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A polícia prende, o judiciário solta

A frase acima, repetida nesses mesmos termos por alguns fundamentalistas do arbítrio policial ou insinuada em notícia ou comentário crítico acerca de decisões do Poder Judiciário, revela ignorância ou má-fé.

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Atualizado em 10 de julho de 2007 11:23


A polícia prende, o judiciário solta

René Ariel Dotti*

A frase acima, repetida nesses mesmos termos por alguns fundamentalistas do arbítrio policial ou insinuada em notícia ou comentário crítico acerca de decisões do Poder Judiciário, revela ignorância ou má-fé. O sistema de processo penal vigente no Estado Democrático de Direito é iluminado por princípios essenciais para proporcionar validade e eficácia de suas normas. Um desses princípios está declarado no inciso LIV, do art. 5º da Constituição Federal (clique aqui): "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal".

Passados 150 (cento e cinqüenta) anos da publicação dos clássicos Apontamentos sobre o processo criminal brasileiro, continuam vivas as palavras que o espírito e o talento de Pimenta Bueno modelou na lição de resistência contra o arbítrio:

"Os termos e condições que a lei prescreve, são meios protectores que garantem a execução imparcial da lei, a liberdade e plenitude da accusação e da defesa: são pharóes que assignalão a linha e norte que os magistrados e as partes devem seguir, precauções salutares que encadeão o arbitrio e os abusos, que esclarecem a verdade, e dão authenticidade ou valor legal aos actos" (Empreza Nacional do Diario, RJ, 1857, p.59, 60).

E, mais incisivamente, arremata o Mestre imortal: "É pois conseqüente annular-se o processo, desde que são preteridas as suas formulas substanciaes, ou as cominações expressas da lei, porquanto o que se pratica contra seus preceitos nada vale: seria contradictorio estabele­cel-as com esse caracter, e deixar violal-as impunemente" (Ob.cit., p. 60).

Sempre que houver ilegalidade ou abuso em qualquer tipo de prisão impõe-se ao magistrado a obrigação de decretar a nulidade e expedir alvará de soltura se não houver outro motivo legal para a custódia. Deverá fazê-lo ex-officio, ao receber a cópia do auto, ou atendendo petição simples de relaxamento ou da ação de habeas corpus e "imediatamente", como exige o inciso LXV da lei fundamental. É preciso ressaltar as hipóteses em que a complexidade do ato policial exigir exame mais detalhado ou quando a burocracia forense impedir ou dificultar o conhecimento dos autos com a urgência exigida.

O Juiz não pode tolerar a ilegalidade ou o abuso de que conheça, em qualquer modalidade de prisão (flagrante, temporária, preventiva, de pronúncia ou decorrente de sentença condenatória) sob pena de cometer ilícito administrativo, civil e criminal. Com efeito, nos termos do art. 4º, alínea d da Lei nº 4.898/65 (clique aqui), "constitui também abuso de autoridade deixar o juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção ilegal que lhe seja comunicada". Em outras palavras: a pretexto de "salvar" o ato processual não é lícito manter o erro e o abuso.

E a frase do título desta crônica deve ser complementada: "A polícia prende e o juiz solta, cumprindo a Constituição e a sua consciência funcional".


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*Advogado do Escritório Professor René Dotti

 

 

 

 

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