

Em média, o custo dos encargos trabalhistas para a empresa em uma contratação formal gira em torno de 70% a 80% do valor do salário pago, o que inclui o 13º salário, férias com adicional de 1/3 (podem inclusive ser dobradas, aumentando em muito o prejuízo neste caso), recolhimento de todo o FGTS, multa de 40% sobre o FGTS, contribuições previdenciárias e encargos sociais, indenizações e multas rescisórias.

Exemplo de estimativa de prejuízo

Suponha que a empresa tenha contratado um MEI com pagamento de R$ 3.000,00 mensais e que esse prestador tenha trabalhado por 2 anos (24 meses).

  • 13º salário: R$ 3.000,00 x 2 anos = R$ 6.000,00
  • Férias com 1/3 adicional: R$ 3.000,00 x 1,33 (adicional) x 2 anos = R$ 7.980,00
  • FGTS: Supondo que o FGTS seja 8% do salário ao mês, seria 0,08 x R$ 3.000,00 x 24 meses = R$ 5.760,00
  • Multa de 40% sobre FGTS: A multa de 40% sobre o saldo FGTS de R$ 5.760,00 seria R$ 2.304,00.
  • Contribuições previdenciárias: Aproximadamente 20% sobre a folha de pagamento total, o que representaria R$ 14.400,00 para o período de dois anos.

Totalizando esses valores:

  • R$ 6.000,00 (13º salário)
  • R$ 7.980,00 (férias + 1/3)
  • R$ 5.760,00 (saldo FGTS)
  • R$ 2.304,00 (multa do FGTS)
  • R$ 14.400,00 (contribuições previdenciárias)

Prejuízo estimado total: R$ 36.444,00

Caso o vínculo seja reconhecido judicialmente, incidirá a multa do art. 477 da CLT no valor de mais um salário do empregado, chegando a R$ 39.444,00, mais os honorários advocatícios de 5% a 15% do valor da causa.

Isso sem considerar possíveis indenizações por danos morais ou valores adicionais, reflexos em horas extras, adicionais de periculosidade/insalubridade, doenças ocupacionais, multa do Ministério do Trabalho caso a Justiça entenda que houve fraude trabalhista.

Esse valor é apenas uma estimativa, mas serve para ilustrar que o reconhecimento de vínculo pode acarretar um prejuízo significativo, especialmente se o período trabalhado for longo e os salários pagos forem elevados.

4.4. Penalidades fiscais e previdenciárias

Além dos prejuízos trabalhistas, há também o risco de penalidades fiscais. O não recolhimento de encargos previdenciários e o não pagamento do INSS sobre a folha de pagamento podem resultar em multas e juros altos para a empresa.

5. Estatísticas

Estatísticas mostram que cerca de 30% dos MEIs no Brasil atuam exclusivamente para um único cliente, o que levanta suspeitas sobre a prática de "pejotização". Estima-se que entre 2019 e 2023, a Justiça do Trabalho recebeu cerca de 780 mil casos com pedidos de reconhecimento de vínculo empregatício ligados à pejotização e outras práticas associadas, demonstrando o impacto da prática no judiciário trabalhista.

Pesquisa indica que 64% de reclamações trabalhistas confirmaram relações de terceirização, segundo as decisões monocráticas de mérito proferidas pelos ministros do STF entre 1/1 e 20/8/23.

Além disso, em 2023, o TST consolidou entendimentos para dificultar o uso da pejotização fraudulenta, intensificando o volume de decisões em primeira instância. A tendência é que essa questão continue gerando discussões jurídicas e influencie cada vez mais os procedimentos de contratação, dado o alto número de processos e a necessidade de segurança jurídica para as empresas.

6. Situações viáveis para contratação de MEI

Para que a contratação de um MEI seja vantajosa e segura para ambas as partes, é fundamental que a atividade contratada se encaixe nas seguintes situações:

  • Projetos específicos ou pontuais: Quando a empresa precisa de um profissional para realizar um serviço com início e fim delimitados, como a elaboração de um relatório ou consultoria específica.
  • Atividades que demandem expertise pontual: Se a empresa necessita de um especialista para realizar uma tarefa técnica, um MEI pode ser contratado sem que se configure vínculo empregatício.
  • Serviços independentes e sem subordinação: Por exemplo, a contratação de um profissional para tarefas de marketing ou design, onde o resultado final é o foco e o controle da execução é mantido pelo MEI.

Essas situações são mais seguras e reduzem a possibilidade de um processo judicial de reconhecimento de vínculo.

Exemplo de contratação viável como MEI

Profissional: Desenvolvedor freelancer.

Atividade: Desenvolvimento de um aplicativo ou site para um projeto específico.

Por que é viável: Neste caso, o desenvolvedor é contratado para entregar um produto final (aplicativo ou site) e tem liberdade para definir como e quando trabalhar. O contrato pode estabelecer prazos e metas, mas sem controle de horário ou exigência de presença física. Além disso, o desenvolvedor pode prestar serviços para outros clientes, não existindo exclusividade. Essa relação não configura vínculo empregatício, pois não há subordinação nem habitualidade no sentido de trabalho contínuo e diário.

Exemplo de contratação indevida como MEI

Profissional: Atendente de recepção.

Atividade: Atendimento ao público e suporte a clientes em horário fixo de trabalho, todos os dias úteis, na recepção da empresa.

Por que não é viável: Nesse caso, o atendente trabalha diariamente, em horário fixo, na sede da empresa, atendendo diretamente aos clientes da contratante. Há subordinação (recebendo ordens diretas), pessoalidade (só ele pode fazer a função), habitualidade (trabalha diariamente) e onerosidade (remuneração mensal fixa). Esse arranjo preenche os requisitos de vínculo empregatício, e contratá-lo como MEI seria considerado uma fraude, com alto risco de reconhecimento do vínculo trabalhista em eventual ação judicial.

7. Importância de uma assessoria jurídica

Ao considerar a contratação de MEI, é altamente recomendável que a empresa conte com uma assessoria jurídica especializada em Direito Trabalhista. Com o suporte de um advogado trabalhista, é possível revisar os contratos de prestação de serviços, definir corretamente as responsabilidades do MEI e evitar a caracterização de vínculo empregatício.

Além disso, uma assessoria jurídica permite que a empresa acompanhe eventuais mudanças na legislação trabalhista e previdenciária, evitando passivos futuros e garantindo maior segurança jurídica em todas as relações de trabalho.

Conclusão

A contratação de MEI pode ser uma opção vantajosa para empresas e trabalhadores, desde que realizada de forma correta e respeitando as diretrizes legais. Atuar com responsabilidade, buscando sempre a transparência e autonomia do prestador de serviços, é essencial para evitar problemas trabalhistas. Com o apoio de uma assessoria jurídica, é possível formalizar contratos adequados e alinhados com as necessidades do mercado e com as exigências legais, prevenindo riscos e promovendo uma relação de trabalho justa e segura.

Iago Leonardi

Iago Leonardi

Advogado Trabalhista Empresarial, especialista na redução de custos e riscos às empresas. Coordenador da Comissão de Empreendedorismo da OAB/SP. Membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/SP.

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