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A presença de fundamentação genérica, sem a subsunção da conduta perpetrada à norma sancionadora viola o dever de motivação

O artigo discute a importância da fundamentação adequada nas sanções do Procon às instituições financeiras, ressaltando que decisões genéricas ferem princípios da Administração Pública.

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Atualizado em 10 de outubro de 2024 07:23

Quando tratamos das sanções pecuniárias impostas pelo Procon às Instituições Financeiras em razão de supostas infrações ao Código de Defesa do Consumidor (CDC), é imperativo que se observe os princípios fundamentais da Administração Pública, a fim de garantir o controle de legalidade e evitar a emissão de decisões com caráter arbitrário ou confiscatório.

A Administração Pública, conforme o disposto no caput do artigo 2º da Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo, está vinculada a tais preceitos. Dentre os mais relevantes, destacam-se:

a)O princípio da motivação e da finalidade do ato administrativo;

b)O princípio da legalidade;

c)Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Esses princípios asseguram a aplicação correta das sanções legais, dentro dos limites de responsabilidade do agente infrator, não podendo excedê-los, sob pena de causar danos irreparáveis aos direitos fundamentais da pessoa, especialmente no que concerne à honra objetiva e subjetiva.

A imposição de sanções desproporcionais ou apressadas compromete a confiança pública no sancionado, afetando suas relações sociais e, em muitos casos, inviabilizando o regular exercício de suas atividades.

Como bem apontam Claudia Lima Marques, Antônio Herman V. Benjamin e Bruno Miragem, as sanções pecuniárias consistem na aplicação de multas ao infrator das normas de proteção ao consumidor, cuja graduação está definida no artigo 57 do CDC. Essas sanções possuem dupla função: reparar o dano decorrente da infração e inibir ou desencorajar a repetição da conduta infracional.

Na prática, observa-se que muitas decisões proferidas pelos Órgãos Fiscalizadores se revelam genéricas, desconsiderando o conjunto probatório trazido pelos fornecedores em sede de defesa administrativa, limitando-se a uma fundamentação superficial baseada em um enquadramento legal genérico para a aplicação de multas.

Ressalta-se ainda que ao Poder Judiciário é vedado adentrar o mérito administrativo, avaliando a conveniência e oportunidade dos atos da Administração - entendimento este que, até o momento, orienta as decisões judiciais. Contudo, frequentemente, nos deparamos com decisões que, de maneira quase automática, negam provimento às demandas sob o argumento de que o mérito do ato administrativo não pode ser revisado, sem uma análise aprofundada dos fundamentos apresentados.

Assim, conclui-se que, embora o controle judicial não deva invadir o mérito dos atos administrativos, é imprescindível a atuação do Judiciário, quando devidamente provocado, para:

a)Verificar a regularidade do processo sancionador;

b)Assegurar a legalidade do procedimento;

c)Evitar a perpetuação de decisões arbitrárias.

Nessa toada que se orienta a Súmula n.º 665 do STJ:

 "O controle jurisdicional do processo administrativo disciplinar restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato, à luz dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvadas as hipóteses de flagrante ilegalidade, teratologia ou manifesta desproporcionalidade da sanção aplicada"

Vejamos uma decisão nesse sentido:

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA GABINETE DESª. AGAMENILDE DIAS ARRUDA VIEIRA DANTAS ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0801961-69.2023.8.15.0251 RELATORA: DESEMBARGADORA AGAMENILDE DIAS ARRUDA VIEIRA DANTAS APELANTE: MUNICÍPIO DE PATOS, POR SEU PROCURADOR APELADO: BANCO DO BRASIL ADVOGADO: FELYPE BEZERRA DE AGUIAR BARBOSA OAB/PB 19.148-A EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA. MULTA IMPOSTA PELO PROCON MUNICIPAL. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. IRRESIGNAÇÃO RECURSAL. IRRELEVÂNCIA DAS ALEGAÇÕES. SANÇÃO ADMINISTRATIVA APLICADA SEM MOTIVAÇÃO. FUNDAMENTOS GENÉRICOS. POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. ACERTO DA SENTENÇA RECORRIDA. DESPROVIMENTO. A Decisão administrativa do PROCON Municipal se mostrou demasiadamente genérica e abstrata. Em nenhum momento explanou os reais motivos e provas que justificassem o julgamento da subsistência da Reclamação com a aplicação da multa. Existe sim, na fundamentação, um amplo relato sobre a atribuição do PROCON e da presumida hipossuficiência do consumidor, deixando de analisar a tese defensiva apresentada pela Reclamada. A doutrina e a jurisprudência atuais permitem que o Poder Judiciário analise os fundamentos dos atos administrativos discricionários, a fim de averiguar não só a legalidade, mas também eventual violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

(TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 08019616920238150251, Relator: Desa. Agamenilde Dias Arruda Vieira Dantas, 2ª Câmara Cível)

Em conclusão, a imposição de sanções pecuniárias pelo Procon às instituições financeiras deve ser pautada pelo respeito aos princípios basilares da Administração Pública, garantindo, assim, a observância da motivação, legalidade, razoabilidade e proporcionalidade. A prolação de decisões administrativas desprovidas de fundamentação adequada não apenas compromete a confiança nas instituições, mas também pode acarretar a violação de direitos fundamentais.

Portanto, é imprescindível a atuação do Poder Judiciário, quando devidamente provocado, para assegurar a regularidade e a legalidade dos procedimentos sancionadores, evitando a perpetuação de arbitrariedades e promovendo um sistema de proteção ao consumidor que atue de maneira equânime e justa.

Rafael Padela

VIP Rafael Padela

Advogado especialista e atuante no Direito Bancário, contencioso estratégico e cível, membro da comissão de Direito Bancário da OAB/PE.

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