A necessidade de cláusulas de proteção de dados em contratos na era da inteligência artificial
A revisão de contratos e inserção de novas cláusulas são atitudes essenciais para alinhar o uso de IA à LGPD, assegurando privacidade e evitando riscos legais.
terça-feira, 24 de setembro de 2024
Atualizado em 27 de setembro de 2024 10:46
Desde o lançamento do Chat GPT - chatbot de inteligência artificial generativa da OpenAI - em novembro de 2022, o uso de modelos similares a este aumentou consideravelmente. Após o lançamento da ferramenta, outros gigantes do mundo tecnológico dispararam para acompanhar o mercado. O Google lança o "Bard", em fevereiro de 2023 e, logo no dia seguinte, a Microsoft anuncia um modelo parecido, chamado Bing AI.
Os noticiários estão carregados de notícias sobre o tema e começam a surgir cursos sobre como melhor utilizar as ferramentas que usam IAs. No mundo corporativo, muitas empresas começam a utilizar tais modelos para aumentar a eficiência das suas operações. A inteligência artificial começa a estar cada vez mais presente no nosso dia a dia, e a tendência é que essa presença só aumente.
Um estudo realizado pela Deloitte, publicado pelo jornal O Globo1, em julho de 2024, constatou que 58% das empresas brasileiras já fazem o uso de inteligências artificiais no seu cotidiano. Além disso, dessas empresas, 79% pretendem aprofundar seus conhecimentos e estender as IAs para outras áreas.
Além desses números expressivos, é preciso entender onde as empresas estão aplicando os modelos de machine learning e como estão utilizando as Inteligências Artificiais.
O mesmo estudo, feito pela Deloitte, aponta que o maior uso de IAs é feito na rotina administrativa e no atendimento ao cliente, correspondendo a 44% e 39% dos usos, respectivamente. Portanto, é evidente que as empresas, ao utilizar essas ferramentas em seu dia a dia, muitas vezes inserem e operam dados pessoais de clientes, parceiros e fornecedores.
Contudo, é importante considerar que esses modelos de IA generativa armazenam constantemente os dados ali inseridos, além de utilizá-los para auto aprimoramento. E isso pode ser problemático quando as organizações, na utilização cotidiana, inserem dados pessoais de terceiros, sejam clientes, fornecedores ou parceiros.
Utilizar a inteligência artificial inserindo dados da minha empresa é totalmente diferente de utilizar IAs operando dados de terceiros que nunca anuíram com o compartilhamento de seus dados.
Nesse sentido, é preciso lembrar que a Lei Geral de Proteção de Dados - Lei 13.709 de 2018 - considera, como dado pessoal, toda e qualquer informação relacionada à pessoa natural identificada ou identificável. Além disso, define-se, como tratamento, toda operação realizada com dados pessoais, como as que se referem à coleta, produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação, transferência, difusão ou extração2.
Pois bem, é necessário, então, considerar que, mesmo que de forma não intencional, empresas podem estar compartilhando e tratando dados pessoais de terceiros.
Assim, de modo a se alinhar com os princípios norteadores da legislação de proteção de dados, quais sejam, transparência, finalidade, adequação, entre outros, uma simples revisão e atualização das políticas de privacidade e termos de uso pode inserir cláusulas específicas sobre o uso de dados pessoais em ferramentas de IA.
Deste modo, ao deixar explícito ao titular dos dados que esses poderão ser manipulados por meio de inteligências artificiais e obter o consentimento do titular, fortalece-se a transparência entre o controlador e o titular.
A inserção de tais cláusulas pode garantir a conformidade com a lei brasileira de proteção de dados e evitar os riscos da desconformidade. Ademais, vale destacar que, ao conferir maior transparência, não só podem ser mitigados os riscos legais, como também é aumentada a confiança entre clientes e colaboradores.
Defronte tal situação, deve-se encorajar a adaptação de contratos e políticas à uma nova realidade tecnológica que está se estruturando bem diante de nossos olhos. Ao passo que são inseridas cláusulas sobre a possibilidade de uso de IAs, inclusive com tratamento de dados pessoais, busca-se acompanhar o avanço tecnológico e a modernização das relações.
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1 QUASE 60% das grandes empresas no Brasil já usam inteligência artificial nos negócios. O Globo, 2024. Disponível em: https://oglobo.globo.com/blogs/capital/post/2024/06/quase-60percent-das-grandes-empresas-no-brasil-ja-usam-inteligencia-artificial-nos-negocios.ghtml. Acesso em: 15 set. 2024.
2 Art. 5º Para os fins desta Lei, considera-se:
I - dado pessoal: informação relacionada a pessoa natural identificada ou identificável;
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X - tratamento: toda operação realizada com dados pessoais, como as que se referem a coleta, produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação, transferência, difusão ou extração;