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O direito de retirada do sócio e o impacto no caixa da Sociedade

Ao constituir uma sociedade, é essencial prever questões como o direito de retirada dos sócios, conforme o art. 1029 do Código Civil.

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

Atualizado às 15:59

Ao se constituir uma sociedade, é importante pensar além da sua operação, antevendo questões que podem ocorrer, como por exemplo um desentendimento entre os sócios e/ou direito de retirada dos sócios.

O direito de retirada nada mais é que a possibilidade de qualquer sócio se retirar da sociedade, que em maneira alguma poderá ser vetado, estando previsto no Código Civil, no art. 1029.

Art. 1.029. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.

Tratando-se de sociedade com prazo indeterminado, basta a mera notificação cumprindo o prazo de antecedência de no mínimo 60 dias. Ocorre que, sob a ótica da sociedade, é imprescindível tratar a forma que serão apurados os haveres do sócio retirante.

Os haveres do sócio retirante é o valor que lhe é devido quando este decide sair da sociedade, esse montante corresponde à parte que o sócio possui direito, tendo em vista sua participação no capital social.

Segundo o Código Civil, os haveres serão calculados com base na situação patrimonial da sociedade no momento de saída do sócio, devendo ser pago em até 90 dias.

Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.

§ 2º A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.

O valor patrimonial de uma sociedade é encontrado por meio de um balanço de determinação. O balanço deverá avaliar bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo, que deverá ser apurado da mesma forma.

A depender da participação do sócio retirante, caso o pagamento dos haveres se dê no prazo estipulado pelo Código Civil, este pode ser fator determinante para quebra da empresa, tendo em vista que, o pagamento de uma quantia relevante em um curto espaço de tempo, pode ser extremamente prejudicial ao fluxo de caixa, fazendo com que a sociedade não consiga arcar com seus custos fixos, como folha de pagamento, fornecedores, etc.

Ou seja, uma simples saída de sócio (direito de retirada), caso não seja bem estruturada, pode ser um ponto crucial para a extinção da empresa.

Para garantir segurança à Sociedade, algumas medidas podem ser tomadas, de modo a diminuírem o impacto ao caixa da empresa, como por exemplo:

  • A retirada dos ativos intangíveis no cálculo dos haveres, desse modo, ativos como carteira de clientes, marca, patentes, fundo de comércio e goodwill (ágio) não serão contabilizados no cálculo do valor devido. Ativos como esses podem aumentar significativamente os haveres devidos ao sócio retirante. A retirada dos ativos intangíveis é uma opção devido a dificuldade de contabilização desses;
  • Estender o prazo do pagamento dos haveres, estipulando que seja pago em um maior número de parcelas, dessa forma, agredindo menos o fluxo de caixa da empresa;

Importante mencionar que tais premissas devem estar expressas no contrato social da empresa para que seja válido, sendo aconselhado seu detalhamento em acordo de sócios.

É válido ressaltar que a avaliação por valor patrimonial raramente vai refletir o "valor justo" de uma empresa lucrativa e em situação saudável. Isso acontece pois, ao avaliar uma companhia, deve-se levar em conta sua situação econômica. Pelo menos assim descreve o método de valuation mais aceito e discutido pela literatura mundial: O Fluxo de Caixa Descontado. Este método projeta as expectativas de caixa para os próximos anos e considera parâmetros da economia, como taxa de juros, inflação e câmbio (se aplicável). Em contrapartida, o valor patrimonial é uma métrica estritamente contábil.

Para ilustrar, vamos analisar as empresas que compõem o índice IBOVESPA. Com base no valor de mercado dessas companhias e nos dados contábeis divulgados no 2º trimestre de 2024, calcula-se que o IBOV negocia, em média, a 1.6 vezes o patrimônio líquido (PL). (Fonte: Neologica Comdinheiro; cálculo da média feito pelo autor.)

Para que não haja confusão, é importante compreender cada contexto, suas necessidades e a partir disso buscar o método de avaliação mais vantajoso para a Sociedade. Em situações como captação de investimento, M&A, ou um IPO, o Fluxo de Caixa Descontado é a opção mais aceita (apesar de serem utilizados outros métodos paralelamente, como balizadores).

Entretanto, pela ótica da Sociedade, o valuation por valor patrimonial em muitos dos casos será mais interessante. Utilizando esse método no contexto de direito de retirada, a empresa será capaz de suavizar seu fluxo de caixa e possivelmente pagar um valor menor, tendo em vista que nesse caso, o intuito é desmotivar que haja uma saída da Sociedade, visando a perpetuação das atividades e da relação entre os sócios.

Pedro Mourente

Pedro Mourente

Estudante de Direito da Faculdade de Direito de Vitória (FDV). Estagiário de Direito Societário e Propriedade Intelectual no Mendonça & Machado Advogados.

Felipe Barros

Felipe Barros

Assessor na Ecos Investimentos.

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