Regime de incentivo ao investimento na Argentina

O RIGI - Regime de Incentivo ao Investimento, instituído pelo governo argentino, faz parte de uma série de reformas para revitalizar a economia nacional e atrair investimentos estrangeiros. Este regime está delineado na "Ley de Bases y Puntos de Partida para la Libertad de los Argentinos", recentemente aprovada, que busca criar um ambiente mais atrativo e seguro para investidores. A necessidade de tais reformas é especialmente urgente em um cenário de desafios econômicos naquele país, incluindo alta inflação e problemas fiscais.

A criação do RIGI seguiu um processo legislativo extenso e debatido. Durante seis meses, o projeto de lei foi discutido intensamente no Congresso Nacional, refletindo as tensões e desafios enfrentados pela Argentina em sua busca por estabilização econômica. A aprovação da "Ley de Bases" representa um marco significativo para a administração do presidente Javier Milei, que visava implementar uma série de mudanças estruturais para melhorar a transparência e eficiência da administração pública.

Principais artigos do RIGI

O RIGI é regulamentado por vários artigos na "Ley de Bases", cada um abordando aspectos específicos do regime de incentivo:

• Define os setores prioritários para o investimento, como infraestrutura, energia renovável, tecnologia e agroindústria, escolhidos devido ao seu potencial de crescimento e impacto positivo na economia argentina.
• Estabelece benefícios fiscais, incluindo isenção de impostos sobre lucros e reduções tarifárias para a importação de equipamentos e tecnologia. Essas medidas são projetadas para diminuir os custos iniciais e operacionais para os investidores.
• Prevê garantias legais e mecanismos de proteção para investidores, assegurando que suas operações não sejam afetadas por mudanças legislativas repentinas ou outras instabilidades.
• Para que um projeto se enquadre no RIGI, é necessário um investimento mínimo de USD 100 milhões. Este valor é aplicável a projetos em setores estratégicos como florestal, mineração, agroindústria, hidrocarbonetos e indústrias manufatureiras, que aumentem as exportações do país?. Além do montante mínimo de investimento, o RIGI oferece benefícios específicos, como a possibilidade de utilizar até 20% das divisas obtidas com as exportações para o pagamento de passivos comerciais ou financeiros no exterior, dividendos e repatriação de investimentos?.

Vantagens para investidores estrangeiros

O RIGI oferece várias vantagens estratégicas para atrair investidores estrangeiros, destacando-se: benefícios fiscais, maior segurança jurídica, repatriação de lucros e outros incentivos.

Benefícios fiscais: O regime inclui isenções de impostos sobre lucros por um período determinado e reduções significativas nas tarifas de importação para equipamentos e tecnologias necessárias para os setores prioritários. Esses benefícios reduzem o custo de entrada e tornam o investimento mais atrativo financeiramente. Desta forma inclui:

1. Isenção de imposto sobre lucros: Um dos principais atrativos do RIGI é a isenção temporária do imposto sobre lucros para investimentos em setores prioritários. Isso significa que as empresas que se qualificam para o regime não terão que pagar imposto sobre seus lucros durante um período específico, geralmente estipulado como parte das condições do regime. Essa isenção pode representar uma economia significativa, aumentando a lucratividade dos projetos de investimento.
2. Redução de tarifas de Importação: O RIGI oferece reduções ou isenções de tarifas de importação para máquinas, equipamentos e tecnologia que são considerados essenciais para os setores incentivados. Isso reduz o custo de aquisição de ativos necessários para a operação e desenvolvimento dos projetos, tornando-os mais acessíveis e viáveis financeiramente. Essa medida é particularmente relevante para indústrias de alta tecnologia ou intensivas em capital, que dependem de equipamentos específicos muitas vezes importados.
3. Créditos fiscais: Além das isenções, o RIGI pode conceder créditos fiscais para investimentos em pesquisa e desenvolvimento, infraestrutura e outras áreas consideradas estratégicas para o crescimento econômico. Esses créditos fiscais podem ser usados para reduzir a carga tributária futura das empresas, incentivando-as a reinvestir em seus negócios e expandir suas operações.
4. Deduções fiscais: Empresas participantes do RIGI podem ser elegíveis para deduções fiscais em despesas relacionadas a treinamentos, desenvolvimento de novos produtos, e investimentos em tecnologia. Essas deduções ajudam a aliviar o custo dessas atividades, incentivando a inovação e a qualificação da força de trabalho.
5. Estabilidade dos incentivos: O regime inclui garantias de estabilidade para os incentivos fiscais concedidos, o que significa que uma vez concedidos, esses incentivos não serão retirados ou reduzidos de maneira retroativa, proporcionando uma maior segurança para os investidores em relação ao planejamento de longo prazo.

Segurança jurídica: Um dos pilares do RIGI é a segurança jurídica oferecida aos investidores. Considerando o longo histórico argentino de intervencionismo estatal, que acabou afugentando investimento estrangeiro, o RIGI estabelece garantias contra expropriações e mudanças legislativas abruptas, proporcionando um ambiente de negócios estável e previsível. Estas garantias incluem:

1. Direito à repatriação de lucros: O RIGI garante aos investidores estrangeiros o direito de repatriar seus lucros em moeda estrangeira, ou seja, de transferir os rendimentos gerados na Argentina para seus países de origem. Este direito é essencial para os investidores, pois assegura que eles possam acessar seus ganhos e investir ou utilizá-los conforme necessário, sem restrições excessivas.
2. Proteção contra controle de capital: Em muitos países, especialmente aqueles que enfrentam dificuldades econômicas, podem ser implementados controles de capital que limitam a saída de moeda estrangeira. O RIGI se diferencia ao assegurar que os investidores não enfrentarão tais restrições, proporcionando uma proteção adicional contra políticas econômicas que possam restringir a transferência de lucros.
3. Previsibilidade e estabilidade: A garantia de repatriação de lucros também oferece previsibilidade e estabilidade, elementos fundamentais para o planejamento financeiro e estratégico das empresas. Investidores podem calcular com mais precisão o retorno sobre o investimento, sabendo que os ganhos poderão ser transferidos sem obstáculos significativos.
4. Mecanismos de conversão e transferência: O regime estabelece procedimentos claros para a conversão de moeda local em moeda estrangeira e para a transferência de fundos para o exterior. Isso inclui taxas de câmbio justas e competitivas, além de processos administrativos simplificados, que juntos ajudam a minimizar o risco de perdas financeiras devido a variações cambiais ou processos burocráticos complexos.
5. Incentivo adicional para investimento estrangeiro: A facilidade de repatriação de lucros é um incentivo significativo para investidores estrangeiros, especialmente em um cenário global onde a mobilidade do capital é fundamental. Este aspecto do RIGI torna a Argentina um destino mais atraente para investimentos, ajudando a aumentar o fluxo de capital estrangeiro para o país.

Acesso a mercados e infraestrutura: A localização estratégica da Argentina e sua infraestrutura em desenvolvimento oferecem acesso facilitado a mercados importantes na América Latina. Além disso, pelo RIGI, o governo compromete-se a melhorar a infraestrutura básica para facilitar operações comerciais, incluindo transportes e comunicação.

Uma das prioridades do RIGI é o investimento em infraestrutura de transporte, crucial para facilitar o escoamento de produtos e serviços, reduzir custos logísticos e aumentar a competitividade das empresas operando na Argentina. Na modernização energética, o RIGI prevê investimentos em geração e distribuição de energia, com ênfase em fontes renováveis como solar e eólica. Melhorias na infraestrutura de telecomunicações também são essenciais para apoiar o crescimento de setores tecnológicos e digitais.

Facilitação de acesso a mercados internacionais: O regime inclui medidas para facilitar o acesso a mercados internacionais, para acelerar o processo de importação e exportação, reduzindo custos e tempo para as empresas. Estas medidas incluem:

1. Simplificação de procedimentos alfandegários: Uma das principais medidas do RIGI é a simplificação dos processos alfandegários para a importação e exportação de bens. Isso inclui a digitalização de procedimentos, a introdução de sistemas eletrônicos para a submissão de documentos e a aceleração de inspeções e liberação de mercadorias. O objetivo é reduzir o tempo e os custos associados ao desembaraço aduaneiro, tornando o comércio internacional mais ágil e eficiente.
2. Redução de tarifas e impostos de importação: O RIGI prevê a redução ou eliminação de tarifas e impostos de importação sobre certos produtos, especialmente aqueles necessários para a produção em setores prioritários como tecnologia, infraestrutura e energia renovável. Essas reduções tornam os insumos mais acessíveis e reduzem o custo de produção para as empresas operando na Argentina.
3. Acordos de facilitação de comércio: O regime incentiva a negociação e adesão a acordos de facilitação de comércio com outros países e blocos econômicos. Esses acordos visam harmonizar e simplificar regulamentos, facilitar o acesso a mercados estrangeiros e reduzir barreiras comerciais não-tarifárias, como restrições técnicas e regulatórias. Isso também inclui esforços para melhorar a conformidade com padrões internacionais, tornando os produtos argentinos mais competitivos globalmente.
4. Desenvolvimento de ZPEs - Zonas de Processamento de Exportação: O RIGI promove o desenvolvimento áreas especialmente designadas onde as empresas podem operar com benefícios fiscais e alfandegários. Nessas zonas, as empresas podem importar insumos com isenção de impostos, desde que os produtos finais sejam destinados à exportação.

PPP - Parcerias Público-Privadas: Para financiar e implementar essas melhorias de infraestrutura, o RIGI encoraja parcerias público-privadas. A Argentina tem experiência em PPP que podem ser consideradas bem-sucedidas. Alguns exemplos: Rota 9 e 8 - Projeto de Corredores Rodoviários, principais estradas que conecta Buenos Aires ao norte do país. Aeroporto Internacional de Ezeiza: A concessão do Aeroporto Internacional de Ezeiza em Buenos Aires foi uma das primeiras e mais bem-sucedidas PPPs na Argentina. Energia:  Central Térmica Loma de la Lata, que foi desenvolvida sob um modelo de PPP, e aumentou a capacidade de geração de energia e ajudou a estabilizar seu fornecimento. Saúde: a Argentina utilizou PPPs para a construção e operação de hospitais de alta complexidade, como o Hospital El Cruce, na província de Buenos Aires.

Segurança jurídica no RIGI: A segurança jurídica é um fator determinante para a tomada de decisão de investidores, especialmente em setores que exigem grandes aportes de capital e têm um horizonte de retorno de longo prazo. O RIGI, ao fornecer essas garantias, busca minimizar os riscos associados ao ambiente de negócios na Argentina e promover um influxo maior de capital estrangeiro. Suas medidas incluem:

1. Garantias contra expropriações arbitrárias: O RIGI oferece garantias explícitas contra a expropriação sem justa compensação. Isso significa que os investidores têm a segurança de que seus ativos não serão tomados pelo governo sem uma indenização adequada, o que é uma proteção essencial em mercados onde tais riscos podem ser percebidos como elevados.
2. Proteção contra mudanças legislativas retroativas: Uma das preocupações comuns dos investidores é a possibilidade de mudanças abruptas nas leis que possam afetar negativamente seus investimentos. O RIGI inclui cláusulas que protegem os investimentos já realizados de mudanças legislativas retroativas, garantindo que os investidores possam operar em um ambiente mais previsível e seguro.
3. Direito à repatriação de lucros: O regime assegura o direito dos investidores estrangeiros de repatriar seus lucros em moeda estrangeira. Isso é particularmente importante para mitigar riscos relacionados à flutuação cambial e controle de capital, que podem impactar a capacidade dos investidores de transferir seus ganhos para fora do país.
4. Arbitragem internacional: O RIGI prevê a possibilidade de resolução de disputas através de arbitragem internacional, um mecanismo amplamente reconhecido e confiável para resolver conflitos. Isso oferece uma camada adicional de proteção para os investidores, garantindo que eventuais disputas sejam resolvidas de forma justa e imparcial, fora do sistema judicial local, que pode ser percebido como menos confiável ou parcial.
5. Estabilidade regulatória: O regime estabelece compromissos do governo em manter uma política econômica estável e previsível, incluindo a estabilidade das taxas e regulamentos que afetam diretamente os investidores. Isso ajuda a reduzir a incerteza e facilita o planejamento de longo prazo para os negócios.

Desafios e perspectivas

Apesar das vantagens oferecidas pelo RIGI, o programa enfrenta desafios significativos. A persistente instabilidade econômica, questões burocráticas e deficiências na infraestrutura são barreiras que podem limitar a atratividade do regime para investidores estrangeiros. A sustentabilidade e o sucesso do RIGI dependerão da capacidade do governo argentino de manter políticas consistentes e de implementar reformas necessárias para criar um ambiente de negócios mais favorável.

Pelo histórico conturbado, a Argentina tem seguramente mais dificuldade em atrair investimento, quando comparada com outros países da região, como Brasil e Chile. Apesar disso, notícias recentes afirmam que o RIGI atraiu vários projetos significativos para a Argentina, em diferentes setores estratégicos:

1. Projeto ARGLNG (Gás Natural Liquefeito): Este projeto envolve a produção de gás natural no bloco de Vaca Muerta, seu transporte através de um gasoduto e sua industrialização. O projeto inclui a instalação de uma unidade flutuante de liquefação de gás no Mar Argentino, com expectativas de iniciar as exportações em 2027. A capacidade total prevista é de 120 milhões de metros cúbicos por dia, com um valor de exportação anual estimado em 16 bilhões de dólares?.
2. Projeto offshore argerich: Localizado na Cuenca Norte do Mar Argentino, este projeto de exploração de hidrocarbonetos offshore é considerado uma das iniciativas mais promissoras, com potencial de investimentos de 40 bilhões de dólares. A previsão é de que este projeto possa gerar até 2 milhões de barris equivalentes de petróleo por dia em sua fase de pico, contribuindo significativamente para as exportações argentinas.?
3. Projeto de Hidrogênio Verde "Pampas": Liderado pela Fortescue, este projeto visa transformar a região de Río Negro em um polo mundial de produção de hidrogênio verde, com um investimento total de 8,4 bilhões de dólares. A expectativa é que o projeto atinja uma produção anual de 2,2 milhões de toneladas de hidrogênio verde até 2050, contribuindo para a transição energética global?.
4. Projetos de mineração de cobre: A Argentina está desenvolvendo seis projetos principais de mineração de cobre nas províncias de San Juan, Catamarca, Salta e Mendoza. Esses projetos devem gerar investimentos de aproximadamente 20 bilhões de dólares, criando mais de 40.000 empregos diretos e indiretos. O cobre é um recurso crucial para a transição energética, especialmente na fabricação de veículos elétricos e infraestrutura de energia renovável?.

Conclusão

O RIGI é uma iniciativa estratégica do governo argentino para atrair capital estrangeiro e fomentar o desenvolvimento econômico. Com uma combinação de benefícios fiscais, garantias legais e incentivos específicos, o RIGI tem o potencial de melhorar significativamente o ambiente de negócios na Argentina. A efetividade do regime dependerá da estabilidade política e econômica, bem como da implementação eficaz das políticas públicas previstas.