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As diretrizes fixadas pelo STJ para penhora de faturamento de empresa em execução fiscal

No julgamento do Tema repetitivo 769, a Primeira Seção do STJ fixou quatro teses a respeito da penhora de faturamento de empresas em execuções fiscais.

segunda-feira, 20 de maio de 2024

Atualizado às 09:54

A penhora sobre faturamento de empresas em execuções fiscais sempre foi um tema coberto de incertezas no judiciário brasileiro. 

Diante de diversas decisões conflitantes entre Tribunais espalhados por todo o Brasil, a Primeira Seção do STJ afetou três recursos especiais relativos à penhora sobre o faturamento de empresa, a fim de definir diretrizes a serem aplicadas aos processos em que se discuta o tema. 

A controvérsia, cadastrada como Tema repetitivo 769, tratou "(i) da necessidade de esgotamento das diligências como pré-requisito para a penhora do faturamento; (ii) da equiparação da penhora de faturamento à constrição preferencial sobre dinheiro, constituindo ou não medida excepcional no âmbito dos processos regidos pela lei 6.830/80; e (iii) da caracterização da penhora do faturamento como medida que implica violação do princípio da menor onerosidade".

No julgamento do Tema, o ministro Herman Benjamin, relator do repetitivo, discorreu a respeito da evolução legislativa e jurisprudencial sobre a matéria. 

Conforme rememorado pelo ministro, o antigo CPC (CPC de 1973) não previa a penhora sobre o faturamento de empresas como forma de constrição em ações executivas. 

A possibilidade de realização desse tipo de penhora se deu, em um primeiro momento, por meio da jurisprudência do STJ, que a interpretou como medida excepcional, demandando, para a sua determinação, a comprovação da não localização de bens penhoráveis ou a verificação, pelo juiz, que os bens penhorados ou penhoráveis seriam de difícil alienação. 

A penhora de faturamento somente passou a ser prevista no CPC/73 após as alterações promovidas pela lei 11.382/06, a partir de quando deixou de ser uma medida excepcional, figurando com relativa prioridade na ordem de preferência das constrições judiciais. 

Com a entrada em vigor do atual CPC (CPC de 2015), a penhora de faturamento passou a ser listada como décima hipótese da ordem preferencial de constrições judiciais estabelecida no art. 835.

Entretanto, essa ordem preferencial pode ser alterada pelo juiz, conforme as circunstâncias do caso concreto, devendo apenas ser priorizada a penhora em dinheiro, nos termos do §1º do art. 835. Isso significa que a penhora sobre faturamento não mais possui o atributo de excepcionalidade. 

Além disso, de acordo com o CPC/15, a penhora de faturamento pode ser realizada ainda que os bens sujeitos à penhora não se caracterizem como de difícil alienação, caso seja verificado que tais bens sejam insuficientes para saldar o crédito executado (art. 866). 

Contudo, conforme destacado pelo ministro Herman Benjamin, a penhora de faturamento não pode ser equiparada à constrição sobre dinheiro. A própria lei de execução fiscal (lei 6.830/80) classifica, em seu art. art. 11, inciso I, a expressão monetária como o bem preferencial sobre o qual deve recair a penhora, assim como estabelece a penhora sobre direitos como última hipótese na ordem preferencial de constrições (art. 11, inciso VIII), ressalvando, ainda, que a constrição sobre o estabelecimento é medida excepcional (art. 11, §1º).

Portanto, ainda que o CPC/15 tenha mudado o patamar da penhora de faturamento, não há que se falar em equivalência com a penhora de dinheiro, pois a legislação expressamente prevê, como situações distintas, a penhora de dinheiro e de faturamento. 

Por outro lado, conforme reforçado no julgamento do Tema 769, ainda que a penhora de faturamento tenha deixado de ser uma medida excepcional no normativo processual, ao deferir tal medida com base na necessidade e/ou conveniência, o juiz deve estabelecer percentual que não comprometa a atividade empresarial, à luz do princípio da menor onerosidade, previsto no art. 805 do CPC/15 e no art. 620 do CPC/73.

Existe a hipótese, ainda, de o princípio da menor onerosidade obstar por completo a penhora do faturamento, desde que a decisão esteja fundamentada e pautada em elementos probatórios concretos apresentados pelo devedor, não sendo lícito aplicar em abstrato tal princípio, com base em simples alegações da parte devedora. 

Assim, com base nesse contexto, ao concluir o julgamento do Tema 769, para os fins do art. 1.036 e seguintes do CPC/15, a Primeira Seção do STJ estabeleceu as seguintes teses a respeito da penhora sobre faturamento de empresas em execução fiscal:

  1. O esgotamento das diligências não é mais requisito para deferimento da penhora de faturamento, desde a alteração legislativa promovida no CPC/73 pela lei 11.382/06;
  2. No regime do CPC/15, a penhora de faturamento, listada em décimo lugar na ordem preferencial de bens passíveis de constrição judicial, poderá ser deferida após a demonstração da inexistência dos bens classificados em posição superior, ou, alternativamente, se houver constatação, pelo juiz, de que tais bens são de difícil alienação; e a constrição judicial sobre o faturamento empresarial poderá ocorrer sem a observância da ordem de classificação estabelecida em lei, se a autoridade judicial, conforme as circunstâncias do caso concreto, assim o entender (art. 835, § 1º, do CPC/15), justificando-a por decisão devidamente fundamentada;
  3. A penhora de faturamento não se equipara à constrição sobre dinheiro;
  4. Na aplicação do princípio da menor onerosidade (art. 805, parágrafo único, do CPC/15; art. 620, do CPC/73): a) autoridade judicial deverá estabelecer percentual que não inviabilize o prosseguimento das atividades empresariais; e b) a decisão deve se reportar aos elementos probatórios concretos trazidos pelo devedor, não sendo lícito à autoridade judicial empregar o referido princípio em abstrato ou com base em simples alegações genéricas do executado.

Não há dúvidas de que essas teses uniformizam um tema extremamente delicado, que trata de medida constritiva capaz de interferir no pleno desenvolvimento de atividades empresariais.

As empresas devedoras, em regra, já não possuem situação financeira favorável, de modo que medidas constritivas de direitos - como a penhora de faturamento - devem ser aplicadas com estrita observância das disposições legais.

Em síntese, ao examinar o pedido de penhora de faturamento da empresa devedora, o juiz deve avaliar a necessidade, a conveniência e a onerosidade da medida, evitando a inviabilização do prosseguimento da atividade empresarial. 

Diante da conclusão do julgamento do Tema 769, os processos que estavam suspensos por determinação do STJ, individuais ou coletivos, que versem acerca da questão julgada, retomarão o curso para julgamento e aplicação das teses firmadas pelo Tribunal Superior.

Gabriel Silva Campos

VIP Gabriel Silva Campos

Graduado em Direito pelo UniCEUB e advogado.

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