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Podcast, lives e streaming são equiparados a rádio e televisão para fins propaganda eleitoral vedada?

Pré-candidatas questionam se podem manter podcast independente sem violar legislação eleitoral; algumas ressalvas devem ser consideradas.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Atualizado às 14:54

Proibição para radialistas, comentaristas e apresentadores

A partir de 30/6 apresentadores de rádios e televisões precisam se ausentar de seus canais de transmissão. Também se estende essa limitação aos canais que veiculam imagens e sons no YouTube, Instagram e outros, sendo os mesmos uma extensão da transmissão convencional.

A partir de 6 de julho, as(os) agentes públicas(os) devem adotar as providências necessárias para que o conteúdo dos sítios, canais e outros meios de informação oficial exclua nomes, slogans, símbolos, expressões, imagens ou outros elementos que permitam identificar autoridades, governos ou administrações, cujos cargos  estejam em disputa na campanha eleitoral, ainda que a divulgação tenha sido autorizada em momento anterior, assegurada a manutenção das informações necessárias para estrito cumprimento, pelos responsáveis, do previsto no art. 48-A da LC 101/00, nos arts. 8º e 10 da lei 12.527/11 e no §2º do art. 29 da lei 14.129/21.

No mais...

Porém, programas de streaming e podcasts em várias plataformas continuam a funcionar normalmente e têm alcance maior do que os programas convencionais de rádio e TV. Assim, cabe observar qual a natureza do programa e se é ou não uma extensão da rádio e TV. Se foren, considero que as proibições são extensíveis a esse formato digital também..

Influenciadores e etc

Os influenciadores (equiparados a artistas) podem divulgar seus  candidatos, mas não podem ser remunerados por isso. Podem também convidar candidatos para suas lives e podcast, mas também devem guardar o devido cuidado. No mais, os patrocínios de blogs e perfis para divulgar eventos oficiais também são englobados na proibição. Cada caso deve ser analisado com cuidado, para evitarmos o abuso de poder político e econômico.

Mas observem!

Uma inovação importante foi relativa à proibição de  candidatos à reeleição realizarem lives e transmissões nos espaços públicos, a exemplo das gravações semanais de Bolsonaro na residência presidencial. Assim, a Resolução-TSE 23.735/24 no art. 19 prevê:

Art. 19 Somente é lícito a ocupante de cargo de presidente da República, governador ou prefeito fazer uso de cômodo da residência oficial pararealizar live, podcast ou outro formato de transmissão eleitoral se, cumulativamente:

  1. tratar-se de ambiente neutro, desprovido de símbolos, insígnias, objetos, decoração ou outros elementos associados ao poder público ou ao cargo ocupado;
  2. a participação for restrita à pessoa detentora do cargo;
  3. o conteúdo divulgado se referir exclusivamente à sua candidatura;
  4. não forem utilizados recursos materiais e serviços públicos nem aproveitados servidoras, servidores, empregadas e empregados da Administração Pública direta ou indireta; e
  5. houver o devido registro, na prestação de contas, de todos os gastos efetuados e doações estimáveis relativas à live, ao podcast ou à transmissão eleitoral, inclusive referentes a recursos e serviços de acessibilidade.

As penalidades previstas no art. 20 podem corroborar em até perda do mandato.

Outra coisa é a realização de lives e podcasts, gravação de streaming, etc, em canais e locais não oficiais.

No caso de apresentadores de Rádio e Televisão, mesmo que o façam por não haver vedação, considero que mesmo ausente previsão específica, não deveriam realizar nas dependências das respectivas unidades, de forma a evitar a vinculação da transmissão às atividades dos respectivos agentes vedados.

Candidatos religiosos

Considero ainda que a mesma restrição deva ser aplicada a sacerdotes e praticantes de qualquer religião, tendo em vista que o local onde se celebra os eventos religiosos são espaço privados mas com regras públicas de convivência.

O TSE já entendeu que configura abuso de poder religioso em alguns casos.

Vejamos a jurisprudência:

"[...]. Reunião realizada nas dependências de uma igreja. Pedido de apoio político. Cabimento de AIJE em face de abuso de poder de autoridade religiosa, independentemente da presença de abuso de poder político ou econômico. Enquadramento da autoridade religiosa dentro do conceito geral de autoridade previsto no art. 22, caput , da LC 64/90. Impossibilidade. [...] 1. Existentes outros mecanismos aptos a sancionar condutas irregulares eventualmente perpetradas por instituições e líderes eclesiásticos no decurso das campanhas eleitorais, resulta inviável a compreensão do abuso de poder de autoridade religiosa como categoria ilícita autônoma, designadamente em face da inexistência de alusão expressa no marco regulatório da ação de investigação judicial eleitoral. 2. A prática do abuso de poder de autoridade religiosa, conquanto não disciplinada legalmente, pode ser sancionada quando as circunstâncias do caso concreto permitam o enquadramento da conduta em alguma das formas positivadas de abuso, seja do poder político, econômico ou dos meios de comunicação social. [...]". (Ac. de 18.8.20 no REspEl 8.285, rel. min. Edson Fachin)

Como entendo!

Não faria sentido admitir que os espaços vedados para realização de campanhas como os espaços públicos pudessem ser utilizados para realização de lives ou podcast.

Da mesmo forma, não faria sentido que comentaristas, radialistas e apresentadores fizessem uso dos espaços de sua atividade profissional habitual para gravar podcasts e lives de forma a permanecer com suas programações em perfis paralelo visando contornar a proibição eleitoral. Seria uma forma de driblar a proibição, uma espécie de "jeitinho brasileiro" para violar o bem jurídico tutelado pela norma que é: evitar a concorrência desleal ou o abuso de poder político e econômico.

O mesmo pode ser entendido sobre a realização de campanhas e gravações nos espaços religiosos, criaria a impressão no eleitor médio de que aquela instituição "apoia" as pretensões do referido candidato.

Assim, a descaracterização do espaço que guarda dimensões públicas deve ser respeitado para não gerar o desequilíbrio do pleito, por abuso de poder político e econômico.

Considero que as redes sociais são um desdobramento da esfera pública, numa dimensão real e imaterial. Óbvio que nossa sociabilidade democrática e as regras jurídicas ainda não estão acomodadas a essa realidade que se impõe. Mas sigamos em alerta!

Rosa Maria Freitas

VIP Rosa Maria Freitas

Doutora em Direito pelo PPGD/UFPE, professora universitária, Servidora pública, Escritório Rosa Freitas Advocacia em Direito público, palestrante e autora do livro Direito Eleitoral para Vereador.

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