A validação trabalhista e tributária da "pejotização" pelo STF
O STF permite a pejotização, ou contratação de trabalhadores como PJ, se legítima e sem burlar leis trabalhistas. Recentemente, decidiu sobre contratos PJ da Rede Globo, refletindo impacto fiscal.
quinta-feira, 5 de setembro de 2024
Atualizado em 4 de setembro de 2024 10:47
Atualmente, o STF vem reconhecendo o entendimento quanto à possibilidade de contratos e vínculos distintos da estrutura tradicional na organização do trabalho, reconhecendo formas alternativas à relação de emprego.
Ou seja, o STF admite a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas ("pejotização") desde que essa prática seja feita de forma legítima e não para burlar a legislação trabalhista. Em outras palavras, a pejotização é permitida quando o trabalhador realmente atua como uma pessoa jurídica independente, com autonomia e sem vínculo de subordinação, habitualidade, pessoalidade e onerosidade típicos de uma relação de emprego.
Inclusive, é importante apontar o entendimento do ministro Luiz Fux no RE 958.252 (Tema 725 da repercussão geral - "Terceirização de serviços para a consecução da atividade-fim da empresa"), segundo o qual é "essencial para o progresso dos trabalhadores brasileiros a liberdade de organização produtiva dos cidadãos, entendida essa como balizamento do poder regulatório para evitar intervenções na dinâmica da economia incompatíveis com os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade".
No entanto, tal reconhecimento e ampliação das diversas estruturas de trabalho possuem efeito secundário em outras áreas, tais como a fiscal.
Nessa esteira, o STF proferiu recente decisão no processo do Fisco que mira contratos PJ da emissora Rede Globo de televisão, com artistas e até jornalistas.
Com suspeita de sonegação de tributos, a ação instaurada pela Receita Federal contesta os contratos no regime de PJ em vez de contratações pela CLT, considerando que o funcionário com carteira assinada e com uma renda superior a R$ 4.664,68 já passa a recolher 27,5% de Imposto de Renda, enquanto a PJ paga entre 4% e 15% de tributos por intermédio de micro e pequenas empresas (Simples Nacional) ou empresas enquadradas no Lucro Presumido.
Em plenário virtual, a 1ª turma do STF, com relatoria do ministro Cristiano Zanin e com respaldo de julgamentos anteriores, julgou inconstitucional a autuação da Receita Federal contra artistas da TV Globo, que foram acusados de suposto esquema de sonegação de impostos por meio de contratos "pejotizados" com a emissora.
A decisão vem para firmar o entendimento do STF e, em interpretação conjunta de precedentes da corte, como o RE 958.252 e a ADPF - Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 324, reconhece a validade de outras formas de relação de trabalho que não a relação de emprego regida pela CLT.
Em fevereiro/24, foi proferida decisão pelo STF, em que o ministro Alexandre de Moraes cassou seis acórdãos de uma das Delegacias de Julgamento da Receita Federal do Brasil em São Paulo (1ª instância de julgamento administrativa) e um acórdão do CARF - Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, todos contrários à Rede Globo e aos artistas de seu elenco.
Recentemente, em 6/8, foi disponibilizado acórdão do CARF (Processo 16539.720001/2020-98/acórdão 1401-006.990), em que foi dado provimento ao recurso voluntário da Rede Globo sob o entendimento de que não foram vislumbrados os "elementos probatórios carreados pela autoridade autuante, relação empregatícia dissimulada ou maquiagem de contratos visando à pejotização que dissimule vínculo empregatício", razão pela qual entendeu-se que a restrição da atividade fiscalizatória à análise documental foi insuficiente à demonstração do elemento subordinação.
Vale destacar que o referido processo foi oriundo de autuação fiscal lavrada para cobrança de multa isolada decorrente da ausência de retenção do Imposto de Renda Pessoa Física exigido com fundamento no inciso I do art. 7º da lei 7.713/88. A penalidade havia sido calculada considerando o montante efetivamente pago às pessoas jurídicas contratadas, reajustando-se a base de cálculo do IR para então se determinar a base de cálculo da multa (art. 725 do RIR/99).
Renata Araujo
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.
Sérgio Grama Lima
Sócio no Leite, Tosto e Barros - Advogados Associados.
Marcela Baccan Bianchin
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.
Caroline Palermo
Advogada no Leite, Tosto e Barros Advogados.