O processo de transição governamental
A transição de governo é essencial para garantir continuidade administrativa e transparência na troca de mandatos, regida pela lei de responsabilidade fiscal e normativas dos Tribunais de Contas.
segunda-feira, 7 de outubro de 2024
Atualizado às 11:05
Com o término do processo eleitoral e a proclamação oficial dos resultados pelo TSE, inicia-se formalmente o período de transição de governo, um momento de extrema importância dentro da administração pública brasileira. Esse período é orientado por um conjunto de diretrizes normativas e dispositivos legais que visam assegurar a continuidade dos serviços públicos e garantir que a transferência de responsabilidades entre a gestão atual e o novo governo ocorra de forma organizada, transparente e em conformidade com os princípios constitucionais. Em âmbito federal, por exemplo, a lei 10.609/02 e o decreto 7.221/10 disciplinam a estruturação da equipe de transição para a presidência da república, especificando a metodologia para acesso às informações estratégicas e operacionais necessárias ao planejamento do novo governo. Nos estados e municípios, essas diretrizes podem ser complementadas por legislações locais, decretos e resoluções, que estabelecem parâmetros específicos para cada esfera de governo.
Independentemente de se tratar de um governo novo ou de um mandato reeleito, a transição governamental é essencialmente um procedimento técnico-administrativo, que se fundamenta no princípio da continuidade do serviço público. Seu principal objetivo é garantir que a nova administração tenha pleno conhecimento das condições financeiras, patrimoniais e de pessoal do ente público, facilitando assim a definição de políticas e a execução de metas com base em dados concretos e atualizados. Para tanto, a lei de responsabilidade fiscal (LRF - lei complementar 101/00) impõe ao gestor a obrigação de assegurar que todas as informações sejam fornecidas de maneira completa e precisa, visando à transparência na condução do erário e à responsabilização pela correta utilização dos recursos públicos.
A constituição formal da equipe de transição deve ser realizada por meio de ato administrativo específico, publicado no "Diário Oficial", indicando os membros e suas respectivas funções dentro do processo. Geralmente, essa equipe é composta por representantes da gestão em exercício e por integrantes indicados pelo novo governo, assegurando assim um equilíbrio de competências técnicas e administrativas. Cabe ao gestor atual disponibilizar todas as informações solicitadas, sob pena de violar os princípios da publicidade e da transparência, conforme disposto no art. 11 da lei 8.429/92 (lei de improbidade administrativa).
No decorrer do processo de transição, a equipe pode ser subdividida em áreas temáticas, tais como finanças, orçamento, gestão de pessoal, infraestrutura e convênios. Cada subgrupo deve se dedicar à coleta de dados e à elaboração de relatórios setoriais, que serão posteriormente consolidados em um dossiê único. Esse documento é fundamental para uma análise crítica da situação do ente público, destacando os pontos de atenção e os riscos identificados, assim como as providências urgentes a serem tomadas pela nova administração para evitar descontinuidades nos serviços prestados.
O acesso a essas informações deve ser formalizado por meio de solicitações documentadas, com protocolo específico, garantindo assim a rastreabilidade e a transparência no fluxo de dados. O processo está amparado no princípio da publicidade (art. 37, caput, da CF/88) e na lei de acesso à informação (lei 12.527/11), que confere a qualquer cidadão o direito de obter informações de interesse público, reforçando a obrigatoriedade de compartilhamento de dados relevantes entre a gestão cessante e a nova administração.
Esse procedimento se reveste de especial importância quando se trata de um governo reeleito. Embora o gestor continue no cargo, a transição representa uma oportunidade para reavaliar projetos, metas e resultados, identificando áreas que necessitam de ajustes para a continuidade eficiente das políticas públicas. A formalização desse processo, mesmo para governos reeleitos, deve ser documentada, assegurando a transparência na prestação de contas e evidenciando o compromisso com a boa governança pública.
A instrumentalização do processo de transição é essencial para assegurar a integridade das informações e criar um histórico documental que poderá servir de base para auditorias futuras ou eventuais litígios. Relatórios gerenciais e atas de reuniões formalizam a entrega e o recebimento dos documentos, conferindo respaldo jurídico e técnico a todo o procedimento. A adoção de tais práticas reforça os princípios da accountability e do controle interno, evitando problemas de conformidade e garantindo que a nova gestão inicie suas atividades com total clareza acerca das condições do ente público.
Em conclusão, a transição de governo, quando conduzida com rigor técnico e observando-se as boas práticas de governança, contribui para o fortalecimento das instituições e para a manutenção de um ambiente administrativo orientado por resultados. Seja para um novo governo ou para a recondução de um gestor reeleito, a transição bem executada assegura que o planejamento estratégico da nova administração possa ser implementado de maneira eficiente, com foco na continuidade dos serviços e no respeito à legislação vigente. Ao assegurar a conformidade com as exigências legais e normativas, o processo de transição reafirma a responsabilidade dos gestores e a transparência na administração dos recursos públicos, pilares fundamentais para a construção de um governo que atenda às expectativas da sociedade e cumpra suas obrigações constitucionais com excelência e ética.