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Existe garantia, ou expectativa de direito ao empregado, quanto à propriedade intelectual da empresa?

Felipe Barbosa Cândido, Yara Leal Girasole e Plinio Higasi

Leis brasileiras regulam a propriedade intelectual, incluindo criações de empregados, distinguindo entre trabalho contratado e criações fora do escopo profissional.

quarta-feira, 24 de julho de 2024

Atualizado às 12:02

Com avanço da tecnologia, é normal nos depararmos com inovações e invenções criadas por empregados no ambiente laboral. Encontramos vídeos criativos em redes sociais, desenho de estratégias de marketing, planos de negócios e até inovações que impactam a vida cotidiana e social das mais diferentes pessoas ao redor do mundo (temos infinitos softwares e aplicativos que facilitam significativamente a vida das pessoas).

Nesse contexto, destacamos que o ordenamento jurídico brasileiro já regulamenta a matéria, fornecendo diretrizes claras quanto a remuneração adequada e a titularidade de eventuais criações e aprimoramento gerados pelos empregados.

De largada, é importante compreendermos que a propriedade intelectual abrange direitos sobre invenções, obras literárias (livros, revistas, gibis e afins) e artísticas, imagens em geral, obras audiovisuais (áudios e vídeos), bem como outros modelos de criações utilizados no mundo dos negócios.

Atualmente, a lei 9.279/96 (que regula os direitos e obrigações relativos à Propriedade Industrial) e a lei 9.610/98 (lei que regulamenta os Direitos Autorais) servem de base para tratar da titularidade e dos direitos acerca de criações desenvolvidas por empregados no ambiente de trabalho.

Estes textos normativos fazem a distinção entre criações de empregados efetivamente contratados para inovações, invenções, aprimoramentos e afins, ou seja, aquelas que estão dentro do escopo de trabalho para o qual foram contratados, e as criações desenvolvidas por empregados que não foram contratados para essa finalidade, mas entregaram algo que não faz parte da descrição do cargo e da vaga de trabalho (job description).

Assim, se o empregado é contratado para criar, inovar e desenvolver produtos intelectuais, a titularidade destas criações pertence, em regra, ao empregador. É importante que haja previsão expressa em contrato, de modo a evitar exposição e mitigar riscos desnecessários para a empresa.

Entretanto, o tema torna-se complexo quando um empregado desenvolve determinada criação fora dos termos do contrato de trabalho pactuado entre as partes. É neste ponto que ressaltamos a importância de um time jurídico especializado, a fim de averiguar o risco através de uma análise aprofundada da empresa, levando em considerações fatores como a utilização de recursos da empresa por parte do empregado, ambiente e tempo despendido para o desenvolvimento da criação.

De acordo com o art. 88 da lei 9.279/96, a titularidade de criações desenvolvidas por empregados que não foram contratados para esta finalidade pertence, em regra, ao empregado. Entretanto, se a referida criação foi gerada com a utilização de recursos próprios da empresa, o empregador terá direito de preferência na aquisição da titularidade da criação, vejamos o texto da lei a esse respeito:

Art. 88. A invenção e o modelo de utilidade pertencem exclusivamente ao empregador quando decorrerem de contrato de trabalho cuja execução ocorra no Brasil e que tenha por objeto a pesquisa ou a atividade inventiva, ou resulte esta da natureza dos serviços para os quais foi o empregado contratado.

§ 1º Salvo expressa disposição contratual em contrário, a retribuição pelo trabalho a que se refere este artigo limita-se ao salário ajustado.

§ 2º Salvo prova em contrário, consideram-se desenvolvidos na vigência do contrato a invenção ou o modelo de utilidade, cuja patente seja requerida pelo empregado até 1 (um) ano após a extinção do vínculo empregatício.

As criações devem ser objeto de negociação entre as partes, formalizadas por meio de contrato ou aditivo, sendo que esse ajuste garante segurança jurídica não só em relação à propriedade do bem produzido ou aprimorado, mas também quanto à existência, ou não, de eventual remuneração extra. O ditado popular de que "o combinado não sai caro" aplica-se perfeitamente ao caso.

A legislação vigente não estabelece critério específico para o ajuste de remuneração entre as partes, permitindo acordos flexíveis, desde que respeitada a proporcionalidade entre criação e retorno financeiro à empresa. De todo modo, importante destacar que a remuneração ajustada não se confunde nem incorpora o salário do empregado, ou seja, sobre o montante pago não há reflexos trabalhistas e previdenciários.

Para as empresas é de suma importância estabelecer contratos ou políticas claras e transparentes acerca da propriedade intelectual, bem como sobre os respectivos critérios de remuneração.

É importante também contemplar a questão das criações conjuntas ou coautoria no ambiente de trabalho. Quando duas ou mais pessoas colaboram para a criação de um produto intelectual, os direitos e a titularidade sobre essa criação devem ser claramente definidos. A coautoria deve ser reconhecida, e os termos da divisão de direitos e responsabilidades devem estar ser muito bem delimitados em contrato, evitando conflitos entre os colaboradores e a empresa no futuro.

Para empresas que operam ultrapassando as barreiras nacionais, a proteção da propriedade intelectual deve considerar as legislações internacionais, como por exemplo, o Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes (PCT) e a Convenção de Berna para a Proteção de Obras Literárias e Artísticas, as quais oferecem mecanismos para proteção de criações em múltiplos países. É de suma importância que as empresas compreendam essas regras e registrem suas criações em todos os mercados onde atuam para garantir uma proteção abrangente.

Além dos contratos de trabalho e políticas internas sobre tratamento de dados da empresa, dados de clientes, e eventuais ativos intangíveis, as empresas devem implementar acordos de confidencialidade (NDAs) para proteção de informações sensíveis e eventuais segredos comerciais. Esses acordos e termos devem ser assinados por todos os empregados e colaboradores, especialmente aqueles envolvidos em projetos de desenvolvimento e inovação, buscando garantir que informações cruciais não sejam divulgadas ou utilizadas indevidamente, tanto durante, quanto após o término do contrato de trabalho.

Para fortalecer a proteção da propriedade intelectual, as empresas devem investir em palestras, programas de treinamento e conscientização para seus empregados. Esses eventos podem abordar a importância do respeito e ciência sobre a propriedade intelectual, além de explorar e esclarecer sobre as políticas internas da empresa, as melhores práticas e demais regras internas. O treinamento contínuo ajuda a criar uma cultura de respeito e valorização das criações intelectuais dentro da organização.

Felipe Barbosa Cândido

Felipe Barbosa Cândido

Advogado no HSLG Advogados.

Yara Leal Girasole

Yara Leal Girasole

Sócia responsável pela área de Direito do Trabalho no escritório HSLG Advogados. Formada pela Mackenzie, com Pós-graduação na PUC/SP.

Plinio Higasi

Plinio Higasi

Advogado no HSLG Advogados.

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