Nova guerra fiscal? Impactos do novo convênio 109 do confaz sobre ICMS
O novo convênio ICMS 109 representa uma mudança significativa na gestão de créditos de ICMS, oferecendo às empresas maior flexibilidade, mas também impondo desafios estratégicos e legais.
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
Atualizado às 10:37
Nova guerra fiscal? Impactos do novo convênio 109 do Confaz sobre ICMS.
O novo convênio ICMS 109 representa uma mudança significativa na gestão de créditos de ICMS, oferecendo às empresas maior flexibilidade, mas também impondo desafios estratégicos e legais.
O cenário tributário brasileiro, especialmente no que diz respeito ao Imposto sobre ICMS - Circulação de Mercadorias e Serviços, é frequentemente caracterizado por uma complexidade que desafia tanto empresas quanto investidores.
As recentes alterações introduzidas pelo convênio ICMS 109 do Confaz - Conselho Nacional de Política Fazendária representam uma mudança significativa na forma como os créditos de ICMS são geridos entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte.
Este artigo busca explorar as nuances dessa nova regulamentação, destacando suas implicações para o planejamento tributário das empresas e o potencial de reacender a guerra fiscal entre os estados.
Contexto legal e mudanças recentes
A decisão do STF na ADC - Ação Declaratória de Constitucionalidade 49 foi um marco na regulamentação do ICMS, determinando que não se poderia mais cobrar o imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo titular.
Após ampla discussão sobre a obrigatoriedade acerca da transferência dos créditos de ICMS atinentes, chegamos à revogação do convênio ICMS 178/23 e à introdução do convênio 109, que agora torna opcional a transferência de créditos de ICMS.
Essa mudança, embora ofereça maior flexibilidade às empresas, também introduz novas complexidades que precisam ser cuidadosamente consideradas.
Principais alterações do convênio ICMS 109/24
O convênio ICMS 109/24 traz mudanças significativas nas regras de transferência de créditos de ICMS. Anteriormente, a transferência era obrigatória, mas agora as empresas têm a opção de decidir se desejam ou não transferir os créditos para o estado de destino das mercadorias. Essa alteração visa corrigir distorções criadas pelo convênio anterior e se alinha à decisão do STF na ADC 49.
Uma das principais mudanças é a flexibilização das regras, permitindo que as empresas escolham entre duas opções estratégicas: transferir os créditos de ICMS ou tratar a operação como tributada. Essa escolha deve ser informada aos governos estaduais até o final de novembro de cada ano, e a empresa deve manter a escolha por um ano em todos os seus estabelecimentos.
A segunda opção pode ser especialmente atraente para empresas que buscam preservar benefícios fiscais oferecidos por estados de origem. Ao optar por tratar a operação como tributada, a empresa pode evitar a invalidação de benefícios fiscais, uma preocupação comum entre os contribuintes.
Para empreendedores, a escolha entre essas opções deve ser baseada em uma análise detalhada das implicações fiscais e das condições oferecidas pelos estados. É essencial considerar não apenas os benefícios fiscais imediatos, mas também o impacto a longo prazo sobre o fluxo de caixa e a competitividade da empresa.
Opções de planejamento tributário
1. Transferência de créditos de ICMS
Optar por transferir os créditos de ICMS para o estado de destino das mercadorias pode ser vantajoso em situações onde o estado de destino oferece condições fiscais mais favoráveis. Essa estratégia permite que as empresas aproveitem ao máximo os créditos acumulados, reduzindo a carga tributária e melhorando o fluxo de caixa. No entanto, é importante considerar as alíquotas interestaduais e internas, pois a diferença entre elas determinará o montante de crédito que pode ser efetivamente utilizado.
2. Tratamento da operação como tributada
A segunda opção é tratar a operação como tributada, o que pode ser benéfico para empresas que desejam preservar benefícios fiscais oferecidos pelo estado de origem. Ao optar por essa abordagem, a empresa pode evitar a invalidação de benefícios fiscais, uma preocupação comum entre os contribuintes que operam em múltiplos estados. Essa estratégia também pode ser útil em casos onde a transferência de créditos não é vantajosa devido a políticas fiscais estaduais desfavoráveis.
Implicações fiscais e estratégicas
A possibilidade de não transferir os créditos de ICMS e mantê-los no estado de origem é uma opção que, à primeira vista, parece vantajosa. No entanto, o parágrafo único da cláusula primeira do novo convênio limita o uso integral desses créditos, assegurando apenas a diferença entre o crédito de ICMS apurado na operação e a alíquota interestadual.
Por exemplo, em uma operação com alíquota interna de 18% e interestadual de 12%, o contribuinte teria direito apenas a 6% de crédito. Essa limitação pode tornar alguns estados mais atrativos ao oferecerem condições mais favoráveis, potencialmente reacendendo a guerra fiscal.
Desafios e controvérsias
Apesar de o novo convênio alinhar-se à decisão do STF e à complementar 204/23, ele apresenta desafios significativos.
A exigência de que as empresas escolham uma das duas sistemáticas e mantenham essa escolha por um ano em todos os estabelecimentos é vista como uma imposição excessiva. Além disso, a norma introduz diferentes bases de cálculo para a operação, como o valor médio da entrada da mercadoria, o custo da mercadoria produzida e o custo da produção em geral. Isso poderia ser considerado uma abordagem extrapola o poder regulamentar do Confaz e pode criar incertezas judiciais adicionais para as empresas.
Um exemplo prático desse desafio é a desconsideração da mão de obra nas bases de cálculo, o que pode impactar significativamente o custo do produto. Essa exclusão é vista por muitos como uma falha na regulamentação, pois a mão de obra é um componente essencial do custo de produção. A falta de clareza sobre como esses cálculos devem ser realizados pode levar a discrepâncias significativas nos créditos de ICMS apurados, exigindo que as empresas revisem constantemente suas estratégias fiscais.
Análise crítica
De qualquer maneira, fica o alerta que o novo convênio pode abrir brechas para novas disputas fiscais, dependendo de como os estados internalizem e regulamentem essas mudanças.
A possibilidade de oferecer créditos maiores em transferências pode criar um ambiente competitivo entre os estados, afetando a arrecadação e a estratégia das empresas. Essa dinâmica pode resultar em uma corrida fiscal, onde estados competem para oferecer os incentivos fiscais mais atraentes, potencialmente comprometendo suas bases de arrecadação.
Além disso, a exigência de que as empresas escolham uma das duas sistemáticas e apliquem essa escolha uniformemente em todos os seus estabelecimentos pode limitar a flexibilidade das empresas em adaptar suas estratégias fiscais às condições específicas de cada estado. Essa restrição pode ser particularmente desafiadora para grandes conglomerados com operações em múltiplos estados, que precisam equilibrar as diferenças regionais em suas estratégias fiscais.
Conclusão
O novo convênio ICMS 109 representa uma mudança significativa na gestão de créditos de ICMS, oferecendo às empresas maior flexibilidade, mas também impondo desafios estratégicos e legais.
Para empreendedores, é crucial compreender essas mudanças e avaliar cuidadosamente as opções disponíveis para otimizar o planejamento tributário e evitar riscos de guerra fiscal. A escolha entre transferir ou não os créditos deve ser baseada em uma análise detalhada das implicações fiscais e das condições oferecidas pelos estados, garantindo que a estratégia adotada alinhe-se aos objetivos financeiros e operacionais da empresa.
Além disso, as empresas devem estar preparadas para adaptar suas estratégias fiscais em resposta a mudanças futuras na regulamentação do ICMS. Isso pode incluir o monitoramento contínuo das políticas fiscais estaduais, a avaliação das oportunidades de planejamento tributário e a consulta regular com especialistas em tributação para garantir a conformidade e a otimização fiscal.
Em última análise, tudo dependerá da capacidade das empresas de equilibrar a flexibilidade oferecida pelas novas regulamentações com a necessidade de manter uma estratégia fiscal robusta e sustentável. Ao fazê-lo, as empresas podem não apenas mitigar os riscos associados à guerra fiscal, mas também posicionar-se para aproveitar ao máximo as oportunidades de crescimento e investimento no mercado brasileiro.