Planejamento sucessório: Regime da separação de bens convencional não afasta o cônjuge da qualidade de herdeiro
Breves comentários jurídicos sobre planejamento sucessório no regime da separação de bens, focando na qualidade do herdeiro.
quinta-feira, 18 de julho de 2024
Atualizado às 17:37
Este tema gera uma grande dúvida para o público em geral que não atua na área do direito: se a escolha desse regime afasta o cônjuge da qualidade de herdeiro em caso de falecimento do outro. Assim, abordaremos o tema a seguir, apresentando os fundamentos que sustentam a posição de que o regime da separação de bens convencional não exclui o cônjuge da condição de herdeiro.
Como notório, uma das modalidades de regime de bens entre os cônjuges é o regime de separação de bens convencional. Tal regime, atualmente, é o mais escolhido por casais ao contraírem matrimônio. Convém esclarecer que, no regime de separação de bens convencional, os cônjuges mantêm seus patrimônios distintos, sem que haja comunicação dos bens adquiridos antes ou durante o casamento.
A lei 10.406/02 (Código Civil) estabelece as regras relativas aos regimes de bens no casamento civil. No art. 1.639 e seguintes, são determinadas as regras aplicáveis ao Regime de Bens entre os cônjuges, podendo os nubentes optarem pelo regime da separação de bens convencional, ou seja, quando é uma opção do casal manter a segregação dos bens. Todavia, o art. 1.641 do CC estabelece que " é obrigatório o regime da separação de bens no casamento ", nas seguintes situações: (i) das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; (ii) da pessoa maior de 70 anos; (Redação dada pela Lei 12.344/10); e (iii) de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Por sua vez, o texto do art. 1.829, inciso I, do CC, que trata da ordem da vocação hereditária, determina que: "A sucessão legítima defere- se na ordem seguinte: I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; (...)"
Apesar do referido dispositivo mencionar o art. 1.640 do Código Civil, em realidade, deveria citar o art. 1.641, que dispõe acerca da separação obrigatória de bens.
Tal situação deu margem para discussão sobre se o legislador havia feito uma exceção afastando o cônjuge sobrevivente da concorrência na herança apenas nos casos de separação obrigatória dos bens (art. 1.641) ou também nas hipóteses de adoção do regime de separação convencional de bens.
A jurisprudência brasileira (decisórios do STJ no EREsp 1.472.945/RJ e REsp 1.382.170/SP) tem sido clara ao reconhecer que a opção pelo regime da separação de bens convencional não exclui o cônjuge da condição de herdeiro, tendo em vista que o art. 1.829, inciso I, do CC, é norma de ordem pública, não podendo ser afastada pela vontade das partes. O STJ, em diversos julgados, tem reafirmado esse entendimento, ressaltando que a separação de bens não afeta a qualidade de herdeiro do cônjuge sobrevivente.
Diante do exposto, concluímos que o regime da separação de bens convencional não afasta o cônjuge sobrevivente da qualidade de herdeiro. Apesar dos bens serem mantidos separados durante o casamento, o direito sucessório garante ao cônjuge sobrevivente a participação na herança do falecido, observando-se a ordem de vocação hereditária estabelecida em lei. Portanto, é de suma importância que os casais que optarem por esse regime estejam cientes desse direito, assegurando a proteção patrimonial mesmo diante do falecimento de um dos cônjuges.
Armando Villela Fossati Balteiro
Sócio do Vitor Costa Advogados, especializado em Direito Societário, Direito de Empresa, Mercado de capitais, Capitais estrangeiros e Banco Central.