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Economia, comportamentos e tributos

A interação entre economia e tributação é evidente, como visto na lei 14.902/24 que vincula medidas econômicas ao IPI com base em externalidades, influenciando comportamentos econômicos e incentivando ações específicas do Governo.

sexta-feira, 12 de julho de 2024

Atualizado em 11 de julho de 2024 14:32

Não é recente o intercâmbio existente entre economia e tributação, de modo que algumas medidas econômicas resvalam em limites tributários, ao passo que medidas tributárias podem confrontar objetivos econômicos.

Um exemplo dessa inter-relação é a lei 14.902/24, que instituiu o Programa MOVER - Mobilidade Verde e Inovação, cujos arts. 9º e 10 fazem alusão a externalidades, conceito tipicamente econômico, que significa, em suma, os efeitos causados em terceiros a partir (em razão) da atuação de um agente - exercício de um direito por seu titular, por exemplo. Esses dispositivos estabelecem que as externalidades serão parâmetros para a tributação do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI e para eventuais compensações.

Ocorre que essa inter-relação parece ser ressaltada em momentos específicos, na medida em que outras situações não remetem a cenários em que as externalidades são sopesadas, principalmente quando considerados os princípios econômicos.

Dentre estes, sobressai o princípio de que as pessoas reagem a incentivos, de sorte que a atuação de qualquer agente racional - uma espécie de homem médio do direito penal - depende não só do atingimento de sua satisfação, mas, também, dos incentivos que o conduzem a agir de determinada maneira.

Tomando-se a DIRBI - Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de Natureza Tributária como exemplo, deve-se perquirir a reação buscada pelo Governo ao instituí-la.

Isso porque, por meio da MP 1.227/24, essa declaração foi instituída de maneira lacônica, trazendo penalidades nada irrelevantes àqueles que não informassem à Receita Federal os benefícios de que gozavam. É dizer, numa só medida, exigiu-se do contribuinte a apresentação de uma nova obrigação acessória, sem o detalhamento necessário ao seu respeito, e se impôs uma penalidade àquele que descumprisse uma exigência pouco detalhada.

A par da regulamentação detida pela Receita Federal por meio da IN 2.198/24, que minorou as dúvidas inerentes ao seu cumprimento, pode-se observar que os benefícios listados por essa normativa são, também, informados em outras obrigações acessórias, como a ECF - Escrituração Contábil Fiscal em registros próprios aos benefícios.

O contexto apresentado reforça a dúvida no que se refere à reação buscada pelo Governo, na medida em que, num primeiro momento, foi necessário o cumprimento de uma obrigação lacônica sob o risco de imposição de multa e, num segundo momento, passou a se ter a obrigatoriedade de informar, pelo contribuinte que já apresenta a informação exigida por meio de outras obrigações já conhecidas, regulamentadas e administradas pela própria Receita, o que talvez caracterize um cenário de dúvida a respeito da necessidade de sua instituição, que - certamente - confronta a premissa de racionalidade inerente ao sistema econômico.

Independentemente da resposta quanto ao comportamento buscado, é certo que a norma está em vigência e deve ser cumprida, mas surge uma dúvida sobre os próximos comportamentos buscados pelo Governo por meio das próximas normas que estão por vir.

Richard Abecassis

Richard Abecassis

Advogado do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, responsável pelas áreas trabalhista, tributária e de recuperação de empresas.

Jorge Guilherme Ferreira da Fonseca Moreira

Jorge Guilherme Ferreira da Fonseca Moreira

Advogado do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados, atua nas áreas de Contencioso tributário e procedimento administrativo tributário.

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