Os limites da garantia de emprego do diretor de cooperativa
Cooperativas são sociedades civis sem fins lucrativos, regidas pela Constituição e leis específicas, podendo oferecer diversos serviços e produtos através de gestão democrática e participativa.
quarta-feira, 24 de julho de 2024
Atualizado às 07:53
As cooperativas são sociedades civis, sem fins lucrativos, podendo ser constituídas por pessoas físicas, sendo admitida, excepcionalmente, a participação de pessoas jurídicas. Estas sociedades são regidas principalmente pela Constituição Federal e pelas leis Federais 5.764/71, 10.406/02 (CC) e 12.690/12 (cooperativas de trabalho). O art. 5º da lei 5.764/71, dispõe que as "cooperativas poderão adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou atividade". Prossegue a mesma lei, estabelecendo que as cooperativas que possuem mais de um objeto social são consideradas cooperativas mistas, nos termos do art. 10, §2º.
No ramo farmacêutico, tem sido comum a criação de cooperativas de consumo pelos empregados que exercem a função de vendedores propagandistas. As cooperativas de consumo são as que se destinam à compra em comum de produtos e/ou serviços para os seus cooperados. Os exemplos mais conhecidos são os supermercados e as farmácias, mas existem também as cooperativas de serviços educacionais, de turismo, dentre outras. Atualmente, as cooperativas de consumo se dividem em dois tipos: a fechada, que admite apenas pessoas ligadas a uma mesma profissão ou organização e a aberta, que admite qualquer pessoa que queira se associar.
As cooperativas de consumo funcionam reunindo pessoas interessadas em comprar um mesmo tipo de produto ou serviço para conseguir condições diferenciadas, como menor preço. Além dos benefícios das compras em conjunto, o consumidor se torna muito mais do que cliente, ele é dono do negócio. Um negócio que tem a gestão democrática, ou seja, cada cooperado tem voz e voto nas decisões da Assembleias. Além disso, o trabalho dever ser guiado por princípios e valores que tem como base a justiça social, a equidade, a solidariedade e a sustentabilidade.
A estabilidade no emprego aos empregados que detém representação de classe nasce da natureza do conflito de interesses inerente às relações trabalhistas. Ora, o objetivo da lei ao garantir o emprego destes colaboradores foi impedir que o mesmo seja demitido por defender interesses muitas vezes contrários aos intentos de seu patrão. O inciso VIII do art. 8º da CF dispõe ser "vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei".
No mesmo sentido, o §3º do art. 543 da CLT traz idêntica vedação à proibição de dispensa do empregado sindicalizado, que se candidata para o cargo de direção, ou representação de entidade sindical, ou, ainda, de associação profissional.
Quanto à estabilidade de emprego de dirigente de cooperativa, preceitua o art. 55 da lei 5.764/71 que "os empregados de empresas que sejam eleitos diretores de sociedades cooperativas pelos mesmos criadas, gozarão das garantias asseguradas aos dirigentes sindicais pelo artigo 543 da CLT". A Jurisprudência trabalhista já entendia pela limitação da garantia de emprego apenas aos membros da diretoria das cooperativas. Nesse sentido, a OJ 253 SBDI-1/TST1.
A extensão da garantia de emprego dos dirigentes de cooperativa indistintamente é tema que tem sido analisado pela Jurisprudência Trabalhista há alguns anos, mormente em razão das inúmeras cooperativas de consumo por funcionários que ocupam cargo de vendedor propagandista na indústria farmacêutica e no setor bancário.
Ainda há cizânia jurisprudencial sobre o tema. No TRT-1, por exemplo, das 10 turmas, 4 órgãos julgadores (1ª, 2ª, 3ª e 7ª turmas) entendem pela estabilidade ilimitada do dirigente da cooperativa, enquanto as outras seis turmas limitam a estabilidade somente em caso de conflito entre o objeto da cooperativa e a atividade do empregador. Destacamos aqui, o julgado abaixo de lavra do desembargador Leonardo Dias Borges, da 10ª turma do TRT/RJ:
RECURSO ORDINÁRIO. DISPENSA IMOTIVADA. EMPREGADO EXERCENTE DE CARGO DE DIREÇÃO EM COOPERATIVA DE CONSUMO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. INEXISTÊNCIA. A garantia concedida ao empregado eleito diretor de cooperativa criada pelos próprios empregados tem por escopo resguardar o emprego do dirigente, a fim de permitir a livre persecução dos fins sociais da cooperativa, sem qualquer pressão por parte da empresa ou de seus prepostos. Ou seja, a proteção legal ao dirigente visa proteger o empregado que defende a coletividade, muitas vezes em nítido confronto com o empregador, evitando, assim, a interferência nas decisões e na luta dos interesses coletivos. Disso decorre a conclusão inevitável no sentido de que se o objeto social da cooperativa para a qual foi eleito o trabalhador a cargo de Diretor não conflita com a atividade principal do empregador, ou seja, se a cooperativa não possui interação ou conflito com os empregadores ou seus diretores, não há embasamento para o usufruto da garantia aos dirigentes de cooperativa de consumo. Recurso do autor a que se nega provimento.
- Confira aqui a íntegra do artigo.
1 ESTABILIDADE PROVISÓRIA. COOPERATIVA. LEI Nº 5.764/71. CONSELHO FISCAL. SUPLENTE. NÃO ASSEGURADA. O art. 55 da Lei nº 5.764/71 assegura a garantia de emprego apenas aos empregados eleitos diretores de Cooperativas, não abrangendo os membros suplentes.
Juliano Martins Mansur
Advogado, sócio responsável pela área trabalhista do escritório Vieira de Castro, Mansur & Faver Advogados.