STJ mantém entendimento sobre a inviabilidade de provas digitais
O STJ manteve entendimento sobre a inviabilidade de provas digitais, em procedimentos criminais, sem o devido tratamento e sem o respeito à cadeia de custódia, indicada na lei anticrime de 2019.
segunda-feira, 5 de agosto de 2024
Atualizado às 13:26
O uso de prints de whatsapp como provas legais é alvo de debates jurídicos há um longo período de tempo.
Em 2022, por exemplo, a 6ª turma do STJ, diante de Recurso em HC 133.430 - PE 2020/0217582-8, decidiu pela inviabilidade da utilização deste tipo de material probatório sem a devida garantia de veracidade e respeito à cadeia de custódia.
Após a decisão de 2022, o STJ se debruçou mais uma vez sobre o tema, em 2024, corrente ano, a 5ª turma decidiu pela manutenção da inviabilidade da utilização de provas obtidas a partir de um celular. A demanda versava sobre Habeas Corpus.
Em primeira instância, o TJ/RN aceitou as provas juntadas nos autos e condenou o réu a uma pena de 4 anos e um mês de prisão. Em recurso, a defesa recorreu ao STJ, e o relator do caso, ministro Joel Ilan Paciornik, indicou que a documentação de todas as fases do procedimento de obtenção de provas digitais é um dos critérios para validação da prova.
Neste sentido, o alvo da decisão de inviabilidade das provas retiradas de celular foi, conforme 2022, a quebra na cadeia de custódia. Este sistema de preservação probatória foi inserida no ordenamento jurídico criminal através da lei anticrime de 2019.
De acordo com a lei 13.964/19 (lei anticrime) a cadeia de custódia, definida no art. 158-A é "(...) o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.".
Ainda no mesmo dispositivo legal há a descrição do procedimento da cadeia de custódia: "Art. 158-A. (...) §1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio. §2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação. §3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal.".
Além deste ponto, o art. 158-B da mesma lei indica as etapas para a preservação da prova: 1. Reconhecimento; 2. Isolamento; 3. Fixação; 4. Coleta; 5. Acondicionamento; 6. Transporte; 7. Recebimento; 8. Processamento; 9. Armazenamento e; 10. descarte.
Com a decisão proferida no corrente ano, reforçando a decisão anterior de 2022, se consolida o entendimento de que, havendo alguma irregularidade na cadeia de custódia, haverá a inviabilização da prova juntada nos autos, inclusive as oriundas de aplicativos de mensagem instantânea.
Vale aqui indicar a ABNT 27.037 que apresenta diretrizes para a confiabilidade de documentos digitais. Esta norma técnica tem por finalidade a padronização de tratamento de evidências digitais, garantindo força probatória e relevância para utilização em processos judiciais.
Para a norma da ABNT a evidência digital deve conter três requisitos: relevância, confiabilidade e suficiência. Também, na mesma norma, se verifica os princípios para validação da prova, ou seja, o mínimo manuseio do dispositivo digital ou evidência original, a consideração de qualquer alteração, documentando as ações realizadas e, por fim, a não utilização, pelos agentes que irão analisar os documentos, de atos além de suas competências.
Portanto, há conexão direta entre a lei anticrime e a ABNT 27.037.
Para utilização destes documentos digitais no campo civilista, é importante promover a confiabilidade do corpo probatório digital, mesmo não havendo este requisito no Processo Civil brasileiro. Vale aqui indicar que os arts. 369 e 484 do CPC garante a possibilidade de ampliação dos tipos de provas, desde que lícitas. De acordo com o art. 389 do CPC: "As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.".
O uso de ferramentas digitais especializadas ou a própria ata notarial poderá garantir a veracidade de prints de conversas e telas sistêmicas, permitindo menor risco de impugnação das provas em procedimento civilista.
Portanto, a decisão recente do STJ mantém entendimento proferido em decisão anterior, de 2022, reforçando a importância da cadeia de custódia para a apresentação de provas, inclusive digitais.